O apodrecimento do movimento estudantil

O apodrecimento do movimento estudantil e os focos de luta ainda presentes 

Por Carlos Henrique Pianta.

O 52º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) foi um evento típico da política brasileira, mas, com certeza, alheio ao movimento estudantil atual. Separado por “forças” (organizações políticas, partidárias ou não), o CONUNE, como é conhecido o congresso, é o espaço em que essas “forças” se articulam nacionalmente e propõem debates, disputam cargos. Até aí não há problemas, porém, a Direção Atual da UNE composta majoritariamente pela juventude do PCdoB, a União Jovem Socialista (UJS), por juventudes do PT e do PMDB mal realizam debates, e quando o fazem, são mal organizados, absolutamente partidarizados e esvaziados de crítica e de conteúdo. A UNE não é mais, nem de longe, o que era até os anos 80, quando protagonizava lutas reais e discussões sobre a estrutura política nacional.

A atuação de estudantes independentes (sem filiação a alguma organização) é cada vez mais difícil e limitada, tendo em vista que para a direção atual da entidade o que importa é fazer propaganda das políticas do governo atual e garantir a manutenção do domínio da UJS sobre a mesa diretora da entidade. Em alguns debates a intervenções do público são organizadas e limitadas às “forças”, ou seja, fala quem pertence a uma organização, quem não pertence, só assiste. Além disso, na maioria das vezes não há condições de se ter um debate, por conta do desrespeito dos integrantes das tais “forças”. Durante as falas, tanto dos debatedores, quanto nas intervenções, oposição e situação na disputa de cargos da mesa diretora ficam cantando uma contra a outra, num clima de gincana escolar, enfraquecendo o debate e dispersando a atenção e o interesse de quem não está lá para disputar cadeiras, mas para disputar idéias, projetos políticos.

Esse clima de gincana não é encontrado apenas nos debates, todos os espaços e momentos do evento (inclusive nas refeições) focos de representantes dessa “forças” cantam em tom irritantemente alto suas musicas. É claro que não existe problema em um militante se organizar, esse é um ato extremamente válido, todavia, isso é tratado com extrema infantilidade pela maioria dessas organizações e fazem dessas gincanas uma arma forte para impedir o debate e a crítica, garantindo suas posições no grito, numa espécie de animação de auditório, estilo Chacrinha.

A Plenária Final, espaço onde são votadas as propostas de política para os próximos dois anos na UNE e aonde é escolhida a nova mesa diretora, também é marcada pelo clima infantil e apolítico de gincana. As “torcidas” das organizações nem ouvem os discursos e as propostas apresentadas, vaiam na do rival, apóiam e votam nas da sua “força”. Muitas vezes os delegados, como são chamados os estudantes com poder de voto, nem sabem no que estão votando, votam porque pertencem àquela organização, ou tem alguma forma de “rabo preso” com essas “forças”, porque dependem delas de alguma forma, como no transporte para o evento. A esmagadora maioria não tem faz crítica, não reflete se realmente concorda com a proposta defendida por “sua organização”.

Dentre as propostas apresentadas no congresso destacam-se a defesa do Plano Nacional de Educação (PNE) proposto pelo governo federal e sustentado pelas juventudes que o apóiam (UJS, JPT, MUTIRÃO), a pauta de 10% do PIB para a educação, mais falada pelas juventudes do PSOL (Contraponto, Barricadas, Levante) e a tese de uma Universidade Popular, defendida pelas juventudes comunistas (JCA, UJC, Juventude Libre). Esta última, a que mais me parece coesa. Aumentar o dinheiro destinado a educação é importante, tendo em vista que hoje se gaste quase 3% do PIB brasileiro em educação, mas só aumentar a verba não resolve, alias, piora a situação, pois o governo vai usar mais dinheiro para fortalecer os principais programas educacionais como PROUNI e REUNI.

O primeiro cria vagas em instituições de ensino pagas, concedendo abatimentos fiscais a essas Universidades. Enquanto isso os cursos mais desejados das universidades públicas e gratuitas continuam freqüentados majoritariamente pela classe média, e a porção pobre se espreme em bolsas de ensino em instituições que visam o lucro, em detrimento à qualidade do ensino.

Já o REUNI é o programa que cria novos Campi das universidades federais pelos Brasil. Essa expansão é feita de forma desleixada e irresponsável, condenando os alunos a salas de aulas alugadas lotadas com cem, duzentos alunos, enquanto o campus daquela cidade não está pronto. A maioria desses novos campi são criados em lugares aonde já existem universidades privadas, ou públicas de direito privado que poderiam sem incorporadas pelas federais, aumentando as vagas do ensino público e de qualidade.

Hoje nas universidades federais, cresce os focos de privatização dos espaços, como fundações, laboratórios privados, cursos extracurriculares todos construídos e mantidos com dinheiro público, mas, que funcionam para o interesse privado e geram lucro para empresas e seus acionistas. Sem combater essa triste realidade, sem lutar para que as instituições de ensino públicas cresçam, em detrimento as privadas, e que estas instituições de fato sejam usadas para resolver os anseios do povo, para que o filho do pedreiro também seja doutor, mas que possa trabalhar num hospital público e ser bem remunerado, para que o capital privado não tenha espaço e que a qualidade do ensino seja a principal prioridade, precisamos debater, não só um novo modelo de educação, mas um novo modelo de política nacional, que se dará através de revoluções. Quem sabe a primeira não é na educação?

Hoje o movimento estudantil não debate o fato de o PIB brasileiro crescer e a miséria permanecer presente, não discute o fato de que o trabalhador brasileiro paga rios de impostos enquanto os grandes empresários tem isenções milionárias, não discute a má distribuição de terras, de renda. Inclusive a maioria das “forças” de oposição acabam por fazer as vontades do capital privado quando propõem 10% do PIB para uma política privatista, mal planejada e autodestrutiva. Mas há uma esperança, enquanto houver gente interessada na luta. A tese por uma Universidade Popular é um dos focos de resistência a esta política criminosa. Discutir um novo sistema educacional, econômico, político é necessário e se as principais instituições (governo federal, UNE, MEC) não o fazem somos nós que temos que agir.

2 COMENTÁRIOS

  1. Caros companheiros!
    Permitam-me deixar aqui a minha contribuição.
    Sou acadêmico do 2º sem do curso de Direito da Universidade Católica Dom Bosco (Campo Grande-MS). O atual diretório acadêmico de nosso curso está totalmente ligado e submisso à políticos do estado, fazendo com que nossa academia se silencie e torne-se apática. Pensando em mudar tal cenário, acadêmicos criaram um grupo denominado Guaicurus. Este grupo vai concorrer as eleições do diretório sem apoio político algum, pois, nosso objetivo é amparar nossos pares e não governantes. Não temos apoio, logo não temos dinheiro. Mas, juntos, criamos várias formas para arrecadar verba para nosso trabalho, enquanto aqueles que possuem apoio político doam camisetas e oferecem estágios em troca do voto. Queremos mudar a situação de nossa academia.Queremos resgatar o orgulho acadêmico. Queremos mudar o que deve ser mudado (MUTATIS MUTANDIS). Para quem quiser apoiar nosso grupo: http://www.facebook.com/groups/guaicurusucdb/

  2. Isso me faz lembrar um antigo congresso da UCE.
    Ao que tu faz crer, a gincana – existente em todos os níveis da federação – continua mais forte do que nunca.
    Lamentável!!!

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.