O álbum “Contraduzindo”, de Tuzé de Abreu, é um raio de luz na escuridão da mediocridade

Foto: João Milet Meireller/Divulgação

O cantor, compositor e músico baiano Tuzé de Abreu acaba de lançar o lindo, ousado e poderoso álbum “Contraduzindo”. O disco é uma grande surpresa, que mereceu até a indicação de Caetano Veloso pelas redes sociais e texto de apresentação na capa. Caetano, que já gravou a canção “Vivendo em Paz”, de Tuzé, não economiza palavras:

“Neste disco tardio, toda a beleza rascante de sua voz e de suas composições aparece de modo brilhante e instigador. Experimental e místico, moderno e pessoal, Tuzé é um caso único no impressionante mundo musical da Bahia. Ele era um tesouro guardado. Agora acho que chegou o momento de o Brasil conhecer a natureza e a dimensão de sua obra.”

Foto: Divulgação

E de fato é impressionante, logo de saída, como um músico na casa dos 70 anos (assim como Caetano, Gil e Tom Zé) consegue criar uma das músicas mais modernas que se tem notícia nas últimas décadas. Mas, longe de ser chato e hermético, Tuzé é fluido, alegre, bem-humorado, instigante. Tudo nele, apesar da vasta formação musical, transpira à canção popular.

Este é apenas o seu segundo disco de carreira. Apesar de ter participado como instrumentista em shows e gravações com diversos artistas, como o grupo Doces Bárbaros, Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil, Maria Bethânia, Isaac Karabicheswsky, Rosinha de Valença, João Donato, Walter Smetak, Morais Moreira, Luís Melodia, Cauby Peixoto, Chico Buarque e Carlinhos Brown, entre outros, até agora Tuzé só tinha um álbum, o “Larrálibus Escumálicus Cujolélibus”, lançado há 18 anos.

“Contraduzindo” é repleto dos inventivos sopros do autor, que já atuou como flautista na Orquestra Sinfônica da Ufba (Universidade Federal da Bahia). A direção musical, os arranjos e violões são assinados por Gil Camará e a capa traz uma caricatura sua assinada por Artur Soares.

O álbum conta ainda com as participações de Heitor Dantas (guitarra), Sebastian Notine (Prato Indiano), Aluá Nascimento (cajon de pé) e Marco Rasta (percussão).

O disco se divide entre canções aparentemente lineares, como “Nem”, mas que trazem extrema inventividade: “Não consigo fazer nada, porque não estou aqui, não tô aqui nem tô chegando, nem acordado nem sonhando, não tô aqui nem tô chegando, nem sim, nem não, talvez”.

Outras, estruturadas com experimentos mais radicais, como a inventiva “Suíte Casazul”, onde o compositor desfia toda a sua capacidade orquestral e como instrumentista, alterna movimentos que contrapõe música de vanguarda com pífanos, numa linda atmosfera onde vale destacar o violão de Gil Camará.

Nada é simples ou banal em “Contraduzindo”. Como o próprio Caetano traduz, “Tuzé é um fruto fascinante da vanguarda baiana iniciada no final dos anos 1950 e que entrou pelos 1960. Tudo nele resume os concertos na Reitoria, de que ele chegou a ser espectador antes de tornar-se músico da sinfônica. Tudo ressoa à passagem de Kollreuter e Lina por Salvador”, disse.

“Contraduzindo”, de Tuzé de Abreu é um raio de luz nestes tempos de medo, marasmo e mediocridade, vindo de uma fonte longínqua direto para o futuro.

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