Por Valentin Katasonov.
A meta estratégica de política externa dos Estados Unidos para 2016 deverá ser a finalização das negociações sobre o acordo de Parceria Transatlântica para Comércio e Investimento (TTIP – Transatlantic Trade and Investiment Partnership em inglês – NT). Conforme relatado pela imprensa, o acordo deverá criar uma zona de livre comércio entre os Estados Unidos e a União Europeia. Esses países são responsáveis por 60% do PIB e 33% do comércio global.
Enquanto isso, o acordo TPP (Trans-Pacific Partnership), com o total de 12 países signatários que assinaram o termo inicial do acordo em Atlanta em Outubro de 2015 ainda necessita ser ratificado para entrar em vigor. Os países incluídos no TPP acumulariam estimados 40% do comércio global.
Resultado de imagem para OMCDesempenha papel decisivo nos dois acordos os Estados Unidos, responsáveis por cerca de 10% do comércio global segundo as estimativas mais confiáveis. Assim, se os dois acordos entrarem em vigor, as duas parcerias transoceânicas controlariam 73% do comércio global. Falando mais claramente, os Estados Unidos controlariam o comércio.
Claro que já existe uma entidade mundial que teria sido criada para assegurar o livre comércio. Estamos falando da Organização Mundial do Comércio – OMC (World Trade Organization – WTO na sigla em inglês – NT). Na atualidade, 162 países constam como membros da OMC. Desde o seu início, a organização (que era conhecida até 1995 como General Agreement on Tariffs and Trade – GATT) foi pensada de maneira que um grupo muito seletivo de países teriam direito ao voto decisivo nas questões chave da organização. A “liberalização” do comércio mundial era na realidade regulada pelos Estados Unidos, Europa Ocidental, Japão, Canadá e Austrália, sempre em benefício de suas variadas corporações multinacionais (MNCs – Multi-Nacional Corporations), o que se tornou cada vez mais difícil a cada ano, principalmente mais recentemente. Negocia-se desde 2001, com os países em desenvolvimento tentando maneira mais fácil de colocar seus produtos (principalmente agrícolas) no mercado mundial com ênfase no mercado ocidental, e nenhum progresso foi alcançado desde então. Para Washington e seus aliados torna-se cada vez mais difícil defender seus interesses nos mercados globais de bens e serviços. A situação se tornou ainda mais complicada para os países ocidentais dominantes quando a Rússia passou a fazer parte da OMC em 2012, trazendo para a ribalta a possível criação de um bloco dos países BRICS no interior da OMC.
Em 2012 os Estados Unidos começaram a criar plataformas alternativas à OMC, na forma de duas parcerias transoceânicas, com a ideia primordial de que seriam os Estados Unidos que ditariam as regras do jogo para essas plataformas. A consequência seria que a OMC acabaria pouco a pouco, tornando-se gradativamente uma concha vazia. O objetivo de Washington com estas manobras: 1)retomar o controle do comércio global e 2) enfraquecer economicamente a China, a Rússia e outros países BRICS, isolando-os de parceiros comerciais.
Acontecem acusações frequentes de que as duas parcerias teriam o efeito de fazer os Estados Unidos capazes de controlar efetivamente o comércio global. Isso não é totalmente verdade. Primeiro, temos que esclarecer três pontos.
O primeiro => sim, os Estados Unidos, agindo como Estado, é o patrocinador de ambos os projetos, mas na realidade os EUA estão trabalhando para favorecer os interesses de suas corporações multinacionais (MNCs) e de seus bancos multinacionais (MNBs), e são estas as entidades que de fato controlarão o comércio mundial. Quanto aos Estados Unidos, com o tempo entrará em declínio e será transformado em outra concha vazia, exatamente como a Organização Mundial do Comércio.
O Segundo => Não é apenas o comércio que cairá totalmente sob controle das MNCs e MNBs, como também a vida econômica, social e política de todo e cada país envolvido nessas parcerias. Os Estados que swe juntarem ao TTIP e ao TPP perderão todas as suas prerrogativas de soberania.
O terceiro => Além de estarem associadas às duas parcerias transoceânicas, o plano central inclui ainda um terceiro elemento que raramente é mencionado. É o Acordo de Livre Comércio de Serviços (TiSA na Sigla em inglês).
Fica explícito que todos os países que assinarem os acordos TTIP e o TPP concordam também em se juntarem ao TiSA. Neste contexto, fica claro que o TTIP e o TPP funcionam como Cavalos de Tróia, mas o Acordo de Livre Comércio de Serviços funciona como uma arma poderosa que garante a “vitória final”. Por “Vitória Final” entenda-se a total erradicação da soberania dos Estados signatários.
Resultado de imagem para TiSANinguém tinha ouvido falar no TiSA até um ano e meio atrás. As primeiras informações sobre o acordo emergente surgiram apenas no site do Wikileaks no verão de 2014. As informações indicavam que os Estados Unidos e a Austrália eram os países que lideravam as negociações. Gradualmente, esse círculo se expandiu com mais países aderindo. Quando a informação vazou, 50 países (entre os quais os 28 membros da União Europeia) – responsáveis por um total de quase 70% do comércio global de serviços – já estavam envolvidos nas conversações.
Há três fatos importantes que temos que saber sobre as preparações para a implantação do TiSA.
Em primeiro lugar, As negociações sobre a implantação do TiSA não estão na órbita da Organização Mundial do Comércio. Ora, já existe um Acordo Geral para o Comércio de Serviços (GATS na sigla em inglês) que opera dentro dos quadros da OMC. Mas considerando que vários problemas permanecem insolúveis no comércio internacional de serviços, parece lógico que o ideal seria melhorar o GATS. Mas os Estados Unidos e seus aliados decidiram que a OMC estava se atrapalhando nas resoluções dos conflitos comerciais e resolveram criar uma plataforma paralela para essas negociações. Essa atitude está arruinando uma organização que já conta sete décadas de existência (o GATT – de onde se originou a OMC – surgiu em 1947).
Resultado de imagem para TiSASegundo, teimosa e inflexivelmente, não se convida a Rússia, China, Índia, Brasil e África do Sul para tomar parte nas discussões sobre o TiSA. Eles nunca foram oficialmente notificados sobre a existência do projeto. Trata-se de uma verdadeira política de isolamento, o que significa que a criação do TiSA visa confrontação e não cooperação. Foi a razão que levou Barak Obama a afirmar que os Estados Unidos não permitiria que a China impusesse as regras da economia global. Afinal, tal imposição seria um direito dos Estados Unidos.
Terceiro: até o verão de 2014, os trabalhos para a implantação do TiSA corriam em completo segredo. Caso assinado, o conteúdo do acordo deverá permanecer em segredo por cinco anos. Se não assinado, os materiais relativos ao assunto assim como o teor das negociações devem permanecer “em segredo” por cinco anos. Democracia? E quem se importa? A democracia acabou.
A Comissão Europeia (CE) negociava o TiSA pelas costas e sem o conhecimento e aprovação dos Estados Membros da União Europeia ou do Parlamento Europeu. Até meados de 2014, o Parlamento Europeu ainda não tinha sido informado sobre as negociações em andamento sobre o TiSA, mas no verão de 2014 o Comitê para Comércio Internacional (INTA na sigla em inglês) manifestou interesse sobre o processo de negociações, provocado pelas sérias preocupações que surgiram na sequência das publicações do Wikileaks. Viviane Reding, membro do Parlamento Europeu, foi nomeada relatora sobre o TiSA. Em conferência de imprensa concedida em 13 de janeiro de 2015, ela queixou-se da completa falta de transparência no processo de negociações, enfatizando que a transparência é conditio sine qua non para assegurar que o Parlamento Europeu, seus parceiros sociais e ONGs desempenhem um papel no processo. No entanto, debaixo da pressão da opinião pública, os Estados membros da União Europeia autorizaram formalmente a Comissão Europeia a entabular conversações sobre o TiSA, em março de 2015.
As negociações estão sendo conduzidas em Genebra. Começaram oficialmente em Março de 2013. Já aconteceram 15 etapas das conversações, com a última acontecendo em dezembro de 2015 e a próxima marcada para fevereiro de 2016. Os encontros são presididos rotativamente pelos Estados Unidos, União Europeia e Austrália. Agora, memorandos e press releases são distribuídos depois de cada rodada das conversações, mas são apenas pedaços de papel, sem conteúdo.
A seguir, uma listagem dos principais elementos do TiSA.
Primeiro, o TiSA estabelece que assim que o acordo entre em vigor, as regras do jogo em mercados de serviços não mais serão escritas pelos Estados Nacionais, mas por instituições supranacionais. Os Estados perderão o direito de elaborar quaisquer tipos de legislação que possa causar prejuízo para os negócios ou mercados de serviços.
Segundo, as regulações estipuladas pelo TiSA afetarão não apenas os mercados de serviços comerciais (transporte, turismo, hospedagem, comunicações, consumidores, etc.) mas também as maiores e mais importantes funções dos Estados. Na terminologia do TiSA, são conhecidas como “serviços públicos”.
Terceiro, o TiSA estabelece que os Estados cessarão gradualmente a prestação de serviços públicos, que passarão a fazer parte das atividades da iniciativa privada.
Vamos parar um pouco aqui. Os operadores do TiSA querem mudar para o público o conceito de “serviço público” (primeiro passo), mais tarde, darão o segundo passo, convencendo a população da necessidade de pagar por esses “serviços”. Então pode ser dado o terceiro passo, que é convencer o povo que tais “serviços” não devem ser necessariamente providos pelo Estado, e que a iniciativa privada pode fornecer um serviço melhor, mais qualificado e mais barato. Daí as entidades privadas providenciarão para o público serviços “eficientes”, nas áreas de habitação, cuidados com a saúde, educação e outros serviços. TODOS NÓS SABEMOS O QUE ACONTECERÁ NO MUNDO REAL.
Quarto, o TiSA requer que o Mercado nacional de serviços seja totalmente aberto para a entrada de corporações e bancos multinacionais (MNCs e MBBs). Como resultado, a esfera do Estado como fornecedor de serviços de “interesses comuns da população” desaparecerá.
Quinto: o TiSA destroi todas as funções sociais do Estado (educação, saúde, serviços públicos), ao quais deverão cair nas mãos e ser fornecidos pelas entidades supranacionais. Então, a regulação estatal sobre o setor financeiro deverá ser eliminada. Isto se aplica primariamente ao setor de segurança e setor bancário. Também deverão ser regulados por entidades supranacionais. O TiSA impõe a futura liberação dos mercados financeiros (apesar do fato de que a crise financeira de 2007/2009 ter provado que essa atitude é um erro). O aspecto mais importante da iminente reforma financeira (e a governança global como um todo) é a transição para uma economia totalmente desmonetarizada (economia sem dinheiro, digitalizada – no original cashless economy – NT). É a maneira mais fácil de controlar (e cobrar pela) a prestação de serviços para o público, e de cortar os serviços de quem não puder pagar.
Finalmente, os serviços de informação (a mídia, Internet, bibliotecas, livrarias) receberão atenção especial. O TiSA impõe a condição de que o público seja mantido com rédea curta, através do uso dos sistemas de informação e tecnologias de comunicação que tornem possível fazer a monitorização da obediência dos cidadãos às normas e padrões colocados pelas instituições nacionais (a governança mundial).
Na realidade, o TiSA é um plano para privatizar os Estados onde ele funciona como um prestador/regulador de serviços sociais, financeiros e de informação. Ocorre que não serão os bilhões de pessoas que habitam o planeta os beneficiários do projeto, mas aquelas famílias do oligarquia global, que estão construindo um campo de concentração planetário em nome da “governança mundial”.
Uma olhada nos principais documentos até agora revelados sobre o acordo revela um plano da oligarquia financeira global e dos senhores do dinheiro para tomar o poder global de uma vez por todas. Deixados de lado os embates piegas e vazios sobre “democracia”, “direitos humanos” ou “responsabilidade social das empresas”. Tudo é rígido, exato e sério, com o movimento direcionado resolutamente na direção do objetivo. A meta do acordo é a transição definitiva para uma nova ordem mundial muito semelhante àquela descrita por George Orwell em seus livros “1984” e “A Revolução dos Bichos” (Animal Farm – NT). Os mestres do dinheiro têm pressa. O TiSA está previsto para ser implementado em 2020, mas provavelmente o processo será acelerado.
Valentin KATASONOV – (nasceu em 5/4/1950) tornou-se professor do Instituto Estatal de Moscou de Relações Internacionais (MGIMO) onde lecionou de 1972 até 1990. É conhecido autor russo no mercado financeiro internacional. É também cientista e escritor respeitado. Doutor em Ciências Econômicas e membro da Academia de Ciências Econômicas e de Negócios da Rússia. Em 1991, escreveu a monografia: “Uma grande potência ou potência ambiental?”; entre 1991-1993 trabalhou como Consultor Econômico da ONU.
No período 1993-1996 foi membro do Conselho Consultivo do Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento (BERD). Entre 1996 e 2000 foi Vice-Diretor do Russian National Investment Bank. No período de 2001 a 2011 foi Diretor do Departamento de Relações Internacionais para Assuntos de Câmbio, Moedas e Fundos do BERD. A partir de 2012 tornou-se Analista Econômico independente (free-lance). Escreveu durante a carreira inúmeros livros, ensaios, monografias e artigos publicados em diversos veículos de imprensa.
A meta estratégica de política externa dos Estados Unidos para 2016 deverá ser a finalização das negociações sobre o acordo de Parceria Transatlântica para Comércio e Investimento (TTIP – Transatlantic Trade and Investiment Partnership em inglês – NT). Conforme relatado pela imprensa, o acordo deverá criar uma zona de livre comércio entre os Estados Unidos e a União Europeia. Esses países são responsáveis por 60% do PIB e 33% do comércio global.
Enquanto isso, o acordo TPP (Trans-Pacific Partnership), com o total de 12 países signatários que assinaram o termo inicial do acordo em Atlanta em Outubro de 2015 ainda necessita ser ratificado para entrar em vigor. Os países incluídos no TPP acumulariam estimados 40% do comércio global.
Desempenha papel decisivo nos dois acordos os Estados Unidos, responsáveis por cerca de 10% do comércio global segundo as estimativas mais confiáveis. Assim, se os dois acordos entrarem em vigor, as duas parcerias transoceânicas controlariam 73% do comércio global. Falando mais claramente, os Estados Unidos controlariam o comércio.
Claro que já existe uma entidade mundial que teria sido criada para assegurar o livre comércio. Estamos falando da Organização Mundial do Comércio – OMC (World Trade Organization – WTO na sigla em inglês – NT). Na atualidade, 162 países constam como membros da OMC. Desde o seu início, a organização (que era conhecida até 1995 como General Agreement on Tariffs and Trade – GATT) foi pensada de maneira que um grupo muito seletivo de países teriam direito ao voto decisivo nas questões chave da organização. A “liberalização” do comércio mundial era na realidade regulada pelos Estados Unidos, Europa Ocidental, Japão, Canadá e Austrália, sempre em benefício de suas variadas corporações multinacionais (MNCs – Multi-Nacional Corporations), o que se tornou cada vez mais difícil a cada ano, principalmente mais recentemente. Negocia-se desde 2001, com os países em desenvolvimento tentando maneira mais fácil de colocar seus produtos (principalmente agrícolas) no mercado mundial com ênfase no mercado ocidental, e nenhum progresso foi alcançado desde então. Para Washington e seus aliados torna-se cada vez mais difícil defender seus interesses nos mercados globais de bens e serviços. A situação se tornou ainda mais complicada para os países ocidentais dominantes quando a Rússia passou a fazer parte da OMC em 2012, trazendo para a ribalta a possível criação de um bloco dos países BRICS no interior da OMC.
Em 2012 os Estados Unidos começaram a criar plataformas alternativas à OMC, na forma de duas parcerias transoceânicas, com a ideia primordial de que seriam os Estados Unidos que ditariam as regras do jogo para essas plataformas. A consequência seria que a OMC acabaria pouco a pouco, tornando-se gradativamente uma concha vazia. O objetivo de Washington com estas manobras: 1)retomar o controle do comércio global e 2) enfraquecer economicamente a China, a Rússia e outros países BRICS, isolando-os de parceiros comerciais.
Acontecem acusações frequentes de que as duas parcerias teriam o efeito de fazer os Estados Unidos capazes de controlar efetivamente o comércio global. Isso não é totalmente verdade. Primeiro, temos que esclarecer três pontos.
O primeiro => sim, os Estados Unidos, agindo como Estado, é o patrocinador de ambos os projetos, mas na realidade os EUA estão trabalhando para favorecer os interesses de suas corporações multinacionais (MNCs) e de seus bancos multinacionais (MNBs), e são estas as entidades que de fato controlarão o comércio mundial. Quanto aos Estados Unidos, com o tempo entrará em declínio e será transformado em outra concha vazia, exatamente como a Organização Mundial do Comércio.
O Segundo => Não é apenas o comércio que cairá totalmente sob controle das MNCs e MNBs, como também a vida econômica, social e política de todo e cada país envolvido nessas parcerias. Os Estados que swe juntarem ao TTIP e ao TPP perderão todas as suas prerrogativas de soberania.
O terceiro => Além de estarem associadas às duas parcerias transoceânicas, o plano central inclui ainda um terceiro elemento que raramente é mencionado. É o Acordo de Livre Comércio de Serviços (TiSA na Sigla em inglês).
Fica explícito que todos os países que assinarem os acordos TTIP e o TPP concordam também em se juntarem ao TiSA. Neste contexto, fica claro que o TTIP e o TPP funcionam como Cavalos de Tróia, mas o Acordo de Livre Comércio de Serviços funciona como uma arma poderosa que garante a “vitória final”. Por “Vitória Final” entenda-se a total erradicação da soberania dos Estados signatários.
Ninguém tinha ouvido falar no TiSA até um ano e meio atrás. As primeiras informações sobre o acordo emergente surgiram apenas no site do Wikileaks no verão de 2014. As informações indicavam que os Estados Unidos e a Austrália eram os países que lideravam as negociações. Gradualmente, esse círculo se expandiu com mais países aderindo. Quando a informação vazou, 50 países (entre os quais os 28 membros da União Europeia) – responsáveis por um total de quase 70% do comércio global de serviços – já estavam envolvidos nas conversações.
Há três fatos importantes que temos que saber sobre as preparações para a implantação do TiSA.
Em primeiro lugar, As negociações sobre a implantação do TiSA não estão na órbita da Organização Mundial do Comércio. Ora, já existe um Acordo Geral para o Comércio de Serviços (GATS na sigla em inglês) que opera dentro dos quadros da OMC. Mas considerando que vários problemas permanecem insolúveis no comércio internacional de serviços, parece lógico que o ideal seria melhorar o GATS. Mas os Estados Unidos e seus aliados decidiram que a OMC estava se atrapalhando nas resoluções dos conflitos comerciais e resolveram criar uma plataforma paralela para essas negociações. Essa atitude está arruinando uma organização que já conta sete décadas de existência (o GATT – de onde se originou a OMC – surgiu em 1947).
Segundo, teimosa e inflexivelmente, não se convida a Rússia, China, Índia, Brasil e África do Sul para tomar parte nas discussões sobre o TiSA. Eles nunca foram oficialmente notificados sobre a existência do projeto. Trata-se de uma verdadeira política de isolamento, o que significa que a criação do TiSA visa confrontação e não cooperação. Foi a razão que levou Barak Obama a afirmar que os Estados Unidos não permitiria que a China impusesse as regras da economia global. Afinal, tal imposição seria um direito dos Estados Unidos.
Terceiro: até o verão de 2014, os trabalhos para a implantação do TiSA corriam em completo segredo. Caso assinado, o conteúdo do acordo deverá permanecer em segredo por cinco anos. Se não assinado, os materiais relativos ao assunto assim como o teor das negociações devem permanecer “em segredo” por cinco anos. Democracia? E quem se importa? A democracia acabou.
A Comissão Europeia (CE) negociava o TiSA pelas costas e sem o conhecimento e aprovação dos Estados Membros da União Europeia ou do Parlamento Europeu. Até meados de 2014, o Parlamento Europeu ainda não tinha sido informado sobre as negociações em andamento sobre o TiSA, mas no verão de 2014 o Comitê para Comércio Internacional (INTA na sigla em inglês) manifestou interesse sobre o processo de negociações, provocado pelas sérias preocupações que surgiram na sequência das publicações do Wikileaks. Viviane Reding, membro do Parlamento Europeu, foi nomeada relatora sobre o TiSA. Em conferência de imprensa concedida em 13 de janeiro de 2015, ela queixou-se da completa falta de transparência no processo de negociações, enfatizando que a transparência é conditio sine qua non para assegurar que o Parlamento Europeu, seus parceiros sociais e ONGs desempenhem um papel no processo. No entanto, debaixo da pressão da opinião pública, os Estados membros da União Europeia autorizaram formalmente a Comissão Europeia a entabular conversações sobre o TiSA, em março de 2015.
As negociações estão sendo conduzidas em Genebra. Começaram oficialmente em Março de 2013. Já aconteceram 15 etapas das conversações, com a última acontecendo em dezembro de 2015 e a próxima marcada para fevereiro de 2016. Os encontros são presididos rotativamente pelos Estados Unidos, União Europeia e Austrália. Agora, memorandos e press releases são distribuídos depois de cada rodada das conversações, mas são apenas pedaços de papel, sem conteúdo.
A seguir, uma listagem dos principais elementos do TiSA.
Primeiro, o TiSA estabelece que assim que o acordo entre em vigor, as regras do jogo em mercados de serviços não mais serão escritas pelos Estados Nacionais, mas por instituições supranacionais. Os Estados perderão o direito de elaborar quaisquer tipos de legislação que possa causar prejuízo para os negócios ou mercados de serviços.
Segundo, as regulações estipuladas pelo TiSA afetarão não apenas os mercados de serviços comerciais (transporte, turismo, hospedagem, comunicações, consumidores, etc.) mas também as maiores e mais importantes funções dos Estados. Na terminologia do TiSA, são conhecidas como “serviços públicos”.
Terceiro, o TiSA estabelece que os Estados cessarão gradualmente a prestação de serviços públicos, que passarão a fazer parte das atividades da iniciativa privada.
Vamos parar um pouco aqui. Os operadores do TiSA querem mudar para o público o conceito de “serviço público” (primeiro passo), mais tarde, darão o segundo passo, convencendo a população da necessidade de pagar por esses “serviços”. Então pode ser dado o terceiro passo, que é convencer o povo que tais “serviços” não devem ser necessariamente providos pelo Estado, e que a iniciativa privada pode fornecer um serviço melhor, mais qualificado e mais barato. Daí as entidades privadas providenciarão para o público serviços “eficientes”, nas áreas de habitação, cuidados com a saúde, educação e outros serviços. TODOS NÓS SABEMOS O QUE ACONTECERÁ NO MUNDO REAL.
Quarto, o TiSA requer que o Mercado nacional de serviços seja totalmente aberto para a entrada de corporações e bancos multinacionais (MNCs e MBBs). Como resultado, a esfera do Estado como fornecedor de serviços de “interesses comuns da população” desaparecerá.
Quinto: o TiSA destroi todas as funções sociais do Estado (educação, saúde, serviços públicos), ao quais deverão cair nas mãos e ser fornecidos pelas entidades supranacionais. Então, a regulação estatal sobre o setor financeiro deverá ser eliminada. Isto se aplica primariamente ao setor de segurança e setor bancário. Também deverão ser regulados por entidades supranacionais. O TiSA impõe a futura liberação dos mercados financeiros (apesar do fato de que a crise financeira de 2007/2009 ter provado que essa atitude é um erro). O aspecto mais importante da iminente reforma financeira (e a governança global como um todo) é a transição para uma economia totalmente desmonetarizada (economia sem dinheiro, digitalizada – no original cashless economy – NT). É a maneira mais fácil de controlar (e cobrar pela) a prestação de serviços para o público, e de cortar os serviços de quem não puder pagar.
Finalmente, os serviços de informação (a mídia, Internet, bibliotecas, livrarias) receberão atenção especial. O TiSA impõe a condição de que o público seja mantido com rédea curta, através do uso dos sistemas de informação e tecnologias de comunicação que tornem possível fazer a monitorização da obediência dos cidadãos às normas e padrões colocados pelas instituições nacionais (a governança mundial).
Na realidade, o TiSA é um plano para privatizar os Estados onde ele funciona como um prestador/regulador de serviços sociais, financeiros e de informação. Ocorre que não serão os bilhões de pessoas que habitam o planeta os beneficiários do projeto, mas aquelas famílias do oligarquia global, que estão construindo um campo de concentração planetário em nome da “governança mundial”.
Uma olhada nos principais documentos até agora revelados sobre o acordo revela um plano da oligarquia financeira global e dos senhores do dinheiro para tomar o poder global de uma vez por todas. Deixados de lado os embates piegas e vazios sobre “democracia”, “direitos humanos” ou “responsabilidade social das empresas”. Tudo é rígido, exato e sério, com o movimento direcionado resolutamente na direção do objetivo. A meta do acordo é a transição definitiva para uma nova ordem mundial muito semelhante àquela descrita por George Orwell em seus livros “1984” e “A Revolução dos Bichos” (Animal Farm – NT). Os mestres do dinheiro têm pressa. O TiSA está previsto para ser implementado em 2020, mas provavelmente o processo será acelerado.
Tradução de btpsilveira.
Valentin KATASONOV – (nasceu em 5/4/1950) tornou-se professor do Instituto Estatal de Moscou de Relações Internacionais (MGIMO) onde lecionou de 1972 até 1990. É conhecido autor russo no mercado financeiro internacional. É também cientista e escritor respeitado. Doutor em Ciências Econômicas e membro da Academia de Ciências Econômicas e de Negócios da Rússia. Em 1991, escreveu a monografia: “Uma grande potência ou potência ambiental?”; entre 1991-1993 trabalhou como Consultor Econômico da ONU.
No período 1993-1996 foi membro do Conselho Consultivo do Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento (BERD). Entre 1996 e 2000 foi Vice-Diretor do Russian National Investment Bank. No período de 2001 a 2011 foi Diretor do Departamento de Relações Internacionais para Assuntos de Câmbio, Moedas e Fundos do BERD. A partir de 2012 tornou-se Analista Econômico independente (free-lance). Escreveu durante a carreira inúmeros livros, ensaios, monografias e artigos publicados em diversos veículos de imprensa.
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Fonte: http://mberublue.blogspot.com.br/2016/01/o-acordo-de-livre-comercio-de-servicos.html#more