Por Solange Engelmann.
Após a conquista da terra, que transforma áreas antes concentradas em latifúndios em territórios destinados à Reforma Agrária, a liberação de créditos agrícolas voltados para a agricultura familiar torna-se uma condição fundamental. Esses créditos, oferecidos pelos governos, são essenciais tanto para a estruturação e o desenvolvimento social dos assentamentos quanto para impulsionar a produção de alimentos destinados ao autoconsumo e a geração de renda no campo, contribuindo diretamente para o combate à fome no país.
A conquista desses créditos pelos movimentos populares não tem sido nada fácil nos últimos anos, já que o orçamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para a Reforma Agrária vem se tornando a cada ano mais escasso. Porém, a partir das lutas do último período junto ao governo Lula, o MST, juntamente com outros movimentos populares na luta pela Reforma Agrária e por incentivos para a Agricultura Familiar brasileira conquistou duas novas medidas importantes no acesso das famílias assentadas ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).
Medidas recentes de crédito
As medidas foram anunciadas em 21 de novembro pelo Banco do Brasil, por meio da Resolução nº 5.183 do Conselho Monetário Nacional (CMN). Essa norma permite que cooperativas da Reforma Agrária acessem crédito para investimentos na cadeia da bovinocultura e autoriza as famílias assentadas a solicitar um segundo crédito pelo Pronaf A – Investimento e Custeio A/C. Com isso, as famílias que antes tinham direito a apenas uma liberação passam a poder acessar novamente os recursos do Pronaf A.
O coordenador nacional do setor de produção do MST, Diego Moreira, explica que a conquista do acesso a esses novos créditos é fundamental para as famílias assentadas avançarem na produção de alimentos e para as cooperativas de Reforma Agrária se estruturarem nas principais cadeias produtivas, especialmente aquelas que possuem relacionados à cesta básica.
“Essa resolução é fundamental para dar um fôlego para as cooperativas para que possam acessar o volume de recurso de até 8 milhões a partir das DAP (Declaração de Aptidão ao Pronaf)/CAF (Cadastro Nacional da Agricultura Familiar) de seus associados, seus produtores. E vai possibilitar a dinamização do processo da agroindústria e do processo da comercialização”, afirma Moreira.
Atualmente o MST está presente em 24 estados brasileiros, abrangendo as cinco regiões do país, e reúne aproximadamente 450 mil famílias assentadas da Reforma Agrária, que conquistaram a terra por meio da luta e organização dos trabalhadores rurais. A produção nos assentamentos é fortalecida por 185 cooperativas e 120 agroindústrias. Dentre elas, cooperativas de cinco estados atuam na cadeia da bovinocultura, englobando as etapas de produção, agroindustrialização e comercialização de leite e seus derivados.
O dirigente também destaca que a liberação desse novo crédito agrícola para as cooperativas vai possibilitar acesso à investimentos na cadeia da bovinocultura, como em infraestruturas, melhoramento genético, entre outros insumos fundamentais para assegurar um capital de giro, por exemplo, na cadeia do leite. Dessa forma, irá ajudar no desenvolvimento das cooperativas que atuam no setor leiteiro, uma cadeia produtiva importante para as famílias assentadas e que se encontra em fase de consolidação nas áreas de Reforma Agrária de todo o país. Portanto, o crédito pode auxiliar tanto nos investimentos, como no custeio para a estruturação da cadeia do leite como um todo, nas áreas de assentamento.
Outra demanda das famílias assentadas do MST junto ao governo federal é o Desenrola Rural. Segundo Diego Moreira, esse programa busca possibilitar às famílias assentadas, que estão inadimplentes em relação aos créditos agrícolas, a renegociação de suas dívidas, com até 90% de desconto. Dessa forma, seria possível recuperar o score bancário e permitir o retorno ao acesso a políticas públicas importantes, como o Pronaf.
“Devido ao governo anterior e à conjuntura de crise econômica que o país viveu, hoje temos um passivo significativo de famílias assentadas com irregularidades bancárias e sem escore suficiente. A ideia é que, através do Desenrola Rural, possamos liquidar essas situações, possibilitando que todos e todas voltem a acessar recursos da União através das agências financeiras”, conclui o dirigente.
Como acessar os novos créditos?
Para acessar os novos créditos, as diretorias das cooperativas e as famílias assentadas devem procurar as agências do Banco do Brasil mais próximas para obterem informações. Também é importante buscar orientações nas cooperativas de Reforma Agrária às quais estão vinculadas. As cooperativas precisam ter suas DAPs jurídicas ativas, e os seus produtores devem estar com as CAFs regularizadas para garantir o acesso aos créditos.
A situação é a mesma para os assentados e assentadas, que podem acessar os créditos como pessoa física, utilizando o CPF. De acordo com a Resolução nº 5.183 do CMN, do Banco do Brasil, aqueles que não estejam inadimplentes — ou seja, sem dívidas atrasadas ou créditos não quitados junto ao Pronaf — poderão acessar uma nova parcela de até R$ 50 mil pelo Pronaf A. Essa linha de crédito oferece uma taxa de juros de 3% ao ano, três anos de carência, dez anos para pagamento e um desconto de 25% em cada parcela.
Além disso, com a conquista dos novos créditos, cada família assentada terá direito a até três créditos na modalidade Pronaf Custeio, com valor de R$ 20 mil por ano, durante três anos consecutivos. Esses créditos representam um importante suporte financeiro para fortalecer a produção e estruturação dos assentamentos da Reforma Agrária em todo o país.
*Editado originalmente por Fernanda Alcântara