Novo normal da política exterior de Trump Mamão com Açúcar

Por Pepe Escobar, Sputnik News.

Tradução: Coletivo Vila Vudu.

No vídeo, o comandante-em-chefe da Escola de Política Externa do LBC (Lindo Bolo de Chocolate), discorrendo sobre seu novo movimento com vistas à Coreia do Norte. 
“Estamos mandando uma armada. Muito poderosa. Temos submarinos. Muito poderosos. Muito mais poderosos que o porta-aviões. Lá isso eu garanto! Não há dúvidas!”
Como se bombardear uma Coreia do Norte armada com bomba atômica fosse tão mamão com açúcar (“lindo bolo de chocolate”) como Tomahawkear uma base-aérea semideserta na Síria. Mas essa é a beleza de uma política externa de caixinha de chocolates: você nunca sabe o que haverá dentro.
OTAN era “obsoleta.” Depois, “deixou de ser obsoleta”. China era manipuladora de moeda, depois, deixou de ser manipuladora de moedas. Fim das aventuras no Oriente Médio. Depois, volta a ser como com Hillary, e bombardeia a Síria. Rússia era dita parceira – basicamente em negócios de petróleo e gás. Depois, num remix do Dividir para Governar de Kissinger, tenta minar a parceria estratégica Rússia-China. Depois, a Rússia é do mal porque apoia Assad, “aquele animal” (sic).
Há algumas (outras) coisas que nunca mudam. O Irã continuará a ser demonizado. O combo OTAN-CCG continuará a ser reforçado. A Casa de Saud sempre a aterrorizar o Iêmen continuará a ser aliada íntima da Guerra Global ao Terror [ing. GWOT, Global War on Terror].
É como se a máquina de governo completamente disfuncional de Trump se tivesse tornado prisioneira da tarefa em tempo integral de justificar as idas e vindas e descaradas mentiras do Comandante-em-chefe Tomahawk-com-chocolate… apesar de a força dele, antes, ter vindo de expor as mentiras e a hipocrisia incorporadas no nexo establishment/estado profundo nos EUA.
Xi está no telefone
A inteligência deve ter inferido corretamente que o principal objetivo da visita do secretário de Estado “T. Rex” Tillerson a Moscou foi reduzir o mais possível a alta voltagem e altas apostas no jogo em curso, enquanto Trump se movimenta para confrontar Pyongyang. Washington simplesmente não consegue administrar tantas crises simultâneas na Síria, Ucrânia, Coreia do Norte, Mar do Sul da China, Afeganistão. Prazo limite possível é o dia 9 de maio; eleição presidencial na Coreia do Sul pode fazer parar qualquer ataque dos EUA à Coreia do Norte.
Mídias japonesa e sul coreana noticiam histericamente o deslocamento de coisa como 150 mil soldados do Exército de Libertação Popular chinês (partes dos 16º, 23º, 39º e 40º Grupos), para a fronteira sino-norte-coreana. Não são contingentes de assalto, ou agressivos: são parte de esforços coordenados para aliviar uma previsível crise de refugiados, no caso – apavorante – de eclodir uma 2ª Guerra da Coreia.
O Ministério de Defesa da China emitiu uma espécie de desmentido sem desmentir, sobre o deslocamento. Mas o elemento crucial foi o telefonema, logo depois, que Xi Jinping fez para Trump. Prioridade número um, dissipar a narrativa infladíssima da mídia-empresa nos EUA, segundo a qual Pequim aprovaria um ataque dos EUA contra Coreia do Norte (ao contrário: a ideia preocupa Pequim muito gravemente). A mídia chinesa enfatizou que Xi fez saber enfaticamente a um Trump sempre volátil, que o único modo de sair do atual impasse é andar na direção de uma desnuclearização pacífica da Península Coreana.
Segunda, na lista de prioridades foi dissipar a noção, de mídia fake e notícias idem de que Xi, de cara para sua sobremesa Tomahawk-com-bolo-de-chocolate em Mar-a-Lago, teria concordado com novos ataques dos EUA à Síria. No telefonema, Xi mais uma vez insistiu que o único modo de sair do impasse na Síria é uma solução diplomática.
Agora que o novo normal é a Escola de Política Externa do LBC (Lindo Bolo de Chocolate), ninguém mais faz nem ideia de qual seja a política de Washington para a Síria, e quem está no volante (essa era a informação crucial que o Ministro Lavrov, de Relações Exteriores, tentava arrancar de Tillerson).
Antes, a política era óbvia: balcanização light, com um enclave curdo no deserto oriental, a ser governado por delegados dos EUA como a pequena população de curdos sírios; Israel arrancando para ela mais outra fatia das Colinas do Golan; uma beliscada no norte, para a Turquia; e propriedade imobiliária suficiente para acalmar sortimento variado de sunitas e jihadistas.
Mesmo antes do show dos Tomahawk, agentes da inteligência militar dos EUA distribuídos por todo o Oriente Médio já tinham sérias dúvidas sobre o que se converteu em narrativa oficial da Casa Branca para o ataque químico em Idlib. Conhecidos baluartes e ex-funcionários da inteligência dos EUA, dentre os quais Ray McGovern, Phil Giraldi e Bill Binney, até escreveram um memorando endereçado a Trump, pedindo investigação independente, honesta e confiável – o mesmo requerimento que Lavrov, adiante, faria claramente na conferência de imprensa com Tillerson. A narrativa oficial foi também desmentida e desqualificada por um professor do MIT como “totalmente falsa”.
Não importa o que Trump tenha visto ou não de algum vídeo dos Capacetes Brancos em YouTube, ou se foi Tomahawkeado ele próprio, pelo eixo neoconservadores/neoliberais, os fatos em campo não se alteram.
Moscou simplesmente de modo algum cederá sua esfera de influência na Síria a Donald Trump ou ao estado profundo. A Rússia já venceu a Guerra Síria quando impediu a formação de um Emirado do Takfiristão e diluiu a possibilidade de salafistas-jihadistas russos/chechenos/uzbeques virem a operar em aliança com a Frente al-Nusra e/ou de o Daech voltar a provocar caos no Cáucaso. Para nem dizer que mais de 75% da população síria vive hoje nas partes funcionais do país controladas por Damasco.
Na dúvida, semeie caos
O complexo de Partido da Guerra/indústrias militares e da segurança quer guerra, qualquer guerra; é bom para os negócios. Os neoconservadores querem uma guerra para conter o Irã. O professor Stephen Cohen está realistamente alarmado. Ninguém sabe com certeza se Trump é hoje mero refém de Mattis Cachorro Louco, ou de HR McMaster & Co. que crê firmemente que o presidente é ele, ou se terá aperfeiçoado algum tipo de jiu-jitsu geopolítico não tuitável, só para gênios.
Um analista norte-americano de inteligência, dissidente e hoje com base no Oriente Médio pinta quadro muito mais sombrio: “Os EUA não tolerarão qualquer aliança de russos e chineses que altere o equilíbrio de poder. Coreia do Norte e Síria são meros peões nessa luta, que para eles quase nem tem significado algum. Os russos creem que os EUA estão determinados a ir à guerra contra eles, enquanto continuam inseguros quanto ao desempenho de seus mísseis S-500 de defesa. Os russos esperam mais ataques forjados na Síria; e os chineses, depois do que viram na Síria, já começaram a revisar todos os compromissos dos EUA.”
O presidente Putin já disse, onde todos o ouviram, que Moscou não pode confiar em Washington. A Rússia construiu paciente e meticulosamente sua capacidade de mísseis de defesa – a tal ponto que o espaço aéreo russo estará vedado, impenetrável, antes do final da década.
Várias vezes no passado Lavrov falou sobre “caos administrado” – um “método de fortalecer a influência dos EUA”, exibindo “projetos” que “podem ser disparados de solo norte-americano e atingir regiões cruciais para o desenvolvimento econômico e financeiro global”.
A Escola de Política Externa do LBC (Lindo Bolo de Chocolate) pode ter empurrado todo mundo para dentro de uma grande farsa. Mas Moscou — e Pequim – veem a coisa como a coisa é: a mais nova faceta de caos não administrável.

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