Por Diego Amorim.
Mais uma vez, o Novembro Azul chega reacendendo o preconceito em torno da prevenção ao câncer de próstata. Entre uma piadinha e outra, fica escancarada uma insistente barreira cultural que se transforma em problema de saúde pública.
No Brasil, por ano, quase 70 mil homens são diagnosticados com a doença, o segundo tipo de câncer mais frequente entre a população masculina. Em muitos casos, tarde demais. Quando se foge do exame de toque retal, não importa o motivo, eliminam-se os 95% de chance de cura atribuídos à descoberta precoce do tumor.
O câncer ignora as alegações usadas recorrentemente por quem, do alto de sua masculinidade, alimenta aversão ao consultório médico. É de espantar que mesmo a doença na próstata provocando cerca de 15 mil mortes todos os anos, metade dos homens acima de 45 anos ainda não aceite visitar um urologista no país.
Machismo
O machismo crônico afasta os homens das precauções médicas em geral. A fuga da prevenção não se restringe aos cuidados atrelados ao câncer de próstata nem ao mês de novembro.
Não à toa – mas também por outros motivos, claro –, as mulheres vivem, em média, sete anos a mais do que os homens no Brasil, segundo os índices de expectativa de vida medidos pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Mais: sete em cada 10 homens que pisam em consultórios chegaram até lá influenciados pela mulher ou pelos filhos, aponta um estudo do Centro de Referência em Saúde do Homem de São Paulo. Mais da metade desses pacientes tardios apresentam doenças em estágio avançado.
“O homem ainda é educado em um ambiente machista”
“O homem ainda é educado em um ambiente machista, com a ideia de que homem não chora, não se machuca, não se preocupa, tem de ser forte e sempre deve estar pronto para prover”, percebe o urologista do HUB (Hospital Universitário de Brasília) Fernando Diaz.
Não raramente, sentam-se diante do doutor Diaz homens que fazem questão de dizer que são “muito macho” e que só estão ali porque a mulher mandou. “É uma grande bobagem”, diz o urologista.
Aparência
Embora perceba-se um certo avanço no sentido da esperada mudança de mentalidade – inclusive motivada pelo surgimento de campanhas como o Novembro Azul –, boa parte dos homens sustenta a ideia de que ir ao médico representa fragilidade. “É um comportamento social enraizado. O homem carrega consigo a lógica de que precisa, a qualquer custo, parecer saudável, produtivo, útil”, comenta o presidente da AMBr (Associação Médica de Brasília), Luciano Carvalho.
“O homem carrega consigo a lógica de que precisa, a qualquer custo, parecer saudável”
A constatação de que a falta de zelo com o próprio corpo tem custado a saúde e, consequentemente, anos de vida pode ajudar os homens a reverem conceitos, acredita a coordenadora de Saúde do Homem do Ministério da Saúde, Angelita Herrmann. O “estereótipo de gênero”, defende ela, precisa cair por terra. “É necessário romper com barreiras socioculturais e mudar a educação das crianças, para tirar delas, desde cedo, esse pensamento mágico de que homem é um super-herói que não adoece”, argumenta.
Na avaliação de Angelita, há uma transformação em curso, a partir do fortalecimento de uma geração mais consciente dos cuidados que precisa ter. “Até os nossos idosos, hoje em dia, estão buscando uma vida mais saudável. Parece que os homens perceberam que estavam morrendo antes e passaram a se cuidar”, sublinha ela, para quem sempre é tempo de ajustar as visões de mundo e rever posturas.
O maior acesso à informação e a própria preocupação mais concreta dos homens com a aparência e a qualidade de vida podem, na opinião dos especialistas, favorecer uma mudança de paradigma nos próximos anos, não apenas em novembro.
Fonte: Fato Online