Nota de posicionamento: Gravuras rupestres do litoral de Santa Catarina

O Museu de Arqueologia e Etnologia da UFSC (MArquE/UFSC), externa sua preocupação em relação ao conteúdo da reportagem intitulada “Reviravolta na história: inscrições rupestres de Florianópolis seriam ideogramas chineses”, de autoria da jornalista Raquel Wandelli a partir das informações do senhor Fausto Guimarães, inicialmente publicada no site “desacato.info” e em seguida replicada na página “Jornalistas Livres” e nas redes sociais (Nota de Desacato.info: A matéria foi publicada em Jornalistas Livres e daí replicada em Desacato).

O texto abaixo, que busca esclarecer diversos pontos abordados na referida reportagem, é uma iniciativa da arqueóloga do Museu, Luciane Zanenga Scherer, em parceria com a Professora Doutora Fabiana Comerlato – uma das maiores especialistas no tema, e atualmente docente da Universidade Federal do Recôncavo do Bahia.

POR QUEM FORAM FEITAS AS GRAVURAS RUPESTRES DO LITORAL CATARINENSE?

Imaginar o passado e projetar o futuro pode nos fascinar, permite viajarmos no tempo, criar um mundo imaginário através das artes visuais, da literatura, do cinema. Quando pensamos como era a vida das pessoas no Brasil antes da conquista europeia, o que vem a sua mente? Cerâmicas, machados, grafismos, pontas e lanças, ocas. O estudo deste tipo de documento é feito por profissionais especializados nestes testemunhos – nós arqueólogas que assinamos este texto, por exemplo.

A narrativa sobre o passado é construída no presente, sua validade e propósito dependem do olhar sobre esta materialidade, é um verdadeiro mundo das coisas passadas. Tratar da construção de narrativas que expliquem como viviam povos passados ou extintos é ainda mais complicado e para cumprir esta tarefa existe uma ciência chamada Arqueologia.

Aqueles os quais estudamos devem ser tratados sem ideias preconcebidas, visto serem povos com história, língua, cultura, tecnologia, saberes. Quando surgem interpretações sobre a origem de algum traço cultural de uma população ameríndia atribuída a grupos culturais de outros continentes, é como desautorizar a história indígena. Além disso, dá margem ao velho argumento de que os indígenas não tem capacidade de realizar algo tão complexo. Isso significa dizer que, além dos povos indígenas terem o futuro ameaçado em nosso país, também lhes querem tirar seu passado.

Estas reflexões surgem para que o público consiga perceber a importância de valorizarmos a história indígena como um campo do conhecimento alicerçado na história cultural dos povos indígenas brasileiros – área que agrega a Arqueologia, a Linguística e a Etnologia.

Chegamos ao ponto que queremos tratar mais especificamente: as gravuras rupestres do litoral catarinense foram feitas por quem? Os estudos arqueológicos apontam para nossos antepassados indígenas, que na Arqueologia denominamos de populações pré-coloniais. Estes pescadores, povos do mar, nossos primeiros habitantes, possuíam tecnologia marítima, uma dieta voltada aos recursos lacustres e costeiros e deixaram registros intencionais gravados em costões, ilhas e paredões íngremes. São culturas milenares, detentoras de saberes tradicionais. São parte da nossa história ainda desconhecida pela maioria da população brasileira.

Quem quiser saber mais, deve procurar os sites de museus arqueológicos, textos em revistas científicas. Uma excelente opção é visitar a exposição “Arqueologia em questão: percorrendo o litoral catarinense” que se encontra aberta à visitação de terças a sextas-feiras, das 9 às 17 horas, no Museu de Arqueologia e Etnologia Professor Oswaldo Rodrigues Cabral (MArquE/UFSC).

Venha nos fazer uma visita, talvez você saia com mais perguntas que respostas. Isto é bom, pois a crítica e a reflexão sobre o conhecimento científico é que faz avançar esta ciência ainda desconhecida: a Arqueologia.

1 COMENTÁRIO

  1. A mesma bobagem foi inventada sobre Urubici, quando se dizia que os templários haviam estado lá, e a palavra “urubici” seria francesa, e não indígena. Um desrespeito à história e à cultura dos povos indígenas que viviam aqui. Desta vez, mais estapafúrdia ainda, atribuir aos chineses as inscrições rupestres do litoral. É demasiada ignorância, vale dizer: a cara do Brasil atual.

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