Nos EUA foi liberado. E no Brasil, gays podem ou não se casar?

Casamento gay

O governador de Nova Iorque, Andrew Cuomo, durante cerimômia de casamento gay na frente do histórico bar The Stonewall Inn. Philip Kamrass/ Office the Governor (28/06/2015)

Por Clara Averbuck.

Recentemente comunidades de gays e lésbicas do mundo todo comemoraram a decisão da Suprema Corte americana a respeito do casamento igualitário. Mas é lei? E no Brasil, como funciona? Pode casar? Pode adotar? O que pode e o que não pode? Qual a diferença entre união estável e casamento? Conversamos com alguns advogados da área sobre essas questões para deixar tudo bem explicado:

1. Os Estados Unidos aprovaram o casamento gay?

Sim. A Suprema Corte americana decidiu que a lei federal que definia o casamento como sendo união apenas entre homem e mulher era inconstitucional, por violar o direito à liberdade e à igualdade, garantidos pela quinta emenda da constituição.

2. Mas nos EUA a lei não varia de estado para estado?

Varia. Diferente do que ocorre no Brasil, os 50 estados americanos possuem autonomia para legislar sobre vários assuntos que no Brasil são exclusivos do Congresso Nacional. Essa decisão da Suprema Corte foi tão celebrada porque impede qualquer legislação estadual contrária ao casamento gay, pois esta discriminação foi considerada inconstitucional.

3. O que o Obama tem com isso?

O posicionamento favorável do Presidente foi importante para que houvesse amadurecimento dos debates e discussões sobre o tema, pois Obama adotou uma postura proativa, “militando” pela causa e ignorando as críticas negativas de religiosos e conservadores. Mas a decisão foi tomada pela Suprema Corte, não pelo presidente.

4. Qual a diferença entre união estável e casamento gay?

O casamento é um ato formal, celebrado por um juiz, conferindo mais direitos e garantias do que a união. Altera ainda o registro civil da pessoa, a certidão de nascimento é substituída pela certidão de casamento, o que não ocorre na união estável.

Outras diferenças: à união estável só se aplica o regime de bens denominado “comunhão parcial”. No casamento dá para escolher dentre todos os regimes previstos em lei (“comunhão universal”, “separação total”, etc). E na união estável o companheiro não é obrigatoriamente considerado herdeiro como são os filhos e os maridos/esposas –no caso do casamento, sim. Fica também facilitado, com o casamento, o direito a pensões do INSS em caso de morte da companheira ou companheiro.

casamCerimônia coletiva do Programa Rio Sem Homofobia, realizada em novembro de 2014 (foto: Clarice Castro/ GERJ )

5. E no Brasil, existe casamento gay?

Sim. O casamento igualitário ou homoafetivo existe no Brasil desde 2013, quando o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) emitiu uma resolução determinando que todos os cartórios do País realizassem casamentos entre pessoas do mesmo sexo. A decisão, contudo, não tem a mesma força do que uma lei e pode ser contestada por juízes, dificultando o processo.

6. O governo apoia o casamento gay?

O governo federal não defende publicamente a bandeira do casamento igualitário.

7. E a justiça brasileira?

A Justiça brasileira tem se posicionado de forma majoritariamente favorável. Importante lembrar que esse foi um processo longo; há anos essas questões vêm sendo levantadas em nossos Tribunais e recentemente os casos começaram a ser decididos pela mais alta cúpula do Poder Judiciário (STJ e STF).

8. Se dois homens ou duas mulheres quiserem se casar no Brasil o que eles devem fazer?

O casal inicia junto ao cartório o processo de habilitação para o casamento. Após essa fase inicial de coleta de documentos, o pedido é encaminhado ao Ministério Público, que emitirá parecer favorável ou contra (analisando, por exemplo, se há ou não impedimentos legais) e, enfim, enviará o procedimento ao juiz, que pode celebrar o casamento.

Contudo, alguns juízes, diante da ausência de lei federal autorizando o casamento entre pessoas do mesmo sexo e considerando que o Código Civil fala expressamente que casamento é entre homem e mulher, se recusam a celebrar o casamento, forçando o casal a entrar com este pedido na justiça.

Ou seja, enquanto o código civil não for alterado ou o STF se manifestar claramente favorável ao casamento gay, alguns juízes e promotores podem disfarçar decisões homofóbicas com argumentos técnicos.

9. E casais que tenham um ou mais homem ou mulher trans? Eles também podem se casar normalmente ou há alguma restrição?

Caso a pessoa trans tenha conseguido fazer a retificação de gênero e mudança de nome em seus documentos, pode casar normalmente. E caso não tenha, a resolução do CNJ diz: ”É vedada às autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo”.

Ou seja: pode sim. Persiste, contudo, a possibilidade de resistência por algum juiz ou promotor, conforme falamos na pergunta anterior.

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Primeiro casamento coletivo de parceiros homossexuais do DF, no último dia 28 de junho (foto: Antonio Cruz/ Agência Brasil)

10. Casais gays podem adotar filhos no Brasil? Se sim, eles precisam ser casados (ou unidos) oficialmente?

O Estatuto da Criança e do Adolescente fala que a adoção pelo casal só pode ser concedida caso sejam casados ou mantenham união estável, ou seja, não há impedimentos legais à adoção por casais homossexuais. Mas também não existe, nem no Estatuto da Criança e do Adolescente e nem no Código Civil, previsão legal explícita autorizando a adoção por casal gay, e muitos juízes se apegam a isso para negar esse direito. Outros podem também negar amplitude à decisão do STF, alegando que só serve para reconhecimento de união estável e não para adoção.

11. Quais direitos os casais homoafetivos ainda não têm no Brasil? E o que falta para que eles tenham?

Ainda não existe, no Brasil, uma lei dizendo que casais homoafetivos podem casar. Há apenas a resolução do CNJ.

A ausência de legislação garantindo o casamento igualitário aos casais homossexuais os coloca em posição de desvantagem quanto a vários direitos sucessórios. Só casados tem direito a assumir a guarda do filho do cônjuge, companheiros não tem “direito real de habitação”, não podem autorizar cirurgias de risco e não há garantia de concessão de licença-luto em caso de morte do companheiro.

Considerando que o casamento civil igualitário ainda não é garantido por lei no Brasil, faltam aos casais homossexuais todos os direitos que só são garantidos aos casados civilmente.

* Advogados consultados: Flávia Penido, Chico Nóbrega e Fábio Santos Oliveira.

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