Por Vivian Virissimo.*
Batucada, panfletagem e discursos emocionados romperam com o ambiente pacato e tranquilo do Leblon nesta quinta-feira, 13 de dezembro, data em que se completam 44 anos da publicação do Ato Institucional nº 5 (AI-5). É neste bairro nobre que reside o tenente-coronel Lício Augusto Ribeiro Maciel que foi escrachado por militantes da Articulação Memória, Verdade e Justiça do Rio. Lício participou do contingente das Forças Armadas que combateu a Guerrilha do Araguaia e é responsável, direta e indiretamente, pelo assassinato e desaparecimento de cerca de 60 militantes.
Ato foi em frente a prédio do Leblon, onde mora o tenente-coronel Lício Augusto Ribeiro Maciel – Fotos: Aline Braga |
A presidente do Grupo Tortura Nunca Mais, Victoria Grabois, fez discurso contundente ao escrachar o militar responsável pela morte de seu irmão André Grabois e, indiretamente, pela morte de seu pai Maurício Grabois e de seu primeiro marido. “Ele precisa ir para o banco dos réus, precisamos não só de uma Comissão da Verdade, mas de uma Comissão da justiça. Os moradores da Rua Visconde de Albuquerque precisam saber que no seu prédio mora um torturador que assassinou dezenas de pessoas”, defendeu.
O coronel Lício Maciel, também conhecido como Dr. Asdrúbal, ganhou destaque após publicação do livro “O coronel rompe o silêncio”, de Luiz Maklouf Carvalho, no qual confessa a execução de 16 pessoas. Em 2012, tornou-se réu em um processo encaminhado pelo Ministério Público Federal de Marabá, pelo sequestro e desaparecimento do militante do PCdoB, Divino Ferreira de Souza.
“A articulação vem a púbico gritar em alto e bom som que nós não esqueceremos das barbaridades que você, Lício, e seus colegas repressores cometeram, sob o manto do AI-5. Denunciaremos aquelas atrocidades para que seus vizinhos e a sociedade brasileira saibam o que vocês fizeram”, destacou Dieymes Pechincha, do Levante Popular da Juventude.
Outra integrante da articulação, Ana Miranda do Coletivo RJ, ressaltou a importância do ato público e também pediu justiça. “Outros países da América Latina têm militares julgados e presos, no entanto, aqui no Brasil finge-se que nada aconteceu. É como se o tenente-coronel Lício dissesse na cara de todos: eu matei, torturei, decepei cabeças, ocultei cadáveres e até hoje vivo muito bem com meu salário e quero morrer anônimo, sem nunca ser julgado”, criticou.
A data foi escolhida para não deixar passar em branco os 44 anos do ato que aprofundou a repressão durante a ditadura civil-militar brasileira. “O Congresso foi fechado, intelectuais e artistas foram banidos, a censura recrudesceu, ampliou-se a perseguição às organizações populares e dos trabalhadores, salários foram achatados, liberdades foram ainda mais pisoteadas pelos coturnos da repressão”, detalhou Vitor Ferreira, da Consulta Popular.
Enquanto os militantes gritavam palavras de ordem, do alto de suas janelas os vizinhos acompanhavam a denúncia contra Lício. Pedestres e usuários do transporte público receberam panfletos e se interessavam pelo ato. O porteiro João apoiou a manifestação e classificou como uma “vergonha” o período militar. “Com estas mortes e torturas, os militares mancharam a história brasileira. Se formos procurar direitinho, temos vários militares nesta mesma situação aqui no bairro”, falou.
No final uma mística homenageou os militantes que tombaram sob responsabilidade do coronel. Uma faixa com o nome de todas as pessoas que morreram ou desapareceram durante a Guerrilha do Araguaia foi pendurada nas grades do prédio. Alem disso, uma faixa com os dizeres “Torturador encontrado” e fotos de Lício foram afixadas para amplo reconhecimento da vizinhança.