Nas redes sociais, Ciro Gomes se aproxima do bolsonarismo com antipetismo e discurso violento

No Twitter, enquanto alguns eleitores abandonam o candidato do PDT, outros caminham da centro-esquerda para a direita

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Por Duda Romagna, Sul21.

Na manhã de segunda-feira (26), Ciro Gomes, candidato à presidência da República pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), negou que desistiria de sua candidatura e atacou, novamente, os rivais Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), em pronunciamento à imprensa. “Minha candidatura está de pé para defender o Brasil em qualquer circunstância. E meu nome continua posto como firme e legítima opção para livrar nosso país de um presente covarde e um futuro amedrontador”, declarou, confrontando o movimento de colegas, eleitores e influenciadores que pedem pela renúncia a fim de transferir votos para a Lula para que não tenha segundo turno nas eleições.

Nas últimas semanas antes do domingo de eleição, 2 de outubro, Ciro elevou o discurso antipetista nas redes sociais e ignorou resultados de pesquisas que indicam probabilidades mínimas de que sua candidatura o leve ao segundo turno. Na pesquisa Ipec divulgada na mesma segunda-feira de seu pronunciamento, o candidato pedetista caiu um ponto percentual em relação ao último levantamento feito e ficou com 6% das intenções de voto.

Dados obtidos pela reportagem por meio da plataforma de monitoramento de redes sociais Trendsmap mostram que, de 12 a 19 de setembro, foram publicados 546 mil tweets que discutiam o nome de Ciro Gomes, mas o cluster — grupos com interesses parecidos — de seus apoiadores se manteve em equilíbrio entre os grupos que apoiam Lula e Bolsonaro.

Visualização de clusters em grafo gerado pelo software Gephi. Monitoramento de 12 a 19 de setembro.

Já na semana de 19 a 26 de setembro, o número de postagens discutindo Ciro e sua candidatura aumentou em cerca de 93%, totalizando pouco mais de um milhão de tweets. Paralelamente, personagens historicamente apoiadores do pedetista declararam o voto em Lula, para garantir a derrota de Bolsonaro em primeiro turno. Uma onda que desagradou os defensores mais fieis de Ciro. Seu discurso foi se tornando mais agressivo e o resultado foi uma aproximação maior com o cluster bolsonarista.

Durante o último debate dos presidenciáveis antes da eleição, na TV Globo, a abordagem de Ciro seguiu a mesma, com reflexos na discussão no Twitter. Ciro teve, durante o dia de ontem, cerca de 95% das menções de toda a semana do dia 12 a 19 de setembro, com 518.100 tweets. No início do debate, quando escolheu Lula para responder, chegou a ter 12.400 menções por minuto, mas isso não se traduz em engajamento positivo. A postagem com maior interação foi do humorista Paulo Vieira.

Para Airton Araújo, cientista político e diretor da Frente Negra Gaúcha, o comportamento de Ciro não surpreende. “Devemos lembrar que, na última eleição presidencial, em 2018, ele não quis apoiar o candidato petista no segundo turno para derrotar o Bolsonaro e viajou para Paris. É um político de temperamento forte, que muitas vezes não sabe fazer aquele cálculo da política, de custos e benefícios, onde se perde hoje para se ganhar amanhã.”

Em sua análise, o eleitorado de Ciro que migra para Lula, na estratégia de “voto útil”, é quem “surfa na centro-esquerda”. “Esse eleitorado não gostaria do Lula, porém gostaria de uma política mais identificada com o campo progressista, favorável aos direitos sociais, aos direitos humanos, ao meio ambiente, etc”, explica. Se destacam nomes como Caetano Veloso, Fábio Porchat e Felipe Neto. “Talvez eles não estejam abandonando o projeto político do Ciro, mas adiando para que seja possível evitar o segundo turno e uma disputa na qual eles não gostariam que ganhasse o outro concorrente.”

“O que me surpreende mais é o PDT se deixar ser levado por essa onda de violência. O PT, vale lembrar, é expert do trabalhismo de Leonel Brizola e o Brizola, mesmo com todas as diferenças que tinha com o Lula, nos momentos críticos e movimentos de crise política apoiou essas duas linhas políticas, os dois partidos”, finaliza Airton, citando o líder histórico do partido de Ciro.

No segundo período analisado, a publicação que mais obteve interações citando Ciro Gomes foi um ataque ao ex-presidente Lula, feito por um apoiador de Bolsonaro. Nas respostas desse tweet, as hashtags mais utilizadas foram #bolsonaronoprimeiroturno22, #ptnuncamais, #lulaladraoseulugarenaprisao e #bolsonaronoprimeiroturno.

https://twitter.com/viniciuscfp82/status/1572042277626724353?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E1572042277626724353%7Ctwgr%5Ea527f8e292fb68ad7a9f344e82fbdbd05d844123%7Ctwcon%5Es1_c10&ref_url=https%3A%2F%2Fsul21.com.br%2Fnoticias%2Fpolitica%2Feleicoes-2022%2F2022%2F09%2Fnas-redes-sociais-ciro-gomes-se-aproxima-do-bolsonarismo-com-antipetismo-e-discurso-violento%2F

O também cientista político e professor da PUCRS Augusto de Oliveira analisa como atípica a situação atual, quando há uma chance clara de decisão em primeiro turno. A circunstância de não haver segundo turno altera o compartilhamento dos políticos e de seus eleitores. “Com a atuação da candidatura do Lula, comunicando aos eleitores que ele está disposto a vencer no primeiro turno, o que é uma possibilidade de acordo com as pesquisas eleitorais, o eleitor começa a fazer um cálculo muito lógico e muito racional”, avalia.

Sobre o “voto útil”, o pesquisador explica um cenário possível. “Se eu prefiro, por exemplo, o Ciro e minha segunda preferência é o Lula, a minha vontade de antecipar a eleição vai superar essa diferença entre minha preferência entre o Ciro e o Lula? Como esse movimento está muito perto da votação, a eleição se transforma numa decisão que adianta o comportamento que seria esperado no segundo turno e o eleitor que já sabe que tem uma preferência por votar no Lula contra o Bolsonaro, a tendência é que ele migre para o Lula, pois o seu voto no Ciro Gomes não seria produtivo, não teria nenhuma utilidade, sua única utilidade seria de demonstrar algum tipo de resistência ao nome do Lula”, analisa o professor.

“O Ciro, nos últimos dias, embora tenha feito isso desde o início da campanha, eleva o tom em relação à candidatura do Lula e tenta fazer uma equiparação entre o Lula e o Bolsonaro. Essa estratégia provoca a aproximação entre o Ciro e o Bolsonaro e os objetivos de ambos acabam sendo compatíveis, evitar a vitória do Lula no primeiro turno. Isso ajuda a compreender porque ocorre esse movimento de aproximação entre as manifestações dos dois grupos na rede social. Isso poderia ser feito de outras formas.”

Visualização de clusters em grafo gerado pelo software Gephi. Monitoramento de 19 a 26 de setembro.

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