Na imensidão dos campos 1 (40 anos depois)

boiada

Por Urda Alice Klueger.

Para Eduardo Venera dos Santos Filho

Eis-nos de novo na estrada. Estrada-estradinha, bonita e colorida, cheia de curvas e cercada de campos, um caminho encantado idealizado por algum poeta. Seguimos por ela muitos, muitos quilômetros. Não há casas, não há gente, não há onde perguntar se estamos no caminho certo. Mas seguimos – em algum lugar deve haver alguém que informe.

Numa baixada escondida dentro de uma curva, uma boiada. Nunca tinha visto uma boiada na vida e sinto-me excitada e maravilhada como uma criança. A boiada está atravessando a estrada e parece interminável. Temos que parar. Não me canso de pular e conversar com você sobre o gado, as roupas tradicionais dos vaqueiros, o cão pastor que atravessa a estrada diante do carro. Há quanto tempo que não vejo um cachorro! Sinto-me triste de repente, com saudades de um tempo quando chegava em casa e havia sempre o velho e peludo Jack para me receber aos pulos, cheio de alegria. Um tempo que se foi. (…) O cão pastor me traz lágrimas aos olhos, me faz desejar poder de novo estar de volta com você ao nosso vale, onde há sempre um cachorro esperando no portão. Você me entende, me abraça ternamente, chama a minha atenção para as estrelas das esporas dos vaqueiros, e eu luto para me desvencilhar da tristeza, da dor, e me admiro de ainda possuir dúvidas sobre se aquela é uma terra de faroeste. (…)

Você interpela o último dos vaqueiros – sim, estamos na estrada certa, Três Pontes fica “logo ali”. Esperamos que a última vaca suba a coxilha cheia de capim, que o cachorro que nos ignorou se esconda detrás da coxilha, para depois seguirmos.

Sigo com a cabeça reclinada no seu ombro, seu braço forte me sustenta, me protege; nas nossas almas há uma tremenda eclosão de alegria que faz com que nos bastemos apenas por estarmos vivos e por seguirmos por uma estrada. A estrada é longa e deserta. Depois de muitos quilômetros chegamos a uma bifurcação onde existem três casas e uma espécie de armazém. Tornamos a parar para perguntar; alguém nos indica a direção: Três Pontes fica “logo ali”. Esse “logo ali” era trinta quilômetros adiante.

Nenhuma casa, nenhuma pessoa, nenhum animal em parte alguma. Os campos são desertos e tão imensos como nunca vi. De uma coxilha mais elevada avista-se até os campos longínquos, que no horizonte imenso são azuis de tanta distância e se confundem com o azul do céu.

Vivido e escrito em 1973. 

Urda Alice Klueger é escritora, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR

Imagem: www.ousardizer.com.br

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