Por Jaine Fidler Rodrigues, para Portal Desacato.
Uma mulher de 20 anos denunciou ter sido estuprada na madrugada de domingo (24), no bairro Efapi, em Chapecó, Santa Catarina. O crime ocorreu por volta das 04h quando a mulher e um amigo voltavam de uma festa. Conforme informações da polícia, a jovem contou que ela e o amigo chamaram um motorista em aplicativo para irem para casa. Quando chegaram a casa, o amigo saiu do carro para pegar o valor da corrida e pagar o motorista.
Porém, o motorista fugiu de lá com a mulher e levou ela para um motel. Segundo o boletim de ocorrência, o homem tirou as roupas dela a força e a estuprou. A jovem informou pediu para que o motorista parasse, porém, não foi respeitada. Após o estupro, o suspeito deixou a mulher a uma quadra da casa onde mora. Ele estava em um carro modelo Gol de cor branca, mas não foi localizado pela polícia. O caso agora segue para investigação.
Dados
Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 29 de junho, são estupradas em Santa Catarina, 10 mulheres por dia. Estes dados de 2021, tornam o estado o sexto com mais casos desse tipo do crime no Brasil. No total, foram 3.298 casos registrados.
Além disso, se for levada em conta a taxa média de estupros e estupros de vulneráveis a cada 100 mil habitantes, Santa Catarina tem uma quantidade acima da média nacional. No Brasil, a taxa foi de 51,8 para cada 100 mil habitantes do sexo feminino. Em Santa Catarina, o número é de 90 a cada 100 mil. É o maior na região Sul do país.
Responsabilidade religiosa
Diante de acontecimentos como este, vários aspectos sociais e históricos podem ser abordados. Mas, neste texto, considerando a grande influência da religião e do cristianismo no país e estado, convido você leitor (a), para refletir sobre a história da mulher que foi apagada na história da Bíblia, Lilitih. Não foi Eva, a primeira mulher de Adão.
Segundo o Alfabeto de Ben Sirá, um dos textos que compõem a coleção de escritos rabínicos chamado Talmud, Lilith foi criada a partir da poeira junto a Adão – portanto, antes de Eva. Mas ela negou-se a deitar sob ele na hora do sexo por não se sentir inferior e, em protesto, abandonou o Éden. Ou seja: segundo o antigo folclore judaico, Lilith rebelou-se contra a “superioridade” masculina de Adão, o que a torna uma figura problemática para o judaísmo e para o catolicismo, que são religiões patriarcais.
No primeiro capítulo do livro Gênesis, que faz parte da Torá e da Bíblia, Deus cria “homem e mulher” à sua imagem e semelhança. Mas, logo no capítulo seguinte, somente Adão é mencionado. No versículo de Gênesis 1:27 que diz que “Deus criou o homem e a mulher” surge antes da citação de Eva em Gênesis 2. Dando margem a interpretação que existiria uma mulher antes de Eva. Outro ponto para este argumento seria a reação de Adão ao dizer “esta sim”, como se houvesse outra mulher, veja o versículo:
“Esta, sim, é osso dos meus ossos e carne da minha carne! Ela será chamada mulher, porque do homem foi tirada”. Gênesis 2:23.
Ou seja, a mulher que escolhe não se submeter a superioridade masculina é apagada, prevalece então, no catolicismo, a figura de uma mulher, que podemos interpretar como a feminina que nasce da sua carne e se submete ao homem. Quanto isto reflete no comportamento de maioria dos homens em nossa cultura? Simplesmente, eles se sentem donos dos corpos de mulheres, para fazer o que quiser. Neste cenário, as violências acontecem.
O conhecimento para encerrar ciclos de violências
Os dados e a história nos mostram que existe um ciclo vicioso de violências contra as mulheres. Constantemente, estamos vendo notícias de estupros, feminicídios, violências físicas entre outras. Assim como, discussões em torno destes acontecimentos.
Algumas abordagens, são inconscientes e incapazes de perceber a dimensão destes fatos. Principalmente, o quanto a história reflete nos comportamentos de homens e mulheres. Ainda existem muitas mulheres que de fato, não reconhecem atitudes violentas de homens. Também, homens que não se reconhecem como reprodutores de doutrinas patriarcais.
Desta forma, o conhecimento se torna uma ferramenta para encerrar estes ciclos, desmistificar, ressignificar e transformar. Com o conhecimento da história e sociedade é possível reconhecer quais são atitudes machistas. Também amplia o olhar para si e a mudança destas condutas agressivas.