Por Vitor Nuzzi, da RBA.
São Paulo – O decreto de Jair Bolsonaro que alterou a composição da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos tem “vícios de desvio de finalidade, motivação deficiente e inobservância do procedimento exigido para o ato”. Com essa argumentação, o Ministério Público Federal (MPF) entrou com ação civil pública pedindo que a Justiça anule o ato presidencial publicado em 1º de agosto, quando o governo substituiu quatro dos sete integrantes do colegiado, inclusive a então presidenta, a procuradora da República Eugênia Gonzaga, substituída por um assessor da ministra Damares Alves.
A ação foi apresentada à 3ª Vara da Justiça Federal de Porto Alegre. O Ministério Público pede ainda que os atos praticados pelos novos integrantes da Comissão sejam declarados nulos. O documento é assinado pelos procuradores regionais dos Direitos do Cidadão Enrico Rodrigues de Freitas (Rio Grande do Sul), Sergio Suiama e Ana Padilha de Oliveira (Rio de Janeiro).
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Os procuradores sustentam que as finalidades da Comissão, estabelecidas por lei, são voltadas a cumprimento de sentença internacional para identificação de desaparecidos “no contexto das graves violações a direitos humanos cometidas durante o regime de exceção”. A menção é à Lei 9.140, de 1995, que criou a Comissão Especial, e a sentença imposta ao Estado brasileiro pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por não investigar crimes cometidos por agentes públicos durante a ditadura. No entanto, há entre os novos integrantes do colegiado simpatizantes do período autoritário iniciado em 1964.
O próprio presidente da República não esconde sua posição pró-ditadura. Em julho, ele provocou polêmica ao afirmar que poderia dizer ao presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, onde estava o pai de Felipe, desaparecido político. Recebeu várias críticas, inclusive de Eugênia Gonzaga, que em seguida foi exonerada.
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Livre escolha
“Em entrevista concedida à imprensa, o chefe do Poder Executivo assim justificou as mudanças operadas na CEMDP. “O motivo é que mudou o presidente, agora é o Jair Bolsonaro, de direita. Quando eles botavam terrorista lá, ninguém falava nada. Agora mudou o presidente. Igual mudou a questão ambiental também”, diz a nota do MPF. O órgão considera essa justificativa “incompatível com as finalidades específicas buscadas pela Comissão Especial”.
As Procuradorias gaúcha e fluminense instauraram inquéritos em que solicitam ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos “cópia integral do procedimento administrativo em que tenha sido apreciada e motivada a substituição dos membros” do colegiado. A argumentação oficial é de que seus integrantes “são de livre escolha e designação do Senhor Presidente da República, sendo, portanto, ato administrativo discricionário do chefe do Poder Executivo, segundo seus critérios de oportunidade e conveniência”.
“Não se trata, convém sublinhar, de negar o poder discricionário do chefe do Poder Executivo de nomear os membros da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos – respeitada a competência da Câmara dos Deputados e do Ministério Público Federal para indicar seus respectivos representantes. No presente caso, questiona-se a validade da indicação de pessoas que não possuem experiência profissional ou acadêmica para funções de Estado diretamente ligadas ao cumprimento de obrigação ética e jurídica em matéria de direitos fundamentais”, reage o MPF. “Pessoas, inclusive, com manifestações públicas de elogio a notórios torturadores, como é o caso do coronel Weslei Maretti, e que pois, indicam uma visão contrária às atividades da própria CEMDP.”