O Ministério Público Federal (MPF) enviou novo documento solicitando urgência na operação para retirar invasores na Terra Indígena (TI) Trincheira-Bacajá, do povo Xikrin, entre Altamira, Anapu e São Félix do Xingu, no Pará. O comunicado traz todas as coordenadas e o histórico das invasões que ameaçam o território, além de imagens de satélite com os desmatamentos, garimpos e queimadas. Foi concedido novo prazo, de cinco dias, para que seja realizada ação fiscalizatória na área.
Assinado por cinco procuradores da República que atuam em Altamira e Redenção, o documento do MPF foi enviado hoje ao comando da Operação Brasil Verde, que conduz as operações de Garantia de Lei e Ordem (GLO) em Altamira, com cópia para a Polícia Federal, a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), a Polícia Militar, a Secretaria de Segurança Pública do Pará, além das prefeituras de Altamira e de São Félix do Xingu.
É o segundo ofício em que o MPF pede às autoridades de segurança pública que a retirada dos invasores seja feita com urgência, diante do temor de conflitos com os indígenas. A terra indígena está invadida desde 2018, mas a situação se agravou em 2019 e, no último dia 21, caciques e guerreiros Xikrin, cansados de esperar pelas autoridades, fizeram uma expedição para apreender motosserras e exigir a retirada pacífica dos grileiros.
MPF: Xikrin estavam sofrendo ameaças de pessoas que portavam armas de grosso calibre. Terra Indígena está sendo objeto de um intenso processo de invasão e desmatamento que tem se intensificado em 2019.
No dia 26 de agosto, lideranças Xikrin foram até Altamira e relataram ao MPF que estavam sofrendo ameaças de pessoas que portavam armas de grosso calibre, provavelmente contratadas por invasores que ocupam irregularmente a região do igarapé Prazer, perto da aldeia Rap-Ko. Após o primeiro ofício enviado pelo MPF às forças de segurança, foi feito um sobrevoo no território em que foi possível observar a existência de desmatamento, abertura de pastagens e a construção de moradias com roças.
Durante o sobrevoo e a partir de outras informações recebidas, diz o MPF no documento do dia 03, ficou confirmado que “a Terra Indígena Trincheira Bacajá está sendo objeto de um intenso processo de invasão e desmatamento que tem se intensificado durante o ano de 2019, estimando-se que houve, entre janeiro e julho deste ano, desmatamento de aproximadamente 1.511 hectares no interior da área demarcada”. Existem, na terra indígena, três frentes de invasão ativas: a nordeste, a sudeste e a sudoeste. Na região nordeste foram detectados mais de 40 focos de calor nos últimos 30 dias.
Cobranças das lideranças Xikrin – Em vídeos enviados ao MPF, líderes Xikrin reunidos na aldeia Mrotidjã cobram ações contra os invasores. “Estamos enviando vídeo para as autoridades para eles darem resposta imediata para nós, porque na nossa Terra Indígena Trincheira-Bacajá tem muitas invasões, invasão muito grande no alto Bacajá, na vila Sudoeste. Peço aqui em nome dos Xikrin, ajuda do governo para respeitarem nosso território, tá muito destruído por invasão, desmatamento, mineração. Nós estamos pedindo ajuda, é isso que estamos pedindo”, diz o cacique antigo da aldeia, Karangre Xikrin.
Os Xikrin pediram que sejam tomadas decisões imediatas, que deem resposta e afastem as ameaças. “Senão nós Xikrin de 16 aldeias vamos nos reunir e tomar a decisão de ir lá (com os invasores) de novo. Os grileiros estão ameaçando, ameaçando os líderes, e se eles querem matar, nós temos que procurar a Funai e o Ministério Público e para os governos, para nos ajudar”, dizem no vídeo.
No mês de julho deste ano foram detectados 125 hectares desmatados nessa frente de ocupação ilegal dentro da TI
“A invasão detectada na região sudoeste consiste em uma estrada e em um conjunto de polígonos que impacta, além da TI Trincheira/Bacajá, em mais duas terras indígenas: a TI Apyterewa e a TI Araweté/Igarapé Ipixuna, dos povos Parakaná e Araweté, respectivamente. No mês de julho deste ano foram detectados 125 hectares desmatados nessa frente de ocupação ilegal dentro da TI Trincheira/Bacajá”, informa o MPF no comunicado às forças de segurança. A região sudeste é a principal frente de ocupação ilegal do território Xikrin, concentrando a maior parte do desmatamento ilegal desde o início do ano. “Somente no mês de julho, foram detectados 754 hectares desmatados nesta frente de ocupação ilegal da TI. Os desmatamentos dentro dessa frente de ocupação ilegal estão particularmente perto das aldeias indígenas, destacando-se que o último desmatamento detectado na região está apenas a uma distância de aproximadamente 15 km de uma aldeia”.
A situação já era grave antes de se tornar notícia nacional, tanto é que a Funai ajuizou em janeiro ação de reintegração de posse em favor dos Xikrin. A ação foi iniciada em Altamira e enviada para Redenção. Ontem, o MPF se manifestou no processo pedindo a concessão de decisão urgente favorável aos indígenas, mas o documento enviado hoje às autoridades deixa claro que a prevenção de um conflito grave independe de decisão judicial.
CRONOLOGIA:
25/1/2019: Funai entra com ação de reintegração de posse em favor do povo Xikrin contra invasores que avançam nos limites sudeste da terra indígena. Ação começa tramitando em Altamira mas posteriormente é enviada para a Justiça Federal em Redenção
21/8/2019: Caciques e guerreiros vão até o local onde invasores se encontram nos limites sudoeste da TI, próximo a aldeia Rap-Ko e exigem sua retirada pacífica
26/8/2019: Após um fim de semana de tensão, lideranças Xikrin vão até Altamira e relatam ameaças de ataques por parte dos invasores
26/8/2019: O MPF envia o primeiro documento pedindo ações urgentes das forças de segurança para evitar um conflito na Trincheira-Bacajá
28/8/2019: Em resposta ao MPF, autoridades fazem um sobrevôo na Terra Indígena, constatam as invasões e dizem que vão planejar uma operação
2/9/2019: O MPF se manifesta no processo de reintegração de posse da Funai e pede à Justiça Federal em Redenção que conceda liminar urgente em favor dos indígenas
3/9/2019: Em novo documento às forças de segurança, procuradores da República de Altamira e Redenção dão novo prazo, de cinco dias, para que sejam tomadas providências concretas contra as invasões.