Encontro entre moradores despejados ou morando em situações de risco e rede de apoio ao movimento indica necessidade de ação direta e articulação coletiva
Um encontro municipal para debater moradia popular, regularização fundiária e a função social da propriedade foi realizado neste sábado (3), no auditório do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a partir das 13h30. Por mais de cinco horas, o grupo formado por representantes de comunidades despejadas ou morando em condições precárias e de risco, lideranças de movimentos sociais e do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM), assim como da Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB), se reuniu para formar uma rede de apoio à reestruturação do Movimento Sem Teto na Grande Florianópolis. Também participaram membros das Brigadas Populares, do DCE da UFSC, da União Florianopolitana de Entidades Comunitárias (UFECO), além de professores universitários, estudantes, arquitetos e urbanistas, filiados a diferentes partidos políticos e também os moradores despejados da comunidade José Nitro, no bairro Jardim Zanelatto, de São José.
Mais de 50 moradores representaram diferentes regiões e comunidades da Grande Florianópolis: Vila do Arvoredo, Papaquara, Nova Esperança, Panaia Aeroporto, Caieira do Saco dos Limões, Mont Serrat, Maciço do Morro da Cruz e Monte Cristo. Também estavam presentes integrantes do Movimento Sem Terra em Santa Catarina, assessoria jurídica popular, Sintrajusc, Sindiprevs, CUT, CSP-Conlutas, Central Sindical e Popular, entre outros.
Para Jonathan Jaumont, militante das Brigadas Populares, a questão da falta de moradia digna é um problema metropolitano. “Precisamos retormar a ofensiva e criar um sujeito para isso”. O morador da comunidade Vila do Arvoredo Nivaldo Araújo da Silva considera o Estado incompetente na busca por soluções de interesse social para famílias que vivem com 0 a 3 salários mínimos. “O Estado é omisso na questão da moradia, que é um dever dele e direito de todos”, reforça.
Segundo Silva, apenas na região Norte (de Canasvieiras a Ingleses), há mais de 270 famílias realocadas, sendo 51 no Morro do Caçador, 13 no Cartódromo, 36 no Papaquara, 168 na Vila do Arvoredo e seis na Vila União. “Para as pessoas de baixa renda ou sem renda, não há projeto habitacional. Querem nos realocar para locais de banhado, o que é muito perigoso ou então para locais onde há mais de 1,5m de solo mole”, critica o morador da Vila do Arvoredo.
Responsável por apresentar parte do Plano Municipal de Habitação de Florianópolis, o vereador eleito Lino Peres confirmou a existência de 172 assentamentos na região metropolitana de Florianópolis, sendo 65 deles na Ilha, distribuídos principalmente entre o Maciço Central e o da Costeira.
Uma questão política
Rui Antonio P. Alves, morador do Maciço do Morro da Cruz, chamou atenção às obras do PAC. Segundo Alves, o controle social das obras do PAC é péssimo. “O movimento foi achatado. Isso tudo é uma questão política. Das 400 casas prometidas, apenas 15 foram construídas”, conta. O líder comunitário acredita que a má gestão dos recursos públicos e das obras, que caminham lentamente e com trabalho terceirizado, são problemas sérios e defende ainda a auto-gestão. “Outro desafio é chamar o sujeito social, que às vezes se acomoda com o aluguel social, o que é uma beleza para o gestor público”.
A arquiteta urbanista Maiári Iasi defende que não se pode depender de iniciativas governamentais, pois estas são pensadas para solucionar problemas financeiros e não os da comunidade, a qual precisa estar organizada para discutir um projeto próprio de habitação. “É importante lembrar que temos que pensar não só no terreno, mas em toda a infraestrutura necessária para dar suporte digno a uma comunidade. Não podemos ficar à merce de um serviço social débil”.
Jonathan Jaumont criticou ainda a postura da Universidade, em relação aos problemas da comunidade na qual está inserida e a quem, institucionalmente e socialmente, deveria servir. “A UFSC não está interessada em resolver o problema da moradia, contudo, podemos contar agentes internos, que podem ser braços técnicos muito importantes”, pondera. Para o jovem, não há falta de terra, mas de terra para habitação popular e essa situação é funcional, na medida em sustenta a principal forma de lucro da elite florianopolitana.
Ao falar sobre a atuação dos Conselhos Comunitários, Domingos Fortuna, morador do bairro do Jardim Zanelatto, afirmou que as instituições se voltaram contra a própria comunidade, pois se envolveram com outros interesses, como os acadêmicos e os da elite. “O movimento tem que vir com o consenso. Se não ocuparmos e se não resistirmos, não haverá resultados para nós”, enfatiza. O líder comunitário acredita que reconstruir o Movimento Sem Teto de Florianópolis é algo pragmático, diante de uma crise ideologica nacional. “A luta é diária e a comunidade tem que ser agente. Precisamos de uma ferramenta de luta”.
Ezequiel Morais, membro da coordenação estadual do MNLM acredita que o problema não é o Conselho Comunitário, mas sim os agentes que estão gerindo essas instituições e mostrou-se preocupado com a uso do aluguel social. “O aluguel social tem um papel fundamental para a especulação imobiliária. Precisamos ter cuidado”, alerta. Segundo Morais, o MNLM vê o encontro com muito entusiasmo e destaca que sem ação, não há conquista.
Movimento da base à rede de apoio
A assessora jurídica popular advogada Daniela Rabaioli acredita que o que faz o movimento é a necessidade e não apenas a vontade. “Precisamos de pessoas que atuem na base e saibam trabalhar com a nossa realidade concreta”. O membro das Brigadas Populares Jonathan Jaumont, contudo, defende que não deve haver dicotomia entre a rede de apoio ao movimento e os protagonistas da base, pois trata-se de uma falsa polêmica.
“Acredito que quem vai fazer o enfrentamento real está em minoria aqui neste encontro hoje e isso é uma debilidade. Quem tem que protagonizar esse momento é o povo organizado”, ressalta Jaumont. Segundo o membro das Brigadas Populares, a Reforma Urbana passa por um processo muito mais complexo do que a tomada de terra de forma imediatista e isso requer muito trabalho “e não só vontade”.
Um representantes do Coletivo Anarquista Bandeira Negra destacou que o grupo apoia a contrução do Movimento Sem Teto pela base, pois acredita na ação direta e não na representação.
Balanço
Para o professor e arquiteto Loureci Ribeiro, o encontro serviu para apoiar o Movimento Sem Teto para a ação e que o debate básico em questão é sobre ocupação, “pois antes de tudo, precisamos de terra”. Para Ribeiro, os Conselhos Comunitários e o salário social não são as respostas para esse problema. “Os atores sociais têm que se articular e apresentar suas demandas”, orienta.
Durante o encontro municipal do Movimento Sem Teto, concluiu-se que a reestruturação do movimento não se dará de forma burocrática, depois de algumas reuniões. Trata-se de um processo, uma luta diária e coletiva. Entre os encaminhamentos levantados pelo grupo ao final do encontro estão:
– produzir um mapeamento de terrenos e prédios abandonados;
– lutar pela realização de uma audiência pública na Alesc para debater a situação dos despejados no Jardim Zanelatto;
– fortalecer a rede de apoio, com foco no seguinte tripé: levantamento de verba para continuidade às ações, maior divulgação sobre encontros e atividades do movimento – na base ou na rede de apoio, e busca por suporte na área de assessoria jurídica.
– realização do Baile dos Despejados (ocorreu neste domingo, dia, no Ginário Municipal Jardim Zanelatto);
– formação e capacitação, à médio prazo, de membros do Movimento Sem Teto para incentivar a atuação crítica e fundamentada, com foco nos movimentos sociais e na realidade das demandas das comunidades;
– visualizar a possibilidade de elaboração de um boletim impresso para divulgação de causas e ações;
-criar uma comissão concreta para trabalho;
– propor encontro com a Reitoria da UFSC para apresentar demandas populares, para buscar apoio e ação efetiva dos departamentos da universidade;
– realização de novo encontro, previsto para o dia 8 de dezembro.
Fórum Nacional de Reforma Urbana – O encontro municipal do Movimento Sem Teto sucedeu a reunião da coordenação provisória estadual para o Fórum Nacional de Reforma Urbana, formada pelo arquiteto Loureci Ribeiro e pelo vereador eleito Lino Peres; além de representantes do MNLM e da AGB. Esse trabalho visava discutir e elaborar uma pauta comum de demandas dos três estados do Sul do país, a qual abrange temas como a formação de cooperativas para habitação, gestão de recursos públicos, a Conferência Nacional da Cidade – vinculada ao Ministério das Cidades, que deve ser realizada em 2013; assim como as obras do PAC relativas à Copa de 2014 em áreas de conflito de interesse local, em Porto Alegre, que provocaram remoção e posterior ocupação.
Fotos: Marcela Cornelli.
[…] últimos 20 anos. Ato que legitima o primeiro passo dado no último sábado, com reunião para a Reconstrução do Movimento Sem Teto em Florianópolis, no último sábado […]
hola,eu gostaria de fazer parte deste movimento, gostaria de conseguir a minha casa própria, eu tenho 60 anos e moro de aluguel, que me custa muito pagar,quero saber como posso fazer parte do movimento, obrigada
Eliete, entre em contato com http://www.mst.org.br/fale_conosco. Eles poderão orientá-la. Abs
Cara Larissa Cabral, parabéns pela matéria, só gostaria que acrescentasse na mesma, que eu e o Ricardo estivemos na reunião representando a CSP-Conlutas, Central Sindical e Popular. Você mencionou a presença da CUT, salvo engano, não lembro de alguém ter dito que estava ali representando a CUT.
Saudações socialistas.
Gilmar Salgado.
Olá, Gilmar! Muito obrigada pelo comentário. Atualizei o material, mas não retirei a informação sobre a participação da CUT, pois lembro de um jovem que se identificou assim, ok? Abraços e até mais.