Morreu o Nobel da Literatura alemão Günter Grass

O escritor na sua cidade natal, Gdansk, no dia em que comemorou 80 anosWOJTEK JAKUBOWSKI/AFP
O escritor na sua cidade natal, Gdansk, na comemoração dos 80 anosWOJTEK JAKUBOWSKI/AFP

Por Cláudia Lima Carvalho e José Riço Direitinho.

O escritor alemão Günter Grass morreu aos 87 anos, informou nesta segunda-feira a sua editora Steidl. O Prémio Nobel da Literatura morreu no hospital da cidade de Lübeck, na Alemanha.

“Isto é muito triste. Um verdadeiro gigante, inspiração e amigo”, escreveu no Twitter o escritor Salman Rushdie.

Foi ao longo da vida uma personagem controversa, algumas vezes contraditória, mas sempre com o cuidado (ou foi o acaso que assim o quis) de não se afastar muito daquilo que é “politicamente correcto” para o momento. Grass, que no debate público sempre criticou ferozmente os defeitos da Alemanha, foi visto por muitos, durante mais de 30 anos, como uma espécie de “consciência moral da nação alemã”.

A publicação do primeiro volume da sua autobiografia Descascando a Cebola (Casa das Letras, 2007), que descreve o período entre 1939 e 1959, quase atingiu a dimensão de escândalo nacional com a revelação de que aos 17 anos de idade se alistara voluntariamente nas SS. Mas a sua “honestidade tardia”, como alguns lhe chamaram, acabou por não manchar muito a imagem dos que sempre o viram como uma figura livre e desassombrada com os traumas alemães.

Depois de Descascando a Cebola, o escritor alemão escreveu A Caixa (Casa das Letras, 2009) para continuar a falar da sua vida, agora focando-se mais no campo familiar e não no político. Günter Grass escreveu aqui sobre o período entre 1959 e 1999, ano em que lhe é atribuído o Nobel, por retratar “a face esquecida da história”. Para a Academia Sueca, Günter Grass concedeu um novo começo à literatura alemã, “depois de décadas de destruição linguística e moral”.

Em 2011, com a publicação do terceiro volume da autobiografia, ainda inédito em português, Grimms Wörter. Eine Lieberserklärung (As Palavras dos Grimm. Uma declaração de amor), o escritor deu por terminada a sua longa actividade literária. Nesse ano, aquando da apresentação do livro em Bamberg (uma pequena cidade no norte da Baviera), disse numa entrevista ao PÚBLICO: “Falta-me o ânimo para escrever. Acabou o meu prazo de validade. Já escrevi tudo. Na minha idade, já se começa a ficar surpreendido quando chegamos à próxima Primavera. E eu sei o tempo que um livro pode demorar a escrever.” Mais adiante deixou um recado aos jovens escritores: “A minha geração parece ser a última que foi activa politica e socialmente. Os escritores mais jovens, especialmente os da última geração, parecem já não querer saber. Fazem mal, porque há cada vez mais temas onde poderiam ser úteis intervindo. E muitas razões para o fazerem.”

Membro da Academia das Artes de Berlim, Günter Grass, que ganhou o reconhecimento internacional com O Tambor de Lata, publicado em 1959, recebeu, além do Nobel, distinções tão importantes como o Prémio Literário Príncipe das Astúrias, o Prémio Internacional Mondello ou a Medalha Alexander-Majakovsky.

O Tambor de Lata é o primeiro volume da chamada Trilogia de Danzig (os outros são O Gato e o Rato e O Cão de Hitler), em que Grass recria com ironia e humor cáustico o ambiente da sua cidade natal, Danzig (actualmente a cidade polaca de Gdansk), antes e durante a II Guerra Mundial.

Günter Grass tinha uma relação com Portugal. O escritor passava pelo Algarve, onde tinha uma casa no concelho de Portimão, e onde expunha a sua obra como artista plástico no Centro Cultural de São Lourenço, em Almancil.

Em 2012 foi considerado persona non grata por Israel, depois de ter comparado a acção deste país com os regimes ditatoriais. Ficou proibido de entrar naquele estado, tendo recebido até críticas dos próprios alemães. Houve mesmo um pedido à Academia Sueca, que foi rejeitado, para que fosse retirado o Nobel da Literatura ao escritor.

Também em 2012, o escritor publicou um poema de apoio à Grécia. Chamou-lhe A Vergonha da Europa e não se conteve nas críticas à atitude da chanceler alemã Angela Merkel. O Nobel da Literatura lembrava a história da Grécia, a quem a Europa muito deve. “Tu vais definhar privada de alma sem o país que te concebeu, tu, Europa”, escreveu Günter Grass, num poema com 12 estrofes de dois versos cada.

Fonte: Público.pt

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