Por Leonardo Sakamoto.
O marxista Eric Hobsbawn foi o companheiro de malditas e intermináveis madrugadas regadas a mestrado e doutorado. Também foi cúmplice de muitas outras mentiras que resolvi contar. Não era companhia simples, fácil. Quando não concordava com ele, o homem colocava à prova a minha crença no que estava escrevendo, me chamando para a briga.
Seus livros me lembraram que aprender é um ato doloroso – ao contrário do hedonismo pedagógico que alguns pregam nestes primórdios da era digital. Nem sempre o que ele tinha a me dizer era legal ou se encaixava no que eu acreditava, como muitos esperam que devam ser o conhecimento e o aprendizado hoje.
Saber que o cara que escreveu tudo aquilo estava vivo e continuava defendendo seus pontos de vista “velhos”, “ultrapassados” e “cheirando a mofo”, mas – ainda assim – rebeldes, dava uma sensação de segurança neste mundo de acadêmicos de aluguel e discursos sem sentido, além do sentido que garantem a si mesmos.
Sentia-me protegido. Por isso, a notícia desta manhã foi, de certa forma, um choque. Um senhor de 95 não é nenhum moleque, é claro. Pô, mas logo ele? E agora?
Duvido que outro ocupe o seu lugar. Os tempos são outros. As pessoas também.
Certo mesmo é que, para alguns, a perda de uma das vozes mais críticas do século 20 vai deixar as madrugadas mais sombrias e vazias. Enquanto que, para outros, sem aquele chato comunista apontando o dedo, o mundo vai ser mais colorido e feliz.