Mobilidade Cidadã

Por Magali Moser e Christian Krambeck.

Aproximação das eleições municipais requer inclusão da mobilidade urbana como item obrigatório das políticas públicas e planos de governo.

As vias são para o trânsito como a artéria para um organismo: elas são o meio responsável pelo deslocamento e fluxo das partes. No entanto, o crescimento alarmante da frota de veículos impede a absorção de toda a demanda. De acordo com o Denatran (Departamento Nacional de Trânsito), nos últimos dez anos, a frota de veículos (ônibus, carros, caminhões etc.) cresceu 119%. Considerando o resultado do Censo IBGE 2010, o país tem uma média de um carro para cada 2,94 habitantes. Com 300 mil moradores, Blumenau tem uma frota que ultrapassa 216 mil veículos, de acordo com dados do Detran/SC no mês de junho deste ano. Se não frear o ritmo apresentado nos últimos anos, em breve a cidade terá um veículo para cada habitante.

A mobilidade urbana surge como um desafio para as políticas públicas num cenário de expressiva motorização individual. A cidade é o mais complexo artefato já produzido pela sociedade, mas é fundamental que funcione e cumpra seus objetivos: oferecer condições de subsistência, segurança, conforto, e atrativos a todos os seus habitantes. Estamos longe desta perfeição, precisamos reformular completamente nossas cidades, a forma de pensá-las e vivê-las!

Porque os políticos não têm coragem suficiente para propor algo e agir? Porque nós também não temos? E se houver, o que fazer primeiro? Fazer uma cidade livre de verdade! Uma cidade que ofereça condições efetivas de ir e vir à todos os seus cidadãos, sem distinção ou exceção. Compreender a lógica de organização territorial de Blumenau, seus espaços segregados, suas desconexões regionais, suas ineficiências e seus gargalos viários. Pensar como conectar os lugares, as pessoas e as informações da forma mais eficiente e sustentável, passa pela consolidação e aperfeiçoamento dos corredores exclusivos de ônibus, melhorar sua eficiência e alcance, implantar sistemas cada vez mais democráticos e inteligentes.

Não é possível falar em mobilidade urbana democrática enquanto muitos têm dificuldade de pagar o alto valor da passagem, não se pode argumentar em favor da cidadania enquanto não recuperarmos a gratuidade do transporte público aos domingos, quando os trabalhadores podiam visitar amigos e familiares, passear pela cidade, conhecer outros bairros ou apenas andar de ônibus e ir aos poucos parques e praças da cidade.

A recém implantada Rota do Lazer, por exemplo, teria muito mais vida com a volta da gratuidade das tarifas aos domingos. Mas a mudança verdadeira é reconhecer que o automóvel individual deve ter restrições no espaço urbano do século XXI, ele traz insegurança, poluição, desconforto, deseconomia e ineficiência para as cidades. Mas para isso precisa nascer uma nova cidade, conectada por ciclovias, com toda a infraestrutura necessária, bicicletários, aluguel de bicicleta, conexão com os terminais de ônibus e muito mais.

As recentes tentativas de se implantar ciclovias em Blumenau demonstraram mais uma vez a insensibilidade do poder público diante das necessidades da população. Concentrar as ações num único momento, com o Dia Mundial sem Carro, quando políticos de diferentes siglas partidárias fazem questão de serem fotografados pedalando, num esforço de fazer com que a opinião pública saiba que estão “preocupados” com o tema, também se mostra uma medida ineficaz. Assim como a implantação de rodízio de carros em Blumenau, a exemplo do que ocorre nas grandes cidades, defendida de forma veemente por um vereador na Câmara. A demora do poder público em apresentar soluções faz com que os problemas se agravem.

Optar pelo ônibus em detrimento do automóvel ainda não é convidativo. Taxada em R$ 2,90, a tarifa de ônibus hoje em Blumenau é uma das mais caras de Santa Catarina. Em Florianópolis, com cartão eletrônico, o usuário paga R$ 2,70 e em dinheiro R$ 2,90. Além do preço, soma-se todos os inconvenientes e transtornos como lentidão, engarrafamentos, superlotação…

Os corredores exclusivos de ônibus, anunciados pelos gestores públicos como a grande mudança em prol de um trânsito humanizado, surtiram efeito, representaram um avanço considerável, mas as mudanças precisam ser profundas. Mais do que atitudes individuais, requerem o envolvimento de toda a comunidade para alterar a própria cultura que impõe o carro como status social.

É preciso inverter a lógica onde andar a pé, de ônibus ou de bicicleta está associado à pobreza. Somente uma nova educação pode justificar a troca do uso do transporte individual pelo transporte coletivo. Uma cidade com amplas e seguras calçadas, sem postes no meio do caminho, onde o cadeirante, a grávida, o cego, o idoso, a criança e todos nós possamos circular sem medo e acessar todos os lugares de forma autônoma, sem precisar da ajuda de ninguém, de cabeça erguida.

Uma cidade macia, colorida, musical e humana, onde o ser humano volte a ser o protagonista e possamos nos reconciliar com os rios, morros, praças e parques, com as ruas, a paisagem, com os lugares e pessoas. Uma cidade mais humana! Para isso é preciso compreender e acreditar numa bandeira: transformar Blumenau em cidade referência nacional em mobilidade cidadã, pensada e planejada para o pedestre, para o ciclista e para o transporte coletivo e conexões inteligentes entre todos estes modos de transporte.

O carro tem seu papel e se usado de forma equilibrada pode e deve fazer parte do sistema de mobilidade. Neste ano de eleições municipais, cabe aos principais candidatos a prefeito levantar essa discussão, construir coletivamente seus planos de mobilidade e assumir compromissos públicos no sentido de concretizar este sonho possível. É preciso tornar o tema um assunto político e unir forças em prol de um mundo mais respirável.

Fonte: Revista Expressão Universitária, Ano 3, Edição 29, julho 2012.

 Christian Krambec é arquiteto e urbanista e professor do Curso de Arquitetura da FURB < [email protected] >

 Magali Moser é jornalista do SINSEPES < [email protected]>

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