Quando o ex-presidente Lula foi condenado pelo TRF-4, os veículos de comunicação alardearam que o “mercado” estava em festa – o dólar caiu e a bolsa subiu. Mas, na segunda-feira (9), primeiro dia útil após a prisão do petista, o bom humor parece ter sido substituído pela cautela. O Ibovespa, principal índice de ações da bolsa brasileira, fechou em queda, e a moeda norte-americana, em alta. Analistas culpam as incertezas no cenário político.
Mas, se a euforia de outrora era explicada pelo fato que a condenação de Lula o deixava mais longe de concorrer à Presidência, o desânimo de agora se dá pelo óbvio: sua detenção gera ainda mais instabilidade no Brasil e deixa turvo o horizonte das eleições.
Lula e o mercado
O mercado quer eleger um candidato que tenha compromisso com a agenda neoliberal, que coloca o Orçamento público e as políticas governamentais a serviço de seus interesses.
Em primeiro lugar nas pesquisas, Lula – apesar de ter feito um governo que ampliou os lucros de empresários e rentistas – tem dito que é preciso mudar a política econômica vigente.
Propõe rever medidas adotas pelo presidente Michel Temer, a exemplo do teto de gastos e da reforma trabalhista, e também questiona a reforma da Previdência proposta pelo governo, além de ser contrário às privatizações de setores estratégicos. Uma pauta que em nada agrada aos donos do dinheiro.
Mas, apesar de sua prisão limitar chances de Lula disputar o Planalto, o que esperar de um país dividido, com instituições em frangalhos e uma economia cambaleante e cujo resultado das urnas é uma completa incógnita?
Mercado sem candidato competitivo
O jornal Valor Econômico destacou, numa matéria nesta segunda-feira (9), que os agentes financeiros estão preocupados porque não há “sinais de força de um candidato que represente os anseios do mercado” e “ os dados de atividade confirmam que há uma recuperação num ritmo mais lento do que o esperado”.
Tanto Temer quanto seu ex-ministro da Fazenda, Henrique Meirelles – dois emedebistas que desejam concorrer – têm 1% das intenções de votos. O tucano Geraldo Alckmin – que se esforça para se apresentar como candidato de centro, embora sua plataforma e seu histórico o empurrem para a direita – aparece nas pesquisas com 7%.
Num cenário sem Lula, contudo, Jair Bolsonaro lidera as sondagens. Apesar de suas tentativas de aproximação com o mercado financeiro, materializada na escolha economista liberal Paulo Guedes para sua equipe, dificilmente o polêmico postulante será capaz fornecer a credibilidade e ambiente seguro que esperam os investidores.
Há receios de que próximo líder do país seja um nome pouco tradicional da política e há dúvidas quanto à governabilidade e capacidade política de fazer aprovar as reformas desejadas pelos financistas.
“Analistas destacam que pesa cada vez mais a percepção de que a campanha eleitoral corre o risco de ficar ainda mais fragmentada, cenário que dilui votos e torna mais imprevisível o desempenho de candidatos de centro-direita, vistos como pró-reformas”, afirma o jornal. A disputa para presidência da República já tem 15 pré-candidatos.
O “mercado” também teme alguns desdobramentos jurídicos, com impacto nos destinos de Lula. Não só há recursos contra a prisão do petista, como o Supremo Tribunal Federal ainda deverá se pronunciar sobre a execução da pena após condenação em segunda instância, o que pode mudar o atual entendimento sobre o tema.
Incerteza e instabilidade
Para Christopher Garman, diretor-executivo para as Américas da consultoria Eurasia, para eles, os analistas não estão “vendo que aumentou a possibilidade de votos mais unidos em torno da esquerda”.
No fundo, a prisão de Lula, cuja legalidade é questionada dentro e fora do país, findou por mergulhar o Brasil em ainda mais incerteza e instabilidade, afastando as chances de retomada de investimentos e volta de um ciclo vigoroso de crescimento.
Além de tudo, a julgar pelo que se viu a partir da resistência em São Bernardo do Campo, a revolta com a condenação sem provas cindiu o país e só faz crescer. E o desfecho dessa história pode não ser aquele que mais agrada aos interesses do tal “mercado”, que agora não parece mais tão bem-humorado.