Massacre nos EUA: Pretensa liberdade de expressão cria sujeitos violentos, diz Silvio Almeida

Pesquisador das questões raciais analisa ataque de jovem supremacista que deixou 10 mortos num bairro predominantemente negro sob a ótica da premissa de "liberdade de expressão" e sua relação com o discurso de ódio

Por Ivan Longo.

O advogado Silvio Almeida, professor na Fundação Getúlio Vargas (FGV) e universidade Mackenzie, presidente do Instituto Luiz Gama e estudioso das questões raciais, analisa que o massacre promovido por um jovem em Buffalo, Nova York (EUA), que matou 10 pessoas em um supermercado, tem relação com a premissa de “liberdade de expressão“, utilizada à exaustão, hoje em dia, pela extrema direita global, com o discurso de ódio e crimes dele provenientes.

Em texto publicado através das redes sociais, Almeida diz que o atentado, cujo autor teria sido motivado pela ideologia racista da “supremacia branca, “evidencia que existe uma contradição insuperável entre ‘liberdade’ e ‘discurso de ódio’“.

“Essa pretensa ‘liberdade’ de expressão tem sido o motor fundamental para a constituição de sujeitos violentos e intolerantes que não se submetem a qualquer limite ou regramento social; que não aceitam certas formas de existência. Isso tudo se torna ainda mais grave em um ambiente social regido por concorrência desenfreada, lógica de guerra e sociabilidade de mercado”, aponta.

Segundo o pesquisador, trata-se de uma “questão política” que exige “em uma ponta educação, mas na outra, regulação e responsabilização“, e isso inclui, para ele, inclusive a discussão sobre a dinâmica das redes sociais. Vale dizer que o massacre foi transmitido pelo autor através da plataforma Twitch.

“É sobre essa ponta [da regulação e responsabilização] que menos se fala porque ela requer a disposição de impor limites concretos a certas práticas, inclusive no que tange ao modelo de negócios das redes sociais. Este é um debate que envolve, entre outra questões, direitos humanos, direito econômico e até segurança nacional”, atesta.

“Há pessoas morrendo por conta desta falta de limites, por essa naturalização da violência”, prossegue o advogado. “Como, por exemplo, esperar que se respeitem os direitos humanos se em um programa de TV aberta o apresentador comemora a morte de alguém cantando animadamente ‘ele morreu, ele morreu..’?”, questiona, fazendo referência ao programa policial apresentado pelo bolsonarista Sikêra Jr.

Para Almeida, elementos como racismo, apologia ao naziasmo e sexismo são exemplos “de linhas que não poderiam ser cruzadas sob nenhuma hipótese“. “Nem toda proibição é sinal de autoritarismo”, sentencia.

“A discussão é política, de economia política, na verdade. Mas há uma dimensão ética. Debate incisivo, que exponha diferenças, não é sinônimo de agressão e humilhação. Não devemos ser como os que querem nos matar; mas não devemos ter medo de enfrentá-los à altura e com energia”, finaliza o estudioso.

O massacre 

Um homem abriu fogo em um mercado Tops Markets, em Buffalo, Nova York (EUA), na tarde deste sábado (14) e baleou diversas pessoas. 10 foram mortas e três ficaram feridas. O ataque foi transmitido pela Twitch, plataforma de vídeos semelhante ao Youtube.

A polícia de Buffalo declarou que o suposto atirador está sob a custódia da corporação.

A governadora de Nova York, Kathy Hochul, declarou por meio de suas redes sociais que está “monitorando a situação de perto” e que as forças policiais do estado estão no local onde ocorreu o ataque.

As primeiras informações sobre o atirador dão conta de que no momento do ataque ele trajava roupa militar, é branco e aparenta ter 18 anos. Dois rifles que estavam com o suspeito foram apreendidos.

Segundo informações da NBC, a principal linha de investigação da polícia é que se trata de um ataque motivado por ideologias de supremacia branca, pois, o supermercado fica em um bairro predominantemente negro, a cerca de 5 km ao norte do centro de Buffalo.

O FBI investiga o caso como “crime de ódio” e um “ato de extremismo violento racialmente motivado”. De acordo com informações da Reuters, onze das 13 pessoas pessoas atingidas eram negras e duas eram brancas.

 

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