Massacre na África do Sul traz à tona memórias do Apartheid

Por José Antonio Lima.

A cena era muito comum nos anos em que a África do Sul era dominada pelo regime segregacionista do Apartheid. De armas na mão, policiais observam os corpos de manifestantes no chão, ensanguentados, após o protesto ser “contido” pelas autoridades. Nos anos 1990, os policiais eram brancos e, os mortos, todos negros lutando por igualdade. Hoje, os corpos continuam sendo de negros, mas muitos policiais também são. O conflito não é racial, mas trabalhista. É a África do Sul de 2012, livre do atroz regime da supremacia branca, mas ainda flagelado pela desigualdade e por um mercado de trabalho cruel.

A chacina desta quinta-feira 16 ocorreu nas minas de Marikana (a 40 quilômetros de Johannesburgo), onde a empresa britânica Lonmin obtém 96% da platina que exporta para todo o mundo. As cenas jogaram os sul-africanos mais de uma década para trás. Em trajes de choque e fortemente armados, os policiais montavam barricadas com arame farpado quando foram flanqueados por grupos de trabalhadores, muitos deles armados com machetes, lanças e outras armas improvisadas. A polícia, então, abriu fogo contra os manifestantes. Após a salva de tiros, pelo menos sete corpos ficaram no chão. A agência Reuters afirmou que até 18 pessoas podem ter sido assassinadas. As autoridades de saúde e segurança se recusaram a comentar.

Horas depois das mortes, o presidente da África do Sul, Jacob Zuma, emitiu um comunicado lamentando o episódio e prometendo levar os culpados à Justiça. Segundo Zuma, há na África do Sul “espaço suficiente na ordem democrática para que qualquer disputa seja resolvida por meio do diálogo sem rompimentos da lei ou violência”.

Armados, mineiros ocupam monte perto da mina de Marikana, nesta quinta-feira 16, antes do confronto com a polícia. Foto: AFP

O massacre em Marikana é o ponto culminante de seis dias de violência. Desde 10 de agosto, quando a paralisação teve início, trabalhadores que tentaram furar a greve foram atacados e pelo menos dez pessoas morreram, entre elas dois policiais. Há relatos de que a violência é resultado da rivalidade de oito meses provocada por uma disputa de poder entre dois sindicatos de mineiros, um existente há mais de 20 anos e outro recém-aberto. Um líder grevista afirmou ao jornal sul-africano The Star que os 3 mil mineiros estavam ali em nome próprio, após décadas de “negociações infrutíferas” dos sindicatos. Os trabalhadores tinham, segundo este líder, duas reivindicações. Serem recebidos por diretores da Lonmim e um aumento salarial dos atuais 5000 rands (equivalente a 1200 reais) para 12000 (cerca de 2900 reais).

Barnard Mokwena, vice-presidente-executivo da mineradora, afirmou que a empresa estava interessada em negociar por meio de “estruturas reconhecidas” (leia-se os sindicatos) e que não pretendia dar aumento salarial. A grande preocupação da Lonmim é com a queda de mais de 6% de suas ações na Bolsa de Londres e com o fato de ter deixado de produzir cerca de 15 mil onças (425 quilos) de platina nos últimos seis dias. A diretoria da Lonmim se recusou a comentar o massacre em suas minas. A empresa se limitou a dizer, à agência Associated Press, que se tratava de uma “operação policial”.

Fonte: http://www.cartacapital.com.br/

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