Marilda Confortin: O Dia e a mulher

Por Raul Longo.

Não sei o quanto é conhecida a Marilda Confortin. Eu não a conhecia.

Ao invés de lamentar não tê-la conhecido antes, preferível distribuir imediatas respostas que deu à minha provocação sobre o Dia das Mulheres.

Primeiro uma paródia pela qual me pede para imaginar o que seria se uma das admiráveis filhas do Martinho da Vila gravassem o pai nesta versão:

Homens (versão feminina da música Mulheres – do Martinho da Vila)

Autora: Martinha da Vila

Já tive homens de todas as cores,
De várias idades, de muitos amores.
Com uns até certo tempo fiquei.
Prá outros apenas um pouco me dei. (sua puta!)

Já tive homens do tipo atrevido,
Do tipo acanhado, do tipo vivido.
Casado carente, solteiro feliz. (não respeita nem os casados, sua cadela!)
Já tive donzelo e até meretriz (até garotos de programa? – vagabunda! ).

Homens cabeça e desequilibrados
Homens confusos, de guerra e de paz, (sua vivandeira de quartel! Desvirtuadora de padres)
Mas nenhum deles me fez tão feliz
Como você me faz…. (seu corno! )

A própria Marilda se interrompe, mas continua nestes versos de sua autoria:

 

08/03

 

Boa ou má,

bela ou fera,

fértil ou estéril,

jovem ou anciã:

mulher,

é

mulher

todos os dias,

e não fêmea efêmera

de um (c)oito de março qualquer.

 

Atentarão que o poema conforma cabeça e peito? Exato onde se teoriza alojar a alma: cérebro ou coração? Ou das mulheres também se acredita meio como os índios que não teriam alma? Ou como os negros, incapazes de raciocinar?

Dia do Negro, Dia do Índio, Dia da Mulher. Nada melhor confirma a segregação a um segmento do que dedicar um dia do ano para a sociedade mentir-se como não segregacionista. Afinal, todos temos esperança nas crianças, desde que não fumem crack. Não é assim?

Mas nisso de Dia, nada melhor do que o dito pela própria Marilda Confortim nesta crônica premiada por uma instituição internacional e que os solícitos cavalheiros de todo 8 de março deveriam ler para aprender a não cutucar a onça com vara curta:

MULHER

Quando o padre falou: “Eu vos declaro marido e mulher”, levei um susto. Mas o quê é que ele pensava que eu fosse até aquele momento, então? Homem? Assexuada? Indefinida? Animal? Justo um padre, que não sabe nada sobre a mulher, vai me declarar “mulher”! Quase interrompi meu casamento e me atraquei no tapa com ele.

Isso me lembrou algumas datas comemorativas. Inventaram datas para tudo. Tudo o que deveria ser comemorado durante todos os dias, foi resumido num único dia. Tudo o que leva anos para se resolver, resolveram resolver num dia só. Fácil acabar com os problemas assim. Desse jeito, até eu faço.

Duas dessas datas, deixam-me particularmente incomodada. Dia da mulher, por exemplo. Já começa por aí. Tem o dia do homem? Não que eu saiba. Recebi cartões, poesias e dezenas de e_mails inteiros falando um monte de coisas sobre minha beleza, força, compreensão, inteligência, sensibilidade.

De um deles olhei cuidadosamente o destinatário para ver se não havia engano. Era para mim, mesmo. Me peguei rindo, imaginando que, se meus amigos homens dissessem aquelas coisas todos os dias e não só do dia da mulher, correriam o risco de se convencerem de que sou mesmo tudo aquilo que disseram. E aí teriam de admitir que não sou tão burra, tão feia, tão fraca, e até tenho uma certa sensibilidade. E teriam que aceitar o fato de eu ser igual a eles. E aí eu poderia querer ter os mesmos direitos. Já pensou?

É bem cômodo ter o dia da mulher. Se alguma vez esquecermos deste pequeno detalhe amigas, não precisamos nos preocupar. Sempre haverá um bom homem, do tipo que mente pouco (uma vez por ano. Só no dia da mulher) que vai nos lembrar do quão emocionante e lindo é ser do sexo frágil. De quanto ele nos admira pela força e inteligência por ter conseguido a genialidade de acumular às nossas funções, as dele também. Por fazer tudo o que faziam nossas avós, e ainda trabalhar fora o dia inteiro, disputando muitas vezes com o próprio marido ou filho, um mercado de trabalho cada dia mais escasso e desumano. E por estar sempre linda, jovem e bem humorada para nosso amado marido e filhos. Tudo em nome da tal liberação feminina. E por fingir que acreditamos nessa liberdade.

Começo a acreditar que aqueles neurônios a menos, nos fazem falta. Como fomos cair nessa armadilha? E porque continuamos alimentando essa farsa?

Merecemos ser consideradas uma minoria problemática e ter o dia Internacional da Mulher!

Nessa mesma linha, tem o Dia das Mães. Tudo bem, o dia dos pais também é um saco. Mas vejam a diferença nos cartões, presentes e mensagens. Os cartões para o dia dos pais são decorados com cores e figuras sóbrias (lupas, furadeiras, livros, mesas de escritório). Coisas concretas que lembram trabalho, austeridade, responsabilidade. Os cartões do dia das mães são imagens de santas, flores, anjos, fadas. Como se fossemos etéreas, entidades abstratas, borboletas sem crisálidas.

Os presentes então são de uma criatividade! Está na hora dos professores se perguntarem: “Quando uma criança lembra da mãe, o lhe vem à mente”. Um avental todo sujo de ovo? Pano de prato? Grampo de prender roupa no varal? Aparador de panela? Colher de pau? Saboneteira? Porta retrato?

Esses são os objetos que os professores de arte ensinam para crianças e as fazem presentear no dia das mães. Parece que somos só um compartimento da casa que precisa de um enfeite, de uma inutilidade.

Não esqueçam senhores, que a maioria dos conceitos é formada lá, na escola. E que a maioria dos professores são mulheres. E têm aqueles maridos que se esquecem do dia do aniversário de sua esposa, mas lembram do dia das mães… E aproveitam para dar de presente a elas (às esposas), no dia errado, aqueles eletrodomésticos que já deveriam ter comprado há muito tempo. E ainda perguntam: “Gostou, mãezinha?” Quer que ela responda o quê?

Maridos, maridos… Vocês estão confundindo as bolas. Dêem e digam isso para suas mães (aquela que vocês chamam de avó, agora).

As mensagens então… São verdadeiras orações à Virgem Maria. Não sei qual a conseqüência psicológica do que vou dizer agora, mas preciso contar um segredo: Nós, mães, não somos mais virgens.

Deixamos de ser virgens muito antes de vocês nascerem, filhos. E de santas não temos nada. Vocês não imaginam quantas vezes pecamos para conceber vocês. E com que prazer! E essa mania de enaltecer nossa aceitação em relação a dores e desgraças? Ai caramba! Nenhuma mãe gosta de sofrer, não. Parem com essa história de “ser mãe é padecer no paraíso”. Nós não somos masoquistas! E chega de dizer que somos entidades dotadas de infindável paciência, abnegação, bondade, capacidade de perdoar.

Tenham paciência vocês! Isso é o que vocês querem que a gente seja. Que a gente diga amém pra tudo e perdoe todas as cagadas que fazem.

Olha, enquanto vocês são pequeninos, ainda vá lá. A gente sabe que quem escreve essas besteiras não são vocês, crianças. Mas, convenhamos: Marmanjos, maridos, diretores e presidentes de empresa mandando essas mensagens para as mulheres? Parem!

“Você diz isso por que não conhece minha mãe. Ela tem quase oitenta anos e é uma santa”, disse-me um amigo. Cresça, respondi-lhe. Coitada da sua mãe! Imagine a culpa que ela sente por ter criado você assim tão bobinho. Ela não vai morrer nunca, com medo de que você não sobreviva sem ela.

Pare de se enganar dizendo que foi morar com ela, depois do divórcio porque ela precisava de você. É você que precisa de mãe e transforma toda a mulher em mãe. Por isso seus casamentos não duram. Cai na real!

Um dos maiores pecados que as mães cometem, é deixar que os filhos cresçam acreditando nessa baboseira toda. Elas se arrependem muito depois, podem ter certeza. É por isso que as mães rezam tanto. Não é porque são santas, não. É para pedir perdão pelos erros que cometeram na criação dos filhos e pela falta de coragem de dizer umas verdades.

Não viverei para ver, mas tenho de dizer que só evoluiremos quando todas essas datas forem extintas do calendário. Quando no dia a dia sem aviso prévio, respeitarmos as crianças, os velhos, os índios, os negros, os brancos, os pais, as mães, as mulheres, os homens, a natureza, a humanidade, a paz…

Marilda Confortin –

[email protected]

É que não aprendi, não sei e não sirvo pra ser marido. Se eu tivesse jeito pra isso, ia até o Paraná, onde vive essa catarinense de Chapecó, casada, e pedia que se divorciasse para se casar comigo.

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