Por Emanuel Medeiros Vieira.
100 anos de Carlos Marighella
(E necessidade de abertura dos arquivos da ditadura – Em memória de todos os que tombaram na luta pela democracia no Brasil)
Comemora-se este ano o centenário de Carlos Marighella.
Ele nasceu na “cidade da Bahia” (como muitos baianos, como Jorge Amado, chamam Salvador) em 5 de dezembro de 1911.
Na capital baiana ocorreu a IV Assembleia Nacional da Consulta Popular, que escolheu Marighella – o revolucionário baiano, que foi considerado por seus algozes o inimigo público número um da ditadura, – como o seu homenageado.
Foi assassinado em 4 de novembro de1969, numa emboscada preparada pelo DOPS, em São Paulo.
Sempre digo que somos criaturas da memória.
A lembrança do líder comunista não significa que se concorde com várias posturas que adotou na sua existência. Não se precisa concordar com tudo que um ser humano fez, para honrar a sua memória.
Mas, ele deu a vida pelos ideais em que acreditava.
Num mundo, como o nosso, tão cínico, consumista, de relativismo moral e de tremendo egoísmo, é algo raríssimo de se ver
Marighella – mulato, poeta, brincalhão, deputado comunista e guerrilheiro – , era filho de um imigrante italiano e de uma negra haussá.
Comemorar o seu centenário não deve ser um ato formal ou protocolar, mas em sua memória, luta pela abertura dos arquivos da ditadura.
Espero que a presidente Dilma, também vítima da tortura, lute para abrir os arquivos da ditadura.
Tenho consciência de que para ela – diante da pressão do fascismo subterrâneo ou claro, e de setores da mídia hegemônica – também não será fácil
Só com pressão popular, o pleito será concretizado.
Sim, Marighella estava armado (com seus companheiros) principalmente de coragem, enfrentando os anos de chumbo.
É considerado um dos homens mais corajosos do Brasil no enfrentamento da tortura.
O resgate da memória dos que tombaram na luta contra a ditadura, não pode ser esquecido.
Devido ao desconhecimento de nossa História, não são muitos os brasileiros que se lembram da trajetória do guerrilheiro baiano.
Carlinhos Marighella, seu filho e seus companheiros da Ação Libertadora Nacional – ALN, Takao Amano e Aton Fan, “devolveram num afetuoso discurso o cálido abraço” – como observou Carlos Pronzato – , que centenas de jovens lhes ofereceram num auditório lotado na noite de inauguração do evento nacional.
O problema da abertura dos arquivos e do resgate da memória foi enfrentado com coragem por países vizinhos.
Será difícil no Brasil?
Sim.
Para aqueles que não escolhem os caminhos fáceis da acomodação e da visão mesquinha de “que nada tenho com isso”, nenhuma conquista será obtida de graça.
Infelizmente, a maioria do STF interpretando a anistia de 1979 em favor dos torturadores, fez retroagir a história, renegou a tradição jurídica, ignorou os valores democráticos e os tratados internacionais, como lembrou Roberto Martins.
Segundo ele, o velho Ruy Barbosa deve ter-se revirado no túmulo ao saber do voto dos sete ministros que esqueceram as lições do Direito.
Em 1896, Ruy chamou de “anistia inversa” aquela que condenou os beneficiados a passarem dois anos sem poder recobrar seus direitos.
Agora, caberá a Corte Interamericana a palavra final.
(Salvador, fevereiro de 2011)