Brasília – A ministra Maria do Rosário, da Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República, defende que os réus da chamada Chacina de Unaí sejam julgados em Belo Horizonte (MG) e não na cidade onde os quatro servidores do Ministério do Trabalho foram assassinados, em 2004. Da mesma forma que a procuradora da República em Minas Gerais, Mirian Moreira Lima; o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, Domingos Dutra (PT-MA); entidades de classe e organizações de defesa dos direitos humanos, ela considera que a transferência do Tribunal do Júri da capital mineira para a Vara Federal em Unaí pode comprometer a imparcialidade do caso.
“O julgamento em Belo Horizonte é uma luta dos movimentos sociais. Em Unaí há um poder político estruturado que acreditamos ter a intenção de operar pressões pela não condenação dos réus indiciados pela Polícia Federal como responsáveis por essa matança”, disse a ministra, ao se referir ao prestígio político e econômico de que desfrutam os principais acusados pelo assassinato dos auditores fiscais do Trabalho Erastótenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva e do motorista Ailton Pereira de Oliveira. Ela falou em entrevista à Rádio Nacional, da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).
Os quatro foram mortos a tiros em 28 de janeiro de 2004, emboscados enquanto faziam uma fiscalização de rotina na zona rural de Unaí, a cerca de 500 quilômetros de Belo Horizonte. Ao fim de seis meses de investigação, a Polícia Federal pediu o indiciamento de nove pessoas por homicídio triplamente qualificado: os fazendeiros e irmãos Antério (ex-prefeito da cidade e um dos maiores produtores de feijão do país) e Norberto Mânica, os empresários Hugo Alves Pimenta, José Alberto de Castro e Francisco Elder Pinheiro, além de Erinaldo de Vasconcelos Silva e Rogério Alan Rocha Rios, apontados como autores do crime, Willian Gomes de Miranda, suposto motorista da dupla de assassinos, e Humberto Ribeiro dos Santos acusado de ajudar a apagar os registros da passagem dos pistoleiros pela cidade.
Embora tenha tido repercussão mundial e sido incluído, no ano passado, no Programa Justiça Plena, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – com o objetivo de que o trâmite processual fosse mais rápido e transparente –, o caso já se arrasta há nove anos sem ser julgado. Durante esse tempo, um dos réus, o empresário Francisco Elder, morreu aos 77 anos de idade. Além disso, Humberto Ribeiro dos Santos, acusado de ajudar a apagar os registros da passagem dos pistoleiros pela cidade, foi solto porque o crime prescreveu. Já Antério Mânica foi eleito prefeito de Unaí pouco depois do crime e reeleito em 2008.
“Estávamos preparados para termos o início do julgamento em Belo Horizonte ainda este mês, mas a juíza [Raquel Vasconcelos Alves de Lima], utilizando de sua prerrogativa, declinou de sua responsabilidade, transferindo o processo para a [Vara Federal em] Unaí, atrasando ainda mais o julgamento”, disse Maria do Rosário, ao garantir que o governo federal vai adotar todas as medidas legais para que o tribunal do júri seja mantido em Belo Horizonte.
“O Brasil tem uma experiência muito importante e políticas públicas muito firmes para o combate ao trabalho escravo. Ainda assim, temos que seguir lutando pela erradicação do trabalho escravo e análogo à escravidão e não podemos manter essa chacina impune. Isso [o julgamento] tem um importante significado. Devemos estar atentos às pessoas que defendem os trabalhadores e que não podem ser ameaçadas por isso.”
Após 14 dias de a juíza da 9ª Vara Federal Raquel Vasconcelos Alves de Lima declarar a incompetência da seção da Justiça Federal em Belo Horizonte para julgar o caso, a procuradora da República, Mirian Moreira Lima, ainda aguarda receber a íntegra do processo para rebater a decisão.
A Agência Brasil entrou em contato com a assessoria do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) para saber se há previsão de quando a procuradora deve ser intimada para apresentar as razões do recurso. A assessoria do órgão informou que o assunto segue “a tramitação processual normal” e que a juíza Raquel Vasconcelos Alves de Lima só se manifesta sobre o processo nos autos.