Manifesto Pseudo-Intelectual do Homem Cis Branco Privilegiado Esquerdo-Macho Anti-identitário. Por Flávio Carvalho.

Por Flávio Carvalho.

@1flaviocarvalho. Verão europeu de 2024.

Sou contra a linguagem neutra. Não me beneficia em nada.

Não quero ser hipócrita. Mas também não consigo. Que fique claro. Afinal, hipocrisia é conseguir enganar a gente mesmo. Me perdi.

Necessitava de um bode expiatório para que a ditadura do proletariado (ainda estamos fazendo um rebranding, pois é exatamente isso que eu defendo, mas com esse nome, tá foda, hoje em dia), pra que essa coisa, que eu defendo, não tenha vencido. Nem venham botar a culpa em Marx. Ele foi genial, no seu tempo. Nem imaginava, com tanta coisa pra elaborar, que um dia ainda perderíamos tempo com isso. Isso que nem nos importa, afinal… Leia o título e me compreenda, por favor. Não é comigo. No dos outros, é refresco. Pra resumir. Preocupo-me mais com o que vai dizer a FAlha de São Paulo do que com escutar qualquer legítimo sentimento que venha do nosso povo descontente. Sou contra dar munição pra direita. Prefiro ser a munição, ou anti-munição, ou o que seja, contanto que seja eu.

Política é racionalismo. Nada de sentimentalismo. Sou homem. EsquerdoMacho mas principalmente macho. Embora desconstruído, não esqueça. Sou joinha. E de terreiro. Claro.

As pautas morais do fascismo brasileiro estão dentro de mim como brasileiro que eu nem quero ser, para que não me confundam mais do que o tão confuso que eu já estou.

A culpa do Marçalismo é das feministas. E do movimento negro. E dos movimentos Trans. E de tantas lutas dos povos indígenas. E de tantas transversalidades. Que nos tiram do foco. Porque até dizem que querem somar-se a todas as lutas, anticapitalistas, antiimperalistas, anticolonialistas (as boas, aquelas sim, pois são minhas, de maioria branca, machos, privilegiados; olhe ao seu redor).

Eu estou certo. Vocês estão errados. Pois não leem. Não estudam, como eu. Não sabem nem falar. Nem cantar, como aquela menina linda que cantou o hino no último comício do Boulos. Arrepiei-me todinho, de vergonha. Ah. E o comício também era da Marta Suplicy. Aquela…

Irritam-me, todos vocês (na linguagem normativa, mesmo) porque ameaçam o poder que eu nem percebo que eu tenho.

Eu nunca fui chamado de macaco na escola. Nunca me cuspiram por que o meu amor era diverso. Nunca tentaram me estuprar. Nem meu marido, na nossa cama sagrada. Nunca me mandaram de volta pra minha aldeia, com meu relógio Casio.

Como querem que eu sinta algo que eu nunca passei? Eu sou pobre. Ou era. Ou já fui um dia. Sabia que eu já quis comprar um tênis daquela marca e não consegui? Você sabe o que é isso? Colocou-se no meu lugar? Seria capaz?

Lugar de fala é o caralho. Eu quero seguir falando. Você sabe o quanto me custou chegar a esse nível de falar tão bem? É censura pura. Ditadura. O que vai ser dos meus filhos, lindos, desse jeito? Você sabe como andam as coisas lá na escola privada deles? Porque a pública, tá impossível. Ficou demais. Ai.

O fascismo, assim, vencerá. E a culpa vai ser todinha de vocês. Bem… Quase todas de vocês. Ou melhor… De vocês também. Mas de vo-cês. Vo-cês. Não minha. Eu sou comunista, tenho certificado, carteirinha. Paguei cota, não sou cotista. E sou de esquerda. Não esqueça. De es-quer-da. Você não tem a menor ideia do quanto meu pai custou para me colocar aqui.

Ordem! Disciplina revolucionária. O que é isso companheiro? Veja o Gabeira. Primeiro a revolução socialista, depois a gente volta a falar de tudo isso. Paciência, minha gente. Pelamordedeus.

Numa coisa sou quase (quase, viu?) obrigado a concordar com a extrema-direita, que eu nem chamo de fascista, nem de nazi, porque é muito duro, falar assim: essa história de pautas morais, maconha (meu negócio é Whisky, On The Rocks, que eu também sou filho de Deus), aborto (isso que eu nunca terei que fazer, sabe? Nem entendo muito bem, porque meu papel nessa história é outro), linguagem neutra… Só vai dar voto pra eles. Melhor evitar. Depois, talvez, quem sabe, a gente volta. Não seja ingênuo. Experiência serve pra ser usada. O meu avô, você nem sabe, já era dirigente, sindical, depois do partido, foi deputado, quase ministro.

É preciso fazer crescer o bolo (socialista, claro), pra depois a gente ver como divide. Agora não, parem com isso. Delfim, Bresser (aquele do Plano, lembra?), e vocês ainda me queimam falando mal do Silvio Santos. Sabe o que esse homem significava para a minha avó? Mais amor no coração, por favor.

Seja amável. Só o amor constrói. Sua raiva deixe pra eles. Namastê.

E basta já de falar o tempo todo nessa história de privilégio.

Escute-me mais. Siga-me. Eu sou o caminho. A verdade. E a vida. E sou poeta. E criativo. E zen. E moro na Europa. Acredite em mim.

Contra Pablo Marçal. E Bolsonaro preso. E Palestina Livre.

Maduro? Ah, não. Lá vem você exigindo demais de mim, novamente. Cansa, sabe? Não tem pena, de mim?

Faço de mim, um instrumento da vossa luta. Eu sou a sua quase-única esperança. Confie mais em mim. Dê-me o seu voto de confiança. Eu nem sou candidato. Mas coloco meu nome à disposição. Se for a vontade do povo…

Viva Kamala. Que ela nem é branca, percebeu? Tá vendo. E ainda é mulher. Abaixo o identitarismo, isso… Uhuuu.

Pra concluir. Odeio a ironia. Detesto o sarcasmo. De hipocrisia, eu já falei, né? Então… tá.

Barcelona, 28 de agosto de 2024.

A opinião do/a/s autor/a/s não representa necessariamente a opinião de Desacato.info.

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