Por Douglas Kovaleski, para Desacato. info.
Os avanços do neoliberalismo continuam no Brasil. Até mesmo uma greve de caminhoneiros, onde se poderia ter uma pauta avançada e orientada por direitos genuínos dos trabalhadores, o Estado conduzido pelo governo golpista corta direitos sociais e aprofunda sua direção empresarial.
Foram cortados recursos para Políticas Públicas de Juventude, Políticas de Igualdade e Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, Assistência Técnica e Extensão Rural para Agricultura Familiar, Desenvolvimento de Assentamentos Rurais, Promoção da Educação do Campo, Criação de Assentamentos da Reforma Agrária, Apoio ao Desenvolvimento de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono – ABC, Equalização de Taxa de Juros em Financiamento à Inovação Tecnológica, Concessão de bolsas no âmbito do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior (Proies), Demarcação e Fiscalização de Terras Indígenas e Proteção dos Povos Indígenas Isolados, Política Pública sobre Drogas, Redes de Cuidados e Reinserção Social de Pessoas e Famílias que Têm Problemas com Álcool e Outras Drogas, Levantamentos Geológicos Marinhos, Concessão de Bolsas de Estudo a Alunos Estrangeiros, no Sistema Educacional Brasileiro, Promoção do Trabalho Decente e Economia Solidária, Esporte, Cidadania e Desenvolvimento, Saneamento Básico- Construção e adequação de sistemas de abastecimento de água em comunidades ribeirinhas / Construção e adequação de sistemas públicos de esgotamento sanitário em comunidades ribeirinhas, Moradia Digna – Apoio à Produção ou Melhoria Habitacional de Interesse Social, Transporte Aquaviário – Dragagem de Adequação da Navegabilidade em Portos / Melhoramentos no Canal de Navegação da Hidrovia do Rio Tocantins / Construção de Terminais Fluviais na Região Norte, Funcionamento dos Terminais Pesqueiros Públicos de Propriedade e Administração da União, Fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS).
Optei por listar exatamente os cortes para que fique bastante clara a posição política desse governo, uma espécie de Robin Wood às avessas. Enquanto beneficia as empresas deixa a classe trabalhadora, especialmente as populações vulneráveis cada vez mais desassistidas.
Para reforçar e enfatizar essa posição, a Agência Nacional de Saúde Suplementar mostra que nos últimos 10 anos o número de usuários de planos de saúde que pagam coparticipação em suas consultas triplicou. Isso demonstra o novo perfil dos usuários do sistema privado de saúde: população com renda mais baixa se comparada aos usuários do sistema privado há uma década.
Os planos privados de saúde com coparticipação, aqueles em que o usuário precisa pagar determinado valor para cada procedimento, consulta ou outro benefício, quando utiliza o serviço. Esta modalidade de plano é mais barata do que os planos com apenas mensalidade fixa para cada tipo de cobertura. Interessante dizer que a imensa maioria desses planos de saúde não são feitos por particulares, mas pelas próprias empresas empregadoras. Dessa forma, o desconto é feito direto na folha de pagamento de cada trabalhador, que é praticamente obrigado a aderir ao plano.
Sendo assim, pode-se concluir que cada vez mais as pessoas têm sido obrigadas a terem a cobertura de um plano de saúde, ainda que um plano popular, com taxa fixa barata e coparticipação.
O contexto dos planos populares é ilustrativo da desproteção social na saúde. O SUS que tem o acesso universal como princípio orientador número um, restringe cada vez mais seu acesso devido aos sucessivos cortes no orçamento e devido às formas privatistas de gestão, como no caso das Organizações Sociais.
A vulnerabilidade social colocada produz uma situação de medo e fragilidade, situação que coloca o trabalhador ainda mais prostrado diante do patrão. Imagina ser demitido, como fica o plano de saúde? E o bem-estar da família. Os empresários ganham com os planos de saúde e os demais setores ganham com o medo imposto à classe trabalhadora, ficando ainda mais fácil controlar.
Saúde é um direito fundamental, não podemos deixar que o SUS seja ainda mais destruído.
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Douglas Francisco Kovaleski é professor da Universidade Federal de Santa Catarina na área de Saúde Coletiva e militante dos movimentos sociais.