Embora o julgamento tenha sido suspenso devido a um pedido de vistas do ministro Gilmar Mendes, seis outros já votaram pela procedência do pleito.
Por Najla Passos.
Brasília – Três decisões recentes parecem indicar que o Supremo Tribunal Federal (STF) está seguindo novas linhas de atuação, após um período marcado por decisões polêmicas política e juridicamente, como a revalidação da Lei da Anistia, que impede o julgamento dos torturadores e assassinos da ditadura, e a condução da ação penal 470, criticada pelos nomes mais expressivos do mundo jurídico.
A primeira delas foi a reformulação do entendimento de que houve crime de formação de quadrilha na ação penal 470, o que jogou por terra o argumento montado em torno do chamado “mensalão” e permitirá uma revisão criminal para os condenados. A segunda, o reconhecimento de que réus sem foro privilegiado devem ser julgados por instâncias inferiores, materializado na remissão da ação penal contra o ex-governador Eduardo Azeredo (PSDB) para a justiça de Minas Gerais.
A mais recente, firmada nesta quarta (2), foi o entendimento da maioria dos ministros de que as doações de empresas para campanhas eleitorais ferem a Constituição, conforme ação proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Embora o julgamento tenha sido suspenso devido a um pedido de vistas do ministro Gilmar Mendes, seis outros já votaram pela procedência do pleito, reconhecendo que o financiamento privado de campanha desequilibra o sistema eleitoral brasileiro, enquanto apenas um foi contrário.
Mendes pediu vistas do processo justamente após fazer as contas e ver que o resultado caminhava para este desfecho. A OAB ingressou com a ação na corte em 2011, o que garantiu prazo suficiente para que os ministros se debruçassem sobre o tema. Além disso, em 12 de dezembro de 2013, quando o julgamento foi iniciado, o ministro Teori Zawascki já havia entrado com um pedido de vistas, o que proporcionou mais tempo para que os ministros firmassem suas posições.
No entanto, defensores históricos do financiamento público de campanha avaliam que a manobra pode protelar, mas não modificar o resultado. “Essa é uma grande conquista da sociedade brasileira. A decisão estabelece a igualdade entre os candidatos por meio do barateamento de campanhas. Ela abre caminho para que novas pessoas entrem na política não pelo incentivo financeiro, mas por suas propostas e ideais”, destacou o presidente nacional da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho.
“O julgamento vai se configurando como um momento histórico que vai mudar a política brasileira profundamente”, afirmou o deputado Henrique Fontana (PT-RS), relator de vários projetos de lei que alteram o modelo de financiamento do sistema eleitoral brasileiro e um dos maiores estudiosos do tema no parlamento. O deputado acredita que a decisão será consolidada e provocará o parlamento a enfrentar o tema que, há dez anos, permanece engavetado por falta de acordo entre as bancadas dos partidos.
“O pedido de vistas posterga um pouco, mas ao que tudo indica, pela solidez dos votos, o julgamento irá a termo e o Congresso terá que se debruçar sobre uma reforma profunda do sistema político brasileiro, especialmente do modelo de financiamento eleitoral. Eu, inclusive, já tenho projetos tramitando na Câmara que abordam todas essas questões: a proibição de financiamento pelas empresas, a definição de um teto de R$ 700 para doações de pessoas físicas e a fixação de limite para gastos em campanha”, acrescentou.
Na sessão do ano passado, votaram pela inconstitucionalidade das doações de empresas o relator da ação, Luiz Fux, o presidente da corte, Joaquim Barbosa, e os ministros Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli. Já o ministro Zawascki, que havia pedido vistas, apresentou voto contrário nesta quarta. Na sequência, apesar do ministro Gilmar Mendes ter pedido nova vistas, os ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski decidiram antecipar seus votos, formando a maioria pelo fim das doações de empresas.
Agora, faltam marcar posição, além de Mendes, os ministros Celso de Melo, Rosa Weber e Carmem Lúcia. Não há prazo, porém, para que o julgamento seja retomado. De acordo com Marco Aurélio, a norma regimental que regulamenta o prazo não é observada pela corte, o que significa que Mendes pode levar dois meses ou dois anos para firmar posição sobre o assunto. “Um pedido de vistas não pode ser transformado em um perdido de vista”, ironizou ele, em entrevista à imprensa.
Foto: Carlos Humberto/STF
Fonte: Carta Maior