Por Murilo Pajolla.
Neste sábado (19), os brasileiros se deparam com a trágica marca de 500 mil mortos pela Covid-19. Desde maio do ano passado, o país entrou na lista das três nações com mais óbitos e nunca mais saiu dessa relação.
Atualmente somos o segundo país em número de casos fatais, atrás apenas dos Estados Unidos, e o terceiro em número de casos confirmados, com Índia e EUA à frente, conforme o mapa global do novo coronavírus da universidade Johns Hopkins.
Mortes cresceram 10 vezes em um ano
Com medidas de prevenção insuficientes e a vacinação atrasada, o ritmo das mortes mostra a aceleração vertiginosa do contágio desde o início da pandemia. Em junho de 2020, o Brasil atingiu a marca de 50 mil mortes. Um ano depois, as vidas perdidas multiplicaram-se por dez.
Desde o primeiro óbito, no ano passado, foram quase cinco meses para chegarmos aos 100 mil mortos. Demorou o mesmo período para o registro dos 200 mil, em janeiro de 2021.
O próximo marco, de 300 mil vidas perdidas, chegou na metade do tempo: dois meses e meio. As 400 mil mortes vieram apenas 36 dias depois. Levariam mais 51 dias para chegarmos, neste sábado (19), ao trágico número de meio milhão de perdas.
Crise e colapso
Enquanto isso, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) mergulhava o país no caos, navegando entre o negacionismo, tratamentos ineficazes, disputas políticas com governadores, ataques à imprensa e isolando o Brasil no cenário internacional.
O mandatário apostou, segundo analistas, na macabra tese da “imunidade de rebanho”, ao desprezar inúmeras ofertas de vacinas, sabotar o isolamento social e promover o caos administrativo no Ministério da Saúde, na busca de um titular subserviente.
Estrangulado pela falta de planejamento e pelo teto de gastos, o Sistema Único de Saúde (SUS) deixou de promover a testagem em massa e o rastreamento da transmissão da doença – em que pese a dedicação extrema dos profissionais do setor. Medidas que, adotadas por outros países, salvaram milhares de vidas e frearam o avanço da doença.
O resultado foi o colapso do sistema de saúde, com pessoas morrendo na fila do atendimento em hospitais superlotados. O conjunto das políticas federais empurrou de vez o país para uma crise sanitária, econômica, política, social e ambiental.
O caminho do genocídio
Antes dos 100 mil mortos, alcançados em 8 de agosto de 2020, Bolsonaro minimizou a doença, chamando-a de “gripezinha”, e iniciou a contenda com governadores que se arrasta até hoje. Sem embasamento científico, começou a campanha de defesa à hidroxicloroquina.
Ainda em março, no início da pandemia, recebeu e ignorou o primeiro dos inúmeros e-mail da Pfizer com oferta de vacinas.
O Brasil assistiu à queda de dois ministros da saúde e ao início da gestão do general Eduardo Pazuello, único que aceitou acelerar a produção nacional e distribuição de cloroquina.
Questionado sobre o crescente número de mortes, o presidente disse que não era “coveiro” e indagou: “e daí?”.
No dia em que foram registrados 4 milhões de infectados, declarou que sua estratégia de combate à pandemia “acabou dando certo”.
Em 2 dezembro, quando foram contabilizadas mais de 174 mil mortes, o governo federal recebia – e ignorava – o último e-mail com ofertas de vacinas da Pfizer.
Rumo às 300 mil vidas perdidas, patamar alcançado em 24 de março, a população de Manaus voltou a agonizar, desta vez por falta de oxigênio. Bolsonaro, que sabia da escassez do insumo oito dias antes do colapso, perguntou até quando as pessoas “vão ficar chorando” e disse que era preciso parar com “frescura” e “mimimi”.
Teve início um inconsistente processo de vacinação, marcado até hoje por falhas no planejamento e por promessas que não se concretizam.
Até 400 mil vítimas, marco registrado em 29 de abril, o presidente voltou a dar declarações defendendo a cloroquina e criticando o isolamento social. Temendo o resultado das urnas em 2022 e emparedado pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da pandemia e pela crescente insatisfação popular, continuou fingindo preocupação em vacinar a população.
Perto das 500 mil, alcançadas neste sábado (19), Jair Bolsonaro defendeu o fim do uso de máscaras para vacinados e quem já teve a infecção. O Brasil atingiu o menor índice de isolamento social desde o início da pandemia. “Idiotas” foi o termo utilizado pelo presidente para xingar aqueles que ficavam em casa como forma de ser proteger do contágio.
Cidades brasileiras tiveram que interromper a vacinação com a Coronavac, após o Instituto Butantan paralisar o envase do imunizante por falta de insumos, em meio a uma crise diplomática com a China provocada por insinuações presidenciais de que o país asiático teria provocado propositalmente a pandemia.
Se nada mudar, 1 milhão de mortes
O percentual de brasileiros imunizados pelas duas doses da vacina avança a passos lentos. Até agora, chega a pouco mais de 10% da população, segundo dados do Ministério da Saúde.
Conforme alerta um estudo do cientista social russo Alexei Kouprianov, o cenário – somado ao baixo índice de isolamento social e à introdução de novas variantes – pode levar o Brasil a dobrar o número de mortos até outubro de 2021, elevando o patamar para insuportáveis 1 milhão de mortes.
Ataques à ciência e à educação
A falta de respostas concretas do Ministério da Educação (MEC) fez com que os alunos fossem atingidos duramente pela pandemia, sofrendo para manter o calendário de estudos.
“A ausência de aulas presenciais gerou um grande desafio para quem enfrenta o ensino hibrido sem internet e sem suporte tecnológico”, aponta a vice-presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), Élida Elena.
Na contramão do mundo, o Brasil teve redução no investimento em pesquisas científicas, inclusive aquelas que poderiam contribuir para a superação da pandemia.
“O governo ataca a ciência e as universidade públicas, que têm cumprido um papel muito importante no combate à doença, com mais de duas mil pesquisas sobre o tema”, denuncia a representante da UNE.
Edição: Rodrigo Durão Coelho
—