Trabalhadores resgatados pelo MPT 11º, em setembro de 2014, em uma carvoaria em Rondon do Pará (PA), atuavam por até 15h diárias sem equipamentos de proteção e sem acesso a água potável.
A publicação, que deveria ter ocorrido em 30 de dezembro, foi suspensa por decisão liminar emitida pelo ministro Lewandowski. Enquanto isso, o mercado fica vulnerável a fornecedores envolvidos com o crime.
A data de 28 de janeiro marca, desde 2009, o Dia Nacional do Combate ao Trabalho Escravo no Brasil. Mas este ano, infelizmente, não há motivo para celebrar: hoje faz 29 dias que a Lista Suja do Trabalho Escravo, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), está suspensa pela justiça.
O cadastro, que traz o nome de empresas e pessoas flagradas utilizando mão de obra escrava, é utilizado por compradores e instituições financeiras como ferramenta para eliminar o trabalho escravo de seus negócios. Mas, desde o final do ano passado, o mercado pode estar sendo contaminado com produtos e serviços oferecidos às custas da dignidade humana.
A publicação da nova versão da “lista suja” deveria ter ocorrido no último dia 30. Mas sua divulgação foi suspensa, graças a uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin 5209) movida pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), que teve decisão liminar favorável emitida pelo ministro Ricardo Lewandowski, em pleno o recesso de Natal. Com a decisão, as portarias interministeriais que regulamentam os processos de inclusão dos nomes e de divulgação da lista, ficam suspensos até que o STF julgue o mérito da inconstitucionalidade ou que a liminar seja derrubada. O Supremo só retomara as atividades em 2 de fevereiro.
Atualmente, para ter o nome incluído na Lista Suja o empresário precisa ser flagrado com trabalhadores atuando em condições análogas a da escravidão. Os empregadores só são listados após direito de defesa administrativa e os nomes permanecem no cadastro por dois anos. “A lista em si não determina qualquer punição ou restrição às empresas do ponto de vista legal. Funciona como mecanismo de transparência, porque traz a informação sobre aqueles que insistem em adotar esta prática”, esclarece Adriana Charoux, da campanha Amazônia do Greenpeace.
Bloqueio prejudica o mercado
Como se não bastasse o bloqueio da nova lista, a última versão, publicada em julho de 2014, foi retirada do ar. Atualmente, mais de 400 companhias de diversos setores utilizam a ferramenta para cumprir o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo. O material podia ser acessado por qualquer cidadão. Sem isso, não há garantias de que determinado produto não faça parte desta cadeia nefasta.
Da mesma maneira, as empresas que assinaram o Compromisso Pu?blico da Pecua?ria e a Morato?ria da Soja, que inclui as maiores empresas de soja e carne do mundo, utilizam o cadastro do MTE diariamente antes de aprovar as compras junto aos seus fornecedores, para manter este ilícito social longe de suas cadeias produtivas.
No caso da pecuária, a ausência do documento é especialmente preocupante. Segundo o MTE, a atividade pecuária é exercida por 40% dos empresários flagrados utilizando mão de obra escrava.
Até julho do ano passado, o documento continha 609 nomes. Destes, 380 eram de estados da Amazônia Legal, sendo que 10% deste total também foram multados por desmatamento ilegal nos últimos cinco anos. A nova lista traria quase 100 nomes adicionais, chegando perto de 700 empregadores que utilizam mão de obra escrava ou análoga a escravidão, segundo apurou o site Repórter Brasil.
Escravidão contemporânea
A escravidão foi oficialmente banida do Brasil em 1888. A Lei Áurea pode ter acabado oficialmente com a venda de seres humanos, mas não impediu que homens, mulheres e crianças continuassem a ser tratados como escravos ao longo da história.
De 1995 a 2013, o MTE resgatou 46.478 trabalhadores de condições de trabalho análogas a da escravidão e emitiu R$ 86,320 milhões em multas por este motivo. Números alarmantes, especialmente para um país que se vangloria por ter uma das mais modernas legislações trabalhistas do mundo.
A Lista Suja do Trabalho Escravo existe desde 2003. Criada pelo MTE e pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), o cadastro é considerado um marco no combate ao trabalho escravo, pois dá transparência e acesso a informação, como previsto na Constituição Federal, por se tratar de assunto de interesse público.
A decisão do Ministro Lewandowski vai na contramão da urgência de se ampliar os mecanismos de transparência pública tão bem representados pela lista, além de ser um duro golpe ao combate da escravidão contemporânea.
No dia 15 de janeiro a Procuradoria Geral da República (PGR) entrou com um agravo regimental que busca a liberação da Lista. Na peça jurídica, a vice-procuradora da República, Ela Wiecko Volkmer de Castilho, ressalta que “a suspensão da divulgação dos empregadores autuados por infrações trabalhistas gravíssimas pode reverter o efeito de desestímulo que a existência desse mecanismo gera nos agentes econômicos e fazer que empregadores tendentes a adotar tais práticas ilícitas se sintam estimulados a concretizá-las”.
O Greenpeace considera a Lista Suja do Trabalho Escravo uma ferramenta essencial para que a sociedade reconheça e lute contra o problema. O Brasil não pode ficar de olhos vendados. A Lista deve ser publicada já!
Foto: © MPT/Divulgação
* Por Redação do Greenpeace Brasil/Publicado originalmente no site Greenpeace Brasil.
Fonte: Envolverde