Liquidação da participação popular na revisão do Plano Diretor de Florianópolis

    Um Plano Diretor feito a toque de caixa em plena pandemia interessa a quem?

    Está em curso o processo de revisão do Plano Diretor (PD) de Florianópolis. Entretanto, a forma como este processo está sendo conduzido pela gestão do prefeito Gean Loureiro (DEM) é autoritária, passando por cima da legislação e do direito que qualquer habitante deveria ter de debater sobre os rumos da cidade em que vive.

    A revisão do PD deve ser feita de forma que a população possa, efetivamente, participar do processo de discussão, já que o PD deveria orientar o desenvolvimento e a expansão da cidade, visando o bem coletivo de seus habitantes e o equilíbrio ambiental.

    Para que ocorra esta participação popular, são necessárias 13 audiências públicas (nos 13 distritos), com a presença de entidades comunitárias (como as associações dos bairros), técnicas (como conselhos profissionais) e representativas de classe (tais como sindicatos de trabalhadores). Para isto, existe uma série de requisitos expressos no Estatuto das Cidades, LEI No 10.257, DE 10 DE JULHO DE 2001fruto das lutas do Movimento Nacional pela Reforma Urbana, que tomaram corpo nos anos 80, e que estabelece diretrizes nacionais para que cada cidade possa promover a gestão democrática do Plano Diretor, desde a sua elaboração, processos de revisão até a definição dos mecanismos para a tomada de decisões.

    Entre os requisitos estão:

    * Ampla comunicação pública, em linguagem acessível, através dos meios de comunicação social de massa disponíveis (Art. 4º – I);

    * Ciência do cronograma e dos locais das reuniões, da apresentação dos estudos e propostas sobre o plano diretor com antecedência de no mínimo 15 dias (Art. 4º – II);

    * Publicação e divulgação dos resultados dos debates e das propostas adotadas nas diversas etapas do processo (Art. 4º – III);

    A organização do processo participativo também deverá garantir a diversidade, através da realização dos debates por segmentos sociais, por temas e por divisões territoriais, com alternância dos locais de discussão (Art.5º). E, também, a promoção de ações de sensibilização, mobilização e capacitação voltadas, preferencialmente, para as lideranças comunitárias, movimentos sociais, profissionais especializados, entre outros atores sociais (Art.7º).

    Diante de tão belas leis, a Prefeitura deu uma coletiva de imprensa no dia 01 de dezembro para apresentar a minuta do projeto de lei que altera significativamente o PD atual. Também marcou uma única audiência pública de apenas 4h no dia 17 de dezembro para “apresentação” da proposta de alteração para a sociedade, escolhendo o Auditório Antonieta de Barros, na ALESC, que possui capacidade máxima para 480 pessoas (Florianópolis tem em torno de 516.524 habitantes, segundo última estimativa do IBGE).

    Esta audiência às vésperas do natal é uma fraude, pois desconsidera totalmente o tempo necessário para um amplo debate na sociedade, já que somente para apresentar a minuta se esgotariam boa parte das 4h reservadas para a audiência. Também priva os moradores de cada bairro a oportunidade de debater com suas organizações locais o que imaginam para o seu território.

    Além disso, desconsidera o contexto da pandemia de Covid-19 em que vivemos, com a variante Ômicron preocupando autoridades sanitárias e científicas no mundo todo. Portanto, não é aceitável realizar uma única audiência pública em ambiente fechado, pois ainda é necessário o distanciamento de um metro entre participantes, reduzindo a capacidade do local e privando, dessa forma, a possibilidade de maior participação dos cidadãos.

    A Prefeitura também não disponibilizou os documentos técnicos que embasaram as mais de 150 alterações do PD, como também não forneceu um cronograma das discussões temáticas e audiências públicas nos bairros e distritos afetados pelas modificações propostas.

    Nos perguntamos quem se beneficia com tamanho atropelo, em um PD que tem inúmeros desafios, como planejar a cidade para as mudanças climáticas que já nos afligem. Em Julho deste ano, lançamos a campanha “SOS Ilha da Magia: Gean, quem vai pagar a conta da destruição ambiental?”, denunciando os inúmeros crimes ambientais que estão sendo cometidos na cidade, com fortunas sendo construídas enquanto a magia da ilha é destruída.

    Entendemos que este PD a toque de caixa serve aos interesses locais e até internacionais da especulação imobiliária e de empresas de construção civil, que financiam campanhas eleitorais e não encontram limites para sua expansão. É mais uma etapa deste verdadeiro “leilão”, feito sem transparência e colocando à venda nossa terra, mar, flora, fauna e o direito de viver em uma cidade mais democrática, ambientalmente e economicamente mais justa, transformando a prefeitura num balcão de negócios.

    Por esses motivos, o Tecendo Redes se somou a vinte e cinco organizações comunitárias, solicitando ao MPSC que interceda pelo cancelamento desta audiência pública fraudulenta, ilegal e desrespeitosa com o povo. Também convidamos todas as pessoas que tem compromisso com o futuro da nossa cidade para que denunciem este golpe e se organizem junto às suas comunidades para protestar e pressionar os vereadores pelo cancelamento desta audiência e pela realização das audiências públicas em todos distritos, bairros e comunidades!

    Participação popular não é assistir passivamente a exposição do que já vem pronto pelos administradores públicos, mas construir coletivamente a cidade que queremos. Nada sobre nós sem nós! Pela participação real do povo no planejamento e gestão da cidade!

    Tecendo Redes, Articulação de coletivos socioambientais da grande Florianópolis

    Petição protocolada no MPSC pelo cancelamento da audiência pública fraudulenta e ilegal proposta pela Prefeitura

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