Por Elaine Tavares.
Essa é uma semana movimentada na Venezuela. No próximo domingo, dia 30, acontecem as eleições para a formação de uma nova Assembleia Constituinte que pretende enfrentar a grave crise que se abate sobre o país e aprofundar o poder popular. A campanha tem sido intensa, muitos são os candidatos que concorrem representando setores da sociedade e também regiões do país. A intenção é garantir a maior representatividade possível.
Os políticos de oposição, que são os responsáveis pela guerra econômica e pelas “guarimbas” (trancamento violento de ruas e incêndios a prédios públicos) decidiram não participar do processo e seguem buscando construir espaços paralelos de poder, sem muito sucesso. Chegaram a organizar até um plebiscito consultando a população sobre a saída de Maduro e conseguiram mobilizar sete milhões de pessoas, o que não avança muito no número de votos que têm garantido na disputa com o chavismo. O resultado, que não tem qualquer valor oficial, não surpreende, afinal, a política na Venezuela sempre foi bastante polarizada e a participação intensa. De qualquer forma, a capacidade de organização da oposição mostra que a disputa continua dura, com tem sido desde sempre na luta de classes vivida pelo país a partir do aparecimento de Hugo Chávez.
Hoje, as guarimbas que chegaram a colocar fogo em um hospital infantil e vários prédios públicos, arriscando a vida de centenas de crianças, já começam a ser rechaçadas com vigor pela própria população. O medo está esgotado. Nas ruas, não são poucas as ações de enfrentamento com a exigência do destrancamento das ruas e as protagonistas são as mulheres. Elas saem dos carros, arregaçam as mangas e retiram as barreiras das ruas além de darem lições de moral nos guarimbeiros. Na última semana uma tentativa de incêndio no prédio da TV pública VTV foi imediatamente rechaçado pelos trabalhadores que colocaram, literalmente, os guarimbeiros para correr. Os grupos seguem com trancamentos surpresa nas ruas do centro da capital, mas ninguém se arrisca fazer uma guarimba nas comunidades de periferia, onde o bolivarianismo é forte. E é justamente nas comunidades onde a campanha para a Constituinte tem sido mais intensa. Ali, as pessoas estão preocupadas em garantir a vida na Venezuela, vida boa para todos, sem marcha atrás.
De qualquer forma o dia 30 não deverá ser tranquilo. A oposição mais violenta, comandada por Leopoldo Lopez, vai agir e esperam-se atos de terror. Desde o dia 20 de julho a MUD, que congrega a maior força de oposição comandada por Henrique Capriles, convocou uma greve geral, incentivando o desaparecimento de produtos das prateleiras e chamando a população para parar o país, impedindo assim que as eleições aconteçam.
Também convocou um “governo de unidade”, que nada mais é do que a proposta de um golpe. Ou seja, eles criam um gabinete de governo paralelo e comandam a greve, visando a derrocada do presidente. A greve foi chamada para a última sexta-feira e conseguiu garantir vários pontos de trancamento de rua. Houve dois mortos nos enfrentamentos, mas o movimento da oposição não chegou a ser massivo. Como já se viu, há certo esgotamento das ações violentas. De qualquer modo é certo que essa semana haverá mais alguma tentativa de barrar a eleição e não será na paz. A MUD segue apostando numa saída não eleitoral, pois sabe que não tem maioria.
No campo do chavismo as coisas também não são um lindo céu azul. Há divergências e grupos em disputa. A diferença é que mesmo aqueles que estão mais à esquerda e criticam o governo de Nicolás Maduro sabem que com a oposição no poder a Venezuela volta na história. Então, preferem o silêncio e fazer a disputa por dentro, tentando ganhar o maior número de cadeiras na Constituinte para fazer avançar as políticas mais radicais.
Segundo a análise do economista Nildo Ouriques, o principal nó na divisão das forças chavistas é a política econômica que tem sido levada pelo presidente Maduro e que, segundo ele, é a que alimenta a oposição. Maduro seguiu apostando na conta de capital aberto, sem tocar nos banqueiros. “A conta de capitais abertos permite que o sistema bancário pegue as divisas petroleiras e coloque tudo fora do país. Isso provoca a inflação e todo esse caos econômico. O governo tinha que ir para cima dos bancos. E não vai”. Nildo insiste que o governo Maduro não tem uma estratégia econômica para fugir do poder dos bancos, prefere manter o acordo com a elite, mantendo-a endinheirada e não consegue dar um uso produtivo para as divisas por causa do rentismo. Então é um círculo que precisa ser rompido.
Outra divergência entre os chavistas reside no fato de que Maduro não chamou um referendo para decidir se ia ou não à Constituinte. É fato que a Constituição atual permite que o presidente, com seus ministros, decida, mas essa nunca foi uma prática do chavismo. A posição mais previsível era de que a população fosse primeiro chamada a decidir sobre isso, como sempre foi no governo de Chávez. Maduro considera que a situação de guerra que o país atravessa foi a que levou a uma decisão assim, mas, de qualquer forma, há quem não concorde. Ainda assim, a aposta agora é garantir que a Constituinte saia e a vida siga, com a população conquistando mais poder.
O fato é que enquanto a população se organiza para não permitir que retorne ao poder o grupo apoiado e financiado por Washington, a batalha midiática contra a Venezuela segue a todo vapor. Os meios chamam de ditadura um país que mais faz eleição na América Latina, senão no mundo. Pois na Venezuela ainda quem manda é o povo. E se isso é uma ditadura, ela é bem mais democrática que a ditadura do capital na qual quem manda é um pequeno grupo de endinheirados.
Por isso que quem vai dar a direção sobre para onde vai o processo bolivariano é a população. Não tem sido fácil nesses anos todos acossada pelo ataque direto e implacável do imperialismo. Golpes, guerra econômica, violência. Todas as armas contra o poder popular estão sendo testadas por lá. E a população tem resistido. Agora, é mais uma prova. Está mais do que claro, pela análise das falas da oposição, que a tática é derrubar Maduro pela violência. Ninguém quer paz no grupo da elite, até porque não são eles os que estão nas ruas fazendo o combate. Não são eles os que tombam. Seus jatos estão sempre à postos para tomar o rumo de Miami. Já para a gente venezuelana, não há ir e vir para os Estados Unidos. A vida dela é ali mesmo, na Venezuela de Bolívar. E, com ele, assim como com a memória de Chávez, seguirão construindo a liberdade.
Fonte: IELA.