Por Dietmar Hipp e René Pfister.
(Português/Español).
Enquanto o Tribunal constitucional alemão reúne em Karlsruhe, para examinar o controverso pacote fiscal, Berlim receia que todo o plano de resgate da zona euro possa vir a ser posto em causa. Mas o Spiegelconsidera que não se trata apenas da Europa, mas também de uma luta entre os poderes executivo e judicial.
A chanceler alemã Angela Merkel raramente demonstra o seu desagrado em relação a qualquer coisa. Um dos seus pontos fortes é a capacidade para esconder as suas emoções, o que explica a surpresa dos seus colegas de partido quando, há duas semanas, o assunto do Tribunal constitucional federal alemão foi levantado numa reunião do comité executivo do seu partido de centro-direita, a União Democrática Cristã (UDC).
Os juízes tinham acabado de advertir Merkel por ter ignorado os direitos do parlamento durante os esforços para salvar o euro. Era já a segunda decisão nesse sentido este ano. Desta vez, a chanceler perdeu a paciência.
Perguntou como poderia seguir políticas razoáveis se tinha que revelar as suas táticas de negociação em cada reunião com um líder europeu. “Isto é demais”, lamentou Merkel. Depressa perceberam que a chanceler vê os juízes como professores de Direito irrealistas e sem qualquer perceção dos desafios da política do dia-a-dia.
A relação entre Berlim e o Tribunal de Karlsruhe nunca foi fácil. O Tribunal Constitucional Federal foi criado em 1951 para garantir que as instituições públicas respeitavam a constituição da recém-fundada República Federal Alemã. Desde então, os políticos no Governo têm considerado o tribunal como um obstáculo, que pode invalidar leis com um simples toque de caneta. Uma frase atribuída ao falecido político do Partido Social Democrático, Herbert Wehner, tornou-se lendária. “Não permitimos que os idiotas de Karlsruhe destruam as nossas políticas.”
Desacordo entre o tribunal e o mundo político
É natural que ocasionalmente haja desacordo entre o tribunal e o mundo político. O papel do tribunal é o de assegurar que o Governo cumpre as diretrizes estabelecidas pela Constituição alemã. Por outro lado, os políticos não apreciam que o tribunal os retrate como indivíduos desonestos que moldam a Constituição de forma a servir os seus acordos de bastidores. O facto de, em geral, os juízes terem um nível de popularidade muito superior ao que os políticos sonhariam ter, também não ajuda muito.
No entanto, desde o início da crise do euro, tem havido mais coisas em jogo do que as vaidades habituais. As decisões de Karlsruhe mais parecem acusações a uma chanceler que, na opinião dos juízes, ignora as regras básicasda democracia através das suas políticas de resgate financeiro.
Obviamente, é responsabilidade dos juízes controlar o executivo sempre que necessário. Mas, em Berlim, há quem suspeite cada vez mais que o tribunal está ao lado dos populistas e eurocéticos que se opõem fundamentalmente ao projeto da integração europeia.
A luta de poder acontece precisamente numa altura em que os juízes estão sujeitos a uma responsabilidade histórica. Se travarem os esforços para salvar o euro, é possível que arrastem a Alemanha e a Europa para uma recessão profunda, mas também que estejam a desferir um golpe fatal para a unidade no continente. É por isto que a – agora famosa – frase de Merkel “se o euro falhar, a Europa falha”, também pretendia ser um aviso ao tribunal de Karlsruhe.
Outra opção seria alterar a Constituição
Esta semana, a luta de poder entra numa nova fase. Na terça-feira, o tribunal vai analisar os pedidos para uma injunção temporária sobre o fundo permanente de resgate do euro, o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE), e o pacto fiscal, que pretende obrigar os países signatários a uma disciplina orçamental mais rigorosa.
Em 2009, o tribunal tomou uma decisão em relação ao Tratado de Lisboa que pesou fortemente sobre os políticos. Muitos interpretaram que a decisão significava que os limites da Constituição alemã tinham sido muito ultrapassados, e que só seria possível continuar a integração europeia se os alemães votassem uma nova Constituição.
De qualquer modo, os colaboradores de Merkel já estão a fazer planos para a eventualidade de Karlsruhe vir a impedir uma maior transferência de poder para Bruxelas. Uma opção seria a organização de um convénio constitucional, que constituiria, então, uma base legal completamente nova para o Estado.
Em teoria, esta é uma boa ideia. Na prática, no entanto, um tal convénio ocuparia as energias dos políticos durante anos, precisamente numa altura em que a moeda comum está a vacilar. Não admira que os principais membros da coligação descartem este cenário.
Outra opção seria alterar a Constituição alemã, para que passasse a incluir um novo artigo sobre a Europa. Isto abriria a porta a um processo de integração que resultaria num Estado federal europeu.
Juízes escolhidos nos bastidores
O ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble afirmou que um referendo sobre a Constituição “poderia acontecer mais depressa do que esperaria há alguns meses”. À primeira vista, as palavras de Schäuble sugerem uma rendição à vontade do tribunal constitucional.
Mas, dentro do Governo circula um ponto de vista diferente. Segundo fontes governamentais, Schäuble fez uma ameaça subtil ao tribunal. Se a Constituição fosse absorvida por um Estado federal europeu, isso implicaria uma perda de poder do Tribunal Constitucional. Por isso, assim defende o argumento, o tribunal de Karlsruhe deveria ter cuidado ao atravessar-se no caminho da política de Merkel para a Europa.
Os pró-europeus alinham ao lado de Schäuble nesta luta com o Tribunal Constitucional. Alguns dos seus veredictos “caracterizam-se por uma grande ignorância,” segundo Martin Schulz, o presidente social-democrata do Parlamento Europeu.
Os membros do parlamento seriam, talvez, menos sensíveis se os juízes aceitassem os mesmos padrões que estabelecem para os outros. Quando se trata da sua eleição, os juízes não gostam muito de adotar a transparência. Nas últimas seis décadas, os juízes do Tribunal Constitucional foram escolhidos nos bastidores.
Na passada quinta-feira, Karlsruhe analisou se o método de seleção dos juízes do Tribunal Constitucional respeitava a Constituição. Determinou que as decisões tomadas longe dos olhos do público são perfeitamente aceitáveis.
Karlsruhe, el tribunal que podría enterrar el euro
Por Dietmar Hipp e René Pfister.
Berlín teme que el Tribunal Constitucional Federal alemán eche por tierra el rescate de toda la eurozona cuando emita su veredicto sobre el polémico pacto fiscal. Pero, según Der Spiegel, no se trata solo de algo decisivo para Europa, sino que representa un enfrentamiento entre el poder ejecutivo y el judicial.
La canciller alemana, Angela Merkel, rara vez muestra su desagrado ante algo. Uno de sus puntos fuertes es ser capaz de mantener sus emociones a raya, lo que explica por qué los miembros del partido que le apoyan se sorprendieron cuando hace dos semanas se sacó el tema del Tribunal Constitucional alemán en una reunión del comité ejecutivo del partido de centroderecha Unión Demócrata Cristiana (CDU).
Los jueces acababan de amonestar a Merkel por vulnerar los derechos del Parlamento cuando se esforzaba en rescatar al euro. Se trataba ya de la segunda llamada de atención al respecto este año. Y en esta ocasión, la canciller ya no aguantó más.
Planteó que no sería posible consensuar políticas razonables si antes de acudir a una reunión con un líder europeo tenía que revelar cuáles iban a ser sus tácticas de negociación. “Agota mi paciencia”, se quejó Merkel. Se dieron cuenta rápidamente de que la canciller opina que los jueces son profesores de derecho utópicos que no entienden cuáles son los retos de la política cotidiana.
Berlín y el tribunal sito en Karlsruhe nunca han tenido una relación fácil. El Tribunal Constitucional Federal se creó en 1951 para garantizar que las instituciones estatales respetaban la Constitución de la recién creada República Federal de Alemania. Desde entonces, a menudo los políticos en el Gobierno consideran que el tribunal es como un órgano molesto que anula las leyes con un simple trazo de bolígrafo. Una frase que se atribuye a Herbert Wehner, difunto político del partido socialdemócrata, ha pasado a la historia: “No dejaremos que los imbéciles de Karlsruhe destruyan nuestras políticas”.
La unidad del continente está en juego
Entra dentro de lo normal que de vez en cuando el tribunal discrepe del mundo político. Su labor es asegurar que el Gobierno sigue las directrices que marca la Constitución alemana. A los políticos, por su parte, no les agrada que el tribunal los retrate como pícaros deshonestos que pliegan la Constitución a su antojo para que se adapte a los pactos que han consensuado a puerta cerrada. Tampoco ayuda que los jueces del tribunal normalmente gocen de una popularidad muy lejos del alcance de los políticos.
Sin embargo, desde que empezó la crisis del euro, está en juego mucho más que los usuales enfrentamientos por orgullo. Las decisiones de Karlsruhe se perciben como críticas a una canciller que, en opinión de los jueces, ignora las normas básicas de la democracia con sus políticas de rescate.
Por supuesto, es la labor de los jueces mantener al Ejecutivo en su sitio, cuando es necesario. Sin embargo, en Berlín hay quienes sospechan cada vez más que el tribunal se alinea con esos populistas y euroescépticos que básicamente se oponen al proyecto de integración europea.
La lucha de poder acontece precisamente en un momento en el que los jueces tienen una responsabilidad histórica. Si cejan en sus esfuerzos por salvar al euro, puede que no solo arrastren a Alemania y a Europa a una dura recesión, sino que también asestarían un golpe mortal a la unidad del continente. Por este motivo, la ahora ya conocida observación de Merkel de que “si el euro fracasa, Europa fracasa” también servía como advertencia al tribunal de Karlsruhe.
Esta semana asistimos a un nuevo capítulo de esta lucha de poder. El martes, el tribunal considerará las peticiones de medidas cautelares sobre del fondo permanente de rescate del euro, el Mecanismo Europeo de Estabilidad (MEDE), y el pacto fiscal, que pretende obligar a los Estados signatarios a que apliquen una política presupuestaria más estricta.
Un referéndum sobre la Constitución
En 2009, el tribunal tomó una decisión acerca del Tratado de Lisboa que supuso un gran lastre para los políticos. Muchos interpretaron esta manifestación como una muestra de que se habían superado ampliamente los límites de la Constitución alemana, y de que la integración europea únicamente era posible si los alemanes aprobaban una nueva Constitución.
En cualquier caso, los partidarios de Merkel ya se están planteando la posibilidad de que el tribunal de Karlsruhe detenga la transferencia de poderes a Bruselas. Una opción sería convocar una convención constitucional, que por lo tanto sentaría unas bases legales totalmente nuevas para el Estado.
En teoría es una buena idea. En la práctica, sin embargo, dicha convención acapararía todas las fuerzas de los políticos en los próximos años, precisamente en un momento en el que la moneda común se tambalea. No sorprende que los miembros clave de la coalición desestimen esta opción.
Otra posibilidad sería enmendar la Constitución alemana para incluir un nuevo artículo en relación a Europa. Abriría la puerta a un proceso de integración que terminaría en un Estado federal europeo.
El ministro de Finanzas, Wolfgang Schäuble, dijo que un referéndum sobre la Constitución podría “tener lugar más pronto de lo que hubiese parecido hace unos pocos meses”. A primera vista, las palabras de Schäuble suenan a doblegarse a la voluntad del Tribunal Constitucional.
Eurófilos contra Karlsruhe
Sin embargo, en el seno del Gobierno impera otro punto de vista. Según fuentes gubernamentales, Schäuble ha amenazado sutilmente al Tribunal. Si la Constitución queda absorbida por un Estado federal europeo, ello supondría que el Tribunal Constitucional perdería poder. Por eso, según esta línea argumental, el tribunal de Karlsruhe debería abstenerse en lugar de obstaculizar la política europea de Merkel.
Los eurófilos animan a Schäuble en su lucha con el Tribunal Constitucional. Algunos de sus veredictos se “caracterizan por dar muestras de una gran ignorancia”, opina Martin Schulz, el presidente socialdemócrata del Parlamento Europeo.
Los diputados serían probablemente menos susceptibles si los jueces siguiesen los mismos estándares que marcan para otros. En lo que respecta a su propia designación, los jueces no se muestran muy entusiastas a la hora de instaurar más transparencia. En las últimas seis décadas, los jueces del Tribunal Constitucional se han elegido a puerta cerrada.
El pasado jueves, Karlsruhe valoró si la elección de los jueces del Tribunal Constitucional se hace conforme a la Constitución. Se posicionó a favor de que las decisiones, aunque no se tomen en audiencia pública, son totalmente aceptables.
Fonte e Imagem: http://www.presseurop.eu