Texto e foto por Sérgio Homrich.
Pelo direito à moradia, famílias inteiras dos Residenciais Erica Modrock Menegotti e Parque Jaraguá Dante Minel passaram o dia de ontem (28) entre a Defensoria Pública e o Fórum da Comarca de Jaraguá do Sul, na tentativa de reverter as penhoras, leilões e despejos de seus apartamentos, decorrentes da impossibilidade de pagar as taxas abusivas cobradas pelas duas administradoras de condomínios. Para alguns deles, as dívidas chegam a R$ 40 mil. “Essa luta é por Justiça, para que não sejamos fantoches de agiotas”, dizia um dos muitos cartazes afixados na frente do Fórum. A “van de direitos” da Defensoria Pública, com seus advogados, esteve presente para realizar o atendimento individual. À tarde, aconteceu uma audiência de conciliação, no Fórum, ficando determinado que em 90 dias a administradora deve apresentar as justificativas de débitos de cada morador. Todos os processos de cobranças em aberto estão suspensos.
Os dois residenciais compõem 528 apartamentos e fazem parte do Programa Minha Casa Minha Vida do Governo Federal para faixa de renda de zero a três salários mínimos. “Má-gestão, ausência de publicidade na apresentação das contas e práticas de cobrança prejudiciais aos moradores” são os motivos alegados pela Defensoria na Ação Civil Pública contra as duas administradoras, assinada pelo defensor Marcelo Scherer da Silva, do Núcleo de Habitação e Urbanismo da Defensoria Pública (NUHAB). Os defensores Leonardo Vieira e Sidney Gomes, que atuam em Jaraguá do Sul, auxiliam na Ação que pede a intervenção nos condomínios, suspensão dos processos de cobranças em aberto, serviços e honorários advocatícios e que sejam discriminados os valores dos débitos em boletos, além de uma possível auditoria junto às administradoras.
Representante estadual da Campanha “Despejo Zero”, Jefferson Mayer lembra que a política habitacional do Programa Minha Casa Minha Vida é federal, mas também estadual e municipal. Ele explica o método utilizado pela empresa que administra os condomínios para lesar os moradores: “A empresa oportunista visa o lucro privado e, assim, as pessoas que ali moram passam a ser um ativo nas mãos dessa empresa, não são mais cidadãs de direito”. Presente em mais 10 estados, a Campanha Despejo Zero defende o rompimento dessa situação, “que o povo se auto organize e lidere seus próprios espaços de moradia, promova uma gestão popular que não vise o lucro, priorize o direito à moradia e a garantia de permanência a quem mais precisa desses conjuntos habitacionais”, reforça Jefferson Mayer.
A moradora do Residencial Erica Modrock, Roselene Godoy Pedro de Oliveira, tem seis filhos: Vitória, 16, Artur, 10, Rebeca, 5, e Henrique, 2 anos. Ela e o marido vivem da pensão dos outros dois filhos, Lucas, 24, e Laís, 22, que são especiais. A dívida com o condomínio é de R$ 36 mil, em um contrato, e de R$ 11.986,00 em outro, o qual ela nem sabe a que se refere. Em um deles, o financiamento proposto é de 48 vezes de R$ 1.705,00, e o outro contrato de 48 vezes de R$ 572,00. Já a prestação do apartamento é de apenas R$ 90,00. “Tem dias que não durmo porque é muita dívida, um valor que eu não consigo pagar”. A moradora do mesmo Residencial, Lorene Damásio Fagundes, cuida do marido doente. A prestação do apartamento é de R$ 50,00 mensais, já a dívida com o condomínio é de aproximadamente R$ 40 mil. “Cuido de um homem de 154 quilos, na cama, tenho que limpar, dar banho, ainda estou pagando a cadeira de roda que está em atraso e ele depende, senão nem vai ao banheiro, teria que ficar na fralda. Não queria que ninguém passasse por isso”, conta.
Na ação, a Defensoria Pública afirma que “as empresas rés aproveitaram-se das vulnerabilidades sociais, econômicas, culturais e organizacionais das famílias, bem como da hipossuficiência dos Condomínios contratantes, para desenvolverem uma prática ilegal e moralmente inaceitável que atinge diretamente os valores da sociedade construídos em torno da importância de viabilizar moradia digna à população de baixa renda”. E reforça: “A conduta das rés menospreza a mais básica das melhorias das condições de vida de famílias pobres, frustra as expectativas legítimas da comunidade e cria obstáculos para a concretização de uma das mais impactantes e relevantes políticas públicas do Brasil”. Por fim, pede a indenização dos moradores por dano moral coletivo, “categoria autônoma de dano que não se identifica com os tradicionais atributos da pessoa humana (dor, sofrimento ou abalo psíquico), mas com a violação injusta e intolerável de valores fundamentais titularizados pela coletividade (grupos, classes ou categorias de pessoas).”