Por Ana Laura Baldo, para Desacato. info.
*Aperto no peito, é assim que começo a escrever. Há duas semanas recebi a notícia que uma amiga tinha sido vítima de feminicídio e que sua morte tinha sido de uma forma cruel. Conheci a Mari há alguns anos, quando eu e outra amiga muito querida que tínhamos em comum, fomos até a sua casa, em Descanso, para conversar, escutar música, assistir filmes e comer pipoca, coisas que adolescentes fazem. Lembro que fiquei impactada olhando para as duas, porque eram extremamente parecidas.
Eu e Mauricéia não éramos próximas, tivemos esse único encontro há anos, que sempre guardei com amor e carinho. Ela era uma mulher doce, divertida e sonhadora. Foi difícil ouvir a notícia de sua morte, algo que dói, como se alguém tivesse me tirado algo.
Uma semana depois do crime, em Descanso, foi realizado um ato no município, no qual familiares e amigos pediram justiça por Mauriceia e assim conversei com as duas melhores amigas de Mari, Eduarda Turmina e Gabriela de Alencar, o que me permitiu escrever um pouco mais sobre Mauricéia.
Na luta por justiça
“A nossa amizade era muito intensa. Convivemos juntas desde pequenas, mesmo quando a Mari foi morar com a mãe, nós nunca nos separamos. Quando ela voltou, para morar com o pai, nossa amizade se engrandeceu, ficamos muito mais próximas”. Foi assim que Eduarda e Gabriela descreveram sua amizade com Mauricéia.
São dias tristes que elas, familiares e amigos de Mauricéia Estrach vivem os últimos dias, após o feminicídio da jovem de 21 anos em Descanso, no Oeste Catarinense. Mulher de sorriso lindo, olhos claros e energia contagiante, Mari, como era chamada por aqueles que a amavam, foi brutalmente violentada no último domingo do mês de março, dia 28, logo depois, teve sua casa incendiada.
Acreditasse que por conta dos ferimentos, Mari não conseguiu sair de dentro da casa, falecendo no local. O incêndio começou no início da manhã do último domingo do mês de março, na hora da tragédia, vizinhos avistaram duas pessoas retirando um carro da garagem e dois cachorros do lado de fora da casa. Uma dessas pessoas era o cunhado da vítima, a outra ainda sem identificação.
Conforme explicaram as amigas Eduarda e Gabriela, Mauricéia, a princípio, estava em casa sozinha com os dois animais de estimação, que ficaram a salvo do incêndio. “Como é possível os dois cachorros que estavam com a Mari se salvarem do fogo e ela não? Alguém abriu a porta para eles saírem mas não ajudou a Mari. Falta resposta para muitas perguntas. Porque só os cachorros se salvaram? Aí é que conseguimos provar que o fogo não foi acidental. Ela não ia abrir a porta e voltar para dentro de casa”, salientaram as amigas.
*Nota da autora: Retirar o carro e não ajudar uma possível sobrevivente? Espero que a justiça identifique logo que o cunhado é um feminicida!
Após procedimentos dos Bombeiros, para cessar o fogo, foi encontrado no local um corpo, sendo o de Mauricéia. O cunhado da vítima, ainda no local do incêndio, concedeu depoimento confuso para a polícia e estava com a mão machucada, conforme relatos de amigos de Mauricéia. “O silêncio dele apavorava. Ele não tinha resposta. As pessoas perguntavam a ele sobre a Mari e ele não respondia. O silêncio dele disse tudo. Bastou”, relataram as amigas, Eduarda e Gabriela.
Conforme relato à imprensa, o delegado responsável pelo caso, Cléverson Luis Muller, da comarca de Descanso, explicou que o caso intrigou os policiais porque a vítima era jovem e não tinha limitações físicas ou mentais que pudessem ter impedido ou dificultado a saída de Mauricéia da casa quando o fogo começou.
Ao relembrarem de Mari, Eduarda e Gabriela sorriram a todo momento. “Ela estava cheia de planos. Feliz com o trabalho em São Miguel do Oeste, com a proposta de trabalho do pai dela. A Mari era uma menina de luz, onde ela passava, deixava a marca. Para ela não tinha dia triste ou dia ruim, estava sempre com um sorriso contagiante no rosto. Um ser de luz, são essas as palavras certas para descrevê-la. Para nós, sem dúvidas ela era uma irmã. A pessoa que confiàvamos de olhos fechados, sem pensar duas vezes”, finalizaram as amigas.
*É preciso perguntar: até quando? Até quando mulheres viverão com medo de sair à rua à noite, de ficar sozinhas em casa. Até quando elas terão seus sentimentos de segurança abalados por conta da violência que sofrem todos os dias? A casa, que deveria ser o local de proteção e alento para todas as mulheres, para todas as pessoas, se torna o ambiente onde elas são machucadas, violentadas e mortas. O Brasil é o 5º país mais violento para as mulheres viverem. A Lei Maria da Penha, de 2006, ainda não é efetiva. É preciso cessar, é preciso acabar com a violência que assola todos os dias a vida das mulheres. Feminicídio, uma palavra que não sai do nosso vocabulário, é a causa da morte de Mari. O pedido é de justiça, para que a morte de Mauriceia não fique no esquecimento da lei e nem da sociedade.
NI UNA MENOS!
*opinião da autora!