Por Cristiane Sampaio.
Em manifestação feita nesta quarta-feira (18), o ministro da Justiça, Sérgio Moro, disse ser contra a liberação de presos por conta do coronavírus. A medida foi recomendada pelo Ministério Público Federal (MPF), que emitiu uma orientação para os governadores estaduais pedindo que sejam considerados o contexto do sistema carcerário e a vulnerabilidade da sua população diante da pandemia causada pela nova doença.
A Câmara de Sistema Prisional e Controle Externo da Atividade Policial da instituição pediu que diretores e juízes corregedores das unidades prisionais analisem a concessão de prisão domiciliar para três casos específicos: detentos em regime aberto, semiaberto e inadimplentes de pensão alimentícia.
O MPF também recomendou que sejam revistas as prisões cautelares para averiguar a possibilidade de imposição de uma medida alternativa à prisão, em caráter excepcional. A instituição pede ainda reavaliação da prisão nos casos em que os detentos pertençam ao grupo de risco para o covid-19, que inclui diabéticos, cardiopatas, pessoas com tuberculose ou HIV, entre outros.
O subprocurador-geral da República Domingos Silveira, autor da recomendação, argumenta que as medidas seriam “um eficiente caminho para harmonizar os direitos fundamentais em conflito” nesse tipo de situação, que são a segurança pública e o direito à vida por parte dos detentos.
Na declaração feita na tarde desta quarta, o ministro Sérgio Moro disse que a iniciativa deixaria “o restante da população” num contexto de maior vulnerabilidade.
“Minha compreensão é que [o problema] não se resolve [com a soltura]. Seria uma solução simplista abrir as portas das prisões, já que isso deixaria vulnerável o restante da população. Tudo isso tem que ser feito com muito cuidado”, disse, sem mencionar detalhes.
Para o advogado Patrick Mariano, da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), o posicionamento do ministro reflete um desconhecimento sobre a gravidade das questões que cercam o coronavírus.
“Demonstra que ele não entende nada de sistema penal, nem de sistema de saúde pública, nem de geopolítica, porque você vê que a população prisional faz parte das preocupações de todos os países que estão lidando com a pandemia”, destaca o jurista, mencionando o caso do Irã. Apesar do duro regime político que vigora no país, 85 mil prisioneiros foram libertados depois de o coronavírus matar 853 pessoas.
Mariano chama a atenção para as especificidades das cadeias brasileiras, cuja prisões estão 67,8% acima da capacidade, segundo levantamento feito pelo portal G1 em fevereiro deste ano, a partir de dados oficiais dos 26 estados e do Distrito Federal.
“Todo presídio brasileiro é superlotado. Você imagina a tragédia humanitária que não vai ser com a disseminação desse vírus nesses espaços de superlotação, onde as pessoas já não têm condições mínimas de saúde”, sublinha o advogado, mencionando a falta de banho de sol e de produtos de higiene em determinados espaços.
“Todo presídio brasileiro é superlotado. Você imagina a tragédia humanitária que não vai ser com a disseminação desse vírus nesses espaços de superlotação.”
A vulnerabilidade dos detentos fez também com que o ministro Marco Aurelio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinasse, nesta quarta-feira, que os juízes da área de execução penal avaliem a possibilidade de soltar presos idosos que estejam nos grupos de risco do coronavírus.
Prisões provisórias
Na terça (17), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), presidido pelo ministro Dias Toffoli, também se posicionou sobre o assunto, recomendando uma série de medidas para juízes e tribunais. Entre elas, está, por exemplo, a revisão das prisões provisórias. O CNJ ressaltou, com base em dados do Departamento Penitenciário Nacional (Infope), que o país tem 33,4% dos presos nessa situação, que é quando ainda não há uma sentença definitiva para o réu.
Para Patrick Mariano, caso ignore a demanda carcerária relacionada ao avanço do coronavírus, o governo Bolsonaro pode estimular um barril de pólvora diante do aprofundamento da crise.
“Ou você começa a soltar e começa a dar um tratamento digno pra essas pessoas lá ou haverá rebeliões”, projeta o jurista, defendendo ainda outras medidas, como um mutirão carcerário, por exemplo, que foi adotado pelo CNJ em outros momentos.
“Ou você começa a soltar e começa a dar um tratamento digno pra essas pessoas lá ou haverá rebeliões.”