Um jovem correspondente solicita minha ajuda para seu trabalho escolar em equipe sobre a Comissão da Verdade e da Justiça. Ele desenvolve considerações sobre como os trabalhos da Comissão podem evitar que no futuro do Brasil se instaure novamente regimes políticos criminosos, mas está em dificuldades com alguns de seus colegas que, baseados nas informações da imprensa nacional, compreendem que aquele período que não viveram não tenha sido tão ruim quanto alguns comentam.
Claro que contrapõem às impressões do amigo correspondente, a versão da “ditabranda”. E ele me pede um texto breve sobre o que a ditadura militar significou em minha juventude, quando percorria as capitais do país para não ser localizado pela repressão.
Além de difícil retomar aquelas lembranças, impossível resumir a memória de 2 décadas e meia em espaço tão exíguo quanto os estudantes dispõem para finalizar o trabalho no prazo estipulado pelo professor. Então, por minha vez, recorro ao poeta costarriquenho Jorge Debravo.
Ainda que reportando a realidade de outra ditadura e outro país de nosso continente, os versos de Debravo reproduzem com muita fidelidade o significado da ditadura militar brasileira para os que a viveram:
MIEDO
Jorge Debravo
Alguien tose en la noche
y en toda la ciudad resuena el tumbo.
Las paredes se quedan silenciosas
y el miedo se descuelga por los muros.
Y es que el miedo es verdad y el miedo vive
y el miedo anda descalzo por las calles
y el miedo entra a la iglesia
y a las escuelas y a los festivales.
Se le ve al profesor debajo del abrigo
y al músico en el hueco frutal de la guitarra.
Se le nota al chofer en la camisa.
Se le ve al diputado en la corbata.
Lo lleva el abogado en la cartera.
La porta el sacerdote en la sotana.
Le pesa a la maestra sobre el lápiz.
Le duele al orador en la garganta.
Y es que el miedo es verdad y el miedo vive
y el miedo anda silbando
y el miedo hace que andemos despacito
contando con angustia nuestros pasos.
Imagen: Jorge Debravo, poeta y amigo – Barboza. Acuarela. iberarte.com