Por Roberto Antônio Liebgott.
O governo federal, passados os 500 dias de administração do Bolsonaro com os militares, entrou na fase crítica. O caos na saúde, em função da Covid 19, é apenas a terra que saiu do buraco no qual o país está enfiado. Nem mais buraco é, tornou-se um abismo. E, pelo que se lê, ouve e se assiste, de tudo aquilo que se produz enquanto discursos em Brasília, o abismo não tem fim.
Ontem, mais um ministro da saúde abandonou o cargo, por duas divergências centrais: o presidente quer enfiar nas pessoas – doentes – a hidroxicloroquina, uma droga para tratar de malária e lupo e se não for bem administrada, mata mais do que salva; o presidente quer liberar geral, ou seja, não quer isolamento social, enquanto os médicos e cientistas do Ministério da Saúde dizem que se faz necessário o isolamento para evitar um genocídio. O fato do Bolsonaro insistir nesses dois argumentos se compreende, porque ele tem compromisso com os empresários da fé – querem botar o povo pobre pra louvar a deus nas igrejas fundamentalistas – e com os comerciantes que vendem produtos importados; e porque o presidente decidiu sozinho mandar produzir cloroquina, onde investiu uma fortuna incalculável para colocar a droga a disposição e agora não sabe o que fazer com ela, já que não serve para tratar os pacientes com Covid 19.
O que não se entende, nessa história toda, é um governo inteiro – a exceção do Ministério da Saúde – se empenhar numa demência como essa. Até os generais, que estão nos comandos estratégicos, se comportam como soldados rasos, e chegaram a dar uma coletiva a imprensa para defender as histerias do seu presidente e desqualificar os números de mortos e doentes pelo Covid19, comparando-os com os dados de outras doenças que também matam e, segundo eles, não se faz o mesmo alarde como o da pandemia do coronavírus. Ou, os caras são dementes, ou mal intencionados. Não há outra justificativa para tal constrangimento público. E, na mesma linha, defendem o Bolsonaro de unhas e dentes no caso da tal reunião ministerial, que provocou a demissão do Sergio Moro e onde ocorreu, pelo que se assiste, uma aberração política já que falaram até em mandar prender ministros do STF e isso conjugado a um acesso de fúria do presidente contra a PF, que não é, segundo o Bolsonaro, Polícia Federal, é outra coisa a PF dele, deve ser “prato feito”.
Pois os generais do governo, todos eles, defendem os impropérios do presidente e o fazem com a maior naturalidade e cara de pau. De duas uma, ou os milicos, que já são mais de 3 mil dentro do governo, em cargos estratégicos, em todas as pastas – inclusive no STF tem um general que assessora o Ministro Toffoli – estão se preparando para destituir o Bolsonaro ou, junto com ele, esperam pelo caos absoluto, para justificar o que vem sendo denominado de autogolpe. Ou seja, se desenha um estado de exceção e os Poderes Públicos, o Legislativo – Congresso Nacional especialmente – e o Judiciário, serão mantidos como figurantes no âmbito da República. E só há, por enquanto, uma saída, a destituição legislativa do presidente e com ela a retomada do controle, que vem se diluindo a cada dia.
Para a democracia não há outro caminho, caso não se faça, o autogolpe será inevitável, o que em certa medida já está em curso. Isso fica evidente quando o presidente da República invade o Supremo TRIBUNAL Federal, cercado de empresários. Com esse ato ele sinaliza que não respeita aquela instituição, ou quando esculhamba com o Presidente da Câmara dos Deputados e este, em seguida, vai ao palácio para ser abraçado pelo Bolsonaro, o que em verdade constituiu-se num ato vexatório, um rebaixamento ao extremo, o Maia pareceu uma espécie de lambe botas, com o se diz na gíria. E, quando nas entrevistas aos órgãos de imprensa o presidente, de forma covarde, desdenha dos profissionais, manda-os calarem a boca; ou, aos berros, diz que não vai responder as perguntas porque é tudo uma palhaçada; ou, quando manda um ator, vestido de palhaço, entregar bananas aos jornalistas, tudo isso é uma combinação de fatores políticos de que está em andamento uma ruptura institucional, que somente será evitada se houver coragem do STF e do Congresso Nacional. Os militares já comandam o país, basta saber se irão manter o presidente ou se andarão em carreira solo.