Por Pedro Biava.
Representantes de cinco terras indígenas do extremo sul da cidade de São Paulo (SP) e do litoral paulista fizeram um protesto inédito na sede da empresa Rumo Logística, na última quarta-feira (24), em Curitiba (PR), exigindo compensação ambiental em obras de duplicação de ferrovias. Enquanto cerca de 100 representantes dos povos Guarani e Tupi ocupavam a entrada da empresa de forma pacífica, cinco lideranças puderam entrar e participar da Assembleia Anual da multinacional como acionistas.
O objetivo era levar, diretamente aos investidores, denúncias contra a diretoria da empresa, que tem se negado ao diálogo. A Rumo é uma empresa de capital aberto e, por isso, para participar da reunião, basta de ter adquirido uma única ação, como fizeram os Guarani. É a primeira vez que o chamado “ativismo societário” é utilizado no Brasil pelos próprios representantes das comunidades afetadas.
“A nossa intenção não é ganhar recursos, tendo ações dentro da empresa, mas sim ter direito a voz, de levar a realidade para dentro da assembleia”, relata Tiago Karai, liderança Guarani da Terra Indígena Tenondé Porã, de Parelheiros (SP).
Na reunião, os indígenas denunciaram a dificuldade de dialogar com a diretoria da empresa e leram uma carta exigindo que a Rumo Logística cumpra os trabalhos de compensação ambiental pelas obras de duplicação do trecho Itirapina–Cubatão, da malha ferroviária Paulista, realizada em 2011.
Adriano Karai vive na aldeia Tenondé, em Parelheiros (SP), e aponta alguns dos impactos sentidos pelos Guarani: “Tem o barulho do trem, que é a noite toda. Os animais não frequentam mais os locais de caça. A gente não tem mais uma noite calma. Eles também transportam muitos grãos que acabam se espalhando pelo território, e a gente sabe que aquele alimento não é de qualidade, é transgênico”, relata. “E a gente acaba convivendo com o perigo: o trem passa pelos nossos territórios, onde costumamos visitar as aldeias, nas trilhas. A gente corre o perigo de ser atropelado pelo trem, porque agora o trem passa a cada dez minutos”.
A estrada de ferro, hoje sob comando da Rumo, corta o território tradicional dos Guarani desde a década de 1930, mas a duplicação do trecho afetou o meio ambiente e a vida das comunidades da região de maneira ainda mais contundente. O Ministério Público Federal (MPF) apurou as denúncias e confirmou o descumprimento das condicionantes ambientais determinadas pelo Ibama.
As comunidades afetadas já se organizaram em um Comitê Interaldeias e, entre as propostas apresentadas, está a de que parte das ações de mitigação passem a ser geridas pelos próprios indígenas.
Dos 101 acordos de compensação ambiental, 72 estão completamente paralisados.
A assembleia terminou sem nenhum acordo firmado, mas representantes da Rumo se comprometeram a levar as demandas dos Guarani e analisá-las para uma reunião da empresa que será realizada em maio.