De incertezas a vida está cheia. Ainda bem. Das camadas que cobrem a pele, por proteção ou especulação, o corpo busca as brechas, as frestas, como poros. Furar os mantos imaculados, deslocar o tecido que reveste, às vezes paralisa na forma, outras dá margem às dobras. Tudo e nada é possível o tempo todo. Tudo e nada está em jogo o tempo todo. O que é tudo, o que é nada. Na verdade, não importa a resposta.
Incerteza é o dispositivo primordial desse trabalho, que ganha corporeidade na relação de interação entre duas artistas, que sobem ao palco como ato de coragem e mistério. Contraem-se, expandem-se como o mover do sentir. Não há lógica, e sim profundidade não estacionada na clareza da mente. É experiência, muito além da técnica. Contrário à relação de poder, na direção do improviso. Não conforto, e sim impulsionamento. Sobrevivência ou simplesmente vivência. Como é ficar presente para o instintivo?
O projeto “ensaio para algo que não sabemos” foi criado por Dani Alves e Karina Collaço, na ativa como laboratório de dança e pesquisa desde 2016, que mergulha a fundo distante da superfície. A performance volta aos palcos físicos após período de confinamento, só que com outra formação corporal.
Dani Alves dedica tempo aos estudos de mestrado, e quem assume a dramaturgia – sem substituição criativa -, com todo protagonismo que o corpo/história carrega é Monica Siedler. As quatro apresentações do espetáculo “Protótipo 2 – encher-se de buracos” estão confirmadas para o mês de abril em duas cidades.
Itajaí abre a programação nos dias 07 e 08 de abril, no Itajaí Criativa e Florianópolis em 12 e 13 de abril, no SESC Prainha, sempre às 20h. Os ingressos são gratuitos e limitados, e serão distribuídos uma hora antes das exibições.
Conexão virtuosa
O nome de Monica Siedler para esta exibição do protótipo não apareceu à toa. A bailarina Karina Collaço nutre uma admiração pela artista há anos corridos, e trabalhou com sua irmã Elke Siedler em uma companhia de dança contemporânea em Florianópolis. Monica sempre circulava com interesse pela cena da dança.
“O primeiro nome que veio foi o da Mônica, pois ela tem uma estrada no campo do teatro como atriz, mas sempre bebeu da dança. Sempre passeou por esse universo. Temos uma ligação de admiração, e a aceitação por parte dela foi imediata”, conta Karina.
Os ensaios começaram com a virada do ano, em praças abertas. Depois, do jeito que dava, ainda com o agravante da pandemia e confinamento, passou para garagem, também uma sala 3x3m2 na casa de Mônica. A dupla foi abraçando as incertezas espaciais como parte do trabalho.
A flexibilização da materialidade sustenta os pés no chão. Essa é a única certeza, por enquanto, assumida. Os cadernos de anotações, repletos de pesquisas, foram revisitados. Assim como o figurino e a parte luminotécnica, que devem mudar nesta outra versão. Pois a realidade é apenas possibilidade de elaboração.
“Não há problema algum em reordenar os caminhos deste trabalho. Estou em contato com outra artista, a cena que vamos atuar irá mudar, de uma Casa de Cultura para um teatro. Iniciamos a pesquisa numa caixa preta e assim o trabalho assume essa vulnerabilidade. O projeto respeita o estado de flexibilidade, de transformação, de incertezas, esse lugar, essa metamorfose que a gente vai transformando e ganhando camadas a cada corpo que chega. Então é isso. Dividir esse momento com a Monica é estar numa outra situação em palco, em cena, trocando essa energia com o público. Sentir sensorial e sensitivo. Estamos na expectativa de viver e se entregar para essa experiência e poder sobretudo se divertir, acalmar os corações”, comenta Karina.
Monica foi apresentada aos materiais tratados como dispositivos na performance. As intérpretes tiveram um momento de reconhecimento, percepção e relação sempre amparadas pelos apetrechos, espaço e conexão entre os corpos.
“Tem coisas na performance que são preposições já resolvidas, mas não se trata de uma coreografia. Eu não estou substituindo uma bailarina, mas entrando na performance e o trabalho se modifica a partir de como me relaciono com esses objetos, na singularidade. Os sentidos vão se modificando, criando formas diferentes, transformando as relações. As simbologias e sentidos do fazer. Depois de um tempo de confinamento, os deslocamentos reduziram. Se engajar novamente no espaço acaba sendo um voltar para mim mesma. Um corpo presença”, compartilha Monica.
O Projeto selecionado pelo Edital Aldir Blanc 2021 – executado com recursos do Governo Federal e Lei Aldir Blanc de Emergência Cultural por meio da Fundação Catarinense de Cultura. A organização do espetáculo recomenda o uso de máscara.
FICHA TÉCNICA
Concepção, Criação e Direção – Daniela Alves e Karina Collaço
Intérpretes-criadoras – Karina Collaço e Monica Siedler
Interlocução Dramatúrgica – Paloma Bianchi
Colaboração Artística – Tuca Pinheiro e Hedra Rockenbach
Iluminação – Ivo Godois
Operação de Luz – Ivo Godois e Cleber Fiorio Castellar
Composição Sonora – Chico Martins e Wilson Souza
Figurino – Alice Assal
Fotografia e Arte Gráfica – Bolívar Alencastro
Assessoria de Imprensa – Luciana de Moraes
Coordenação e Produção – Karina Collaço
APOIADORES
Casa Ventana
Sesc Prainha – Florianópolis/SC
Itajaí Criativa – Residência Artística
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