Por Neto Lucon.
O homem trans Theo Lima, de 23 anos, passou por momentos de violência e transfobia no dia 20 de maio após sair de um clube noturno de Campinas, interior de São Paulo. Ele foi abordado por sete homens, que o espancaram e o deixaram nu em plena rua.
Em conversa com o NLUCON, ele afirma que no início pensou ser um assalto, mas que depois percebeu que se tratava de um crime de transfobia.
“Eles pegaram meu celular e, quando tentei recuperar, começaram a falar que eu queria ser macho, mas que eu era uma menininha. Eles me levaram para o carro e me deram murros com a camiseta amarrada na mão e chutes na costela. Tiraram minha camiseta, meu binder e continuaram a fazer piadas. Estava chovendo e eu desmaiei. Só acordei quase meio dia, sem camisa. Foi horrível”, conta.
Ao acordar, Theo encontrou o pai que estava em sua procura e registrou um boletim de ocorrência no 1º DP de Campinas no dia seguinte, 21 de maio. No Boletim, é especificado que os agressores chegaram a consumir 18 reais com o cartão de Theo e tentaram sem sucesso fazer outras operações bancárias, deixando a vítima na da Av. Barão de Itapura com a Avenida Brasil.
Até o momento nenhum suspeito foi identificado.
A mãe Silvana Carvalho Araújo declara que todos estão assustados com o episódio e que não imaginava que o preconceito que assola o Brasil fosse tão forte. O país é campeão de assassinatos de pessoas trans no mundo (TGEU). “Isso aconteceu na semana que ele chegou de Florianópolis e nos deixou muito abalados. A gente sabe que existe preconceito, mas só consegue entender a dimensão quando alguém que está do lado passa por aquilo”, afirmou.
Theo conta que após o episódio entrou em depressão e que tentou suicídio, quase sendo internado em um hospital psiquiátrico para que não tirasse a própria vida. “Não estou bem. Tenho pesadelos todas as noites e estou a base de medicamentos para conseguir dormir”, afirma. “Estou com medo de sair na rua e acontecer novamente e tenho medo que isso também aconteça com outras pessoas”, declarou.
SOU UM HOMEM
Designado mulher ao nascer, Theo se identifica com o gênero masculino desde quando era criança. “Eu andava sem camisa, vestia roupas do meu irmão. A minha mãe deixava quieto, até porque ela não entendia direito”, conta ele, que até os 11 anos não via diferença de nenhuma outra criança designada homem ao nascer.
A mãe lembra que no início não conseguia identificar o comportamento de Theo como de um garoto trans. “Ele rejeitava tudo o que era rosa, algumas roupas e gostava de brincadeiras que as pessoas dizem ser dos meninos. Observando agora, eu sei que ele é assim desde pequeno. Já nasceu assim”, diz.
Mas foi na adolescência que surgiram os conflitos internos, sobretudo após as transformações no corpo na puberdade. Ele teve depressão e, por não entender o que acontecia com sua identidade de gênero, não tinha vontade de viver. Assim como muitas pessoas, ele não tinha sequer escutado a possibilidade de ser um homem trans.
Aos 15, conheceu um australiano que falava sobre a transição de gênero em uma reportagem. O choro foi inevitável, afinal ele estava lendo pela primeira vez tudo o que sentia. Ainda assim não tinha coragem de falar para os familiares de que era na verdade um homem. Para piorar, o psiquiatra disse que aquilo tudo era besteira, que ele deveria focar em outras questões e não pensar em ser trans. “Foi uma luta”, diz.
Com 22 anos, mudou de estado e iniciou a hormonioterapia. “A minha mãe sabia até então que eu era lésbica, ainda que não precisasse ter falado nada. Mas quando comecei o tratamento hormonal em Florianópolis falei que era um homem trans. Disse que toda a minha depressão era motivada por conta disso. Para o meu pai foi um pouco mais difícil, mas desde então me chama de Theo. Eu sou o que quero ser”, afirma.
Na semana em que ele chegou de Florianópolis para Campinas, ele enfrentou o pior episódio de transfobia de sua vida.
CIRURGIA
Apesar do acolhimento familiar, Theo afirma que a transfobia é constante. E que tem muita disforia em relação ao peitoral, também pelo preconceito que sofre. “Imagina ser homem e ter seios grandes. Eu uso uma faixa que me machuca, me deixa cheio de hematomas, como sangue pisado. Não posso usar regata, morava na praia, mas não poderia ir para a praia e tenho que inventar histórias ao ser constantemente questionado”.
Ele conta que recentemente foi vítima de transfobia por parte de uma mulher cis. “Eu estava num posto de gasolina e ela simplesmente chegou e disse que eu não era homem. Eu reafirmei que era homem, sim, e a minha amiga também confirmou. Depois, a mulher veio pedir desculpas e me abraçou. Neste momento ela conseguiu sentir a faixa e o peito, e disse: ‘Tá vendo? Você não é homem’. Para mim foi humilhante”, afirmou.
“Vejo que a cirurgia é uma questão de saúde mental e também de proteção contra a sociedade”, declara ele, que tem evitado sair de casa e está a base de medicamento para sobreviver ao trauma da agressão.
Assim como muitos homens trans, ele divulgou na internet – seis dias antes do triste episódio – uma vakinha para que realize a mamoplastia masculinizadora (a retirada dos seios e masculinização do peitoral). Ele pede 13 mil reais para que consiga realizar o procedimento e que tenha uma vida social, física e psicológica mais saudável. Até o momento, ele conseguiu apenas 140 reais, ou seja, 1, 12% do total. Caso você queira contribuir, clique aqui.
A mãe também espera que ele consiga realizar esse sonho: “A gente está apoiando porque sabe o quanto tudo isso está mexendo com o emocional dele. É o que ele quer e precisa. Se eu tivesse condições já teria pagado, mas não é o caso. Trabalho como manicure e o pouco que entra é para sustentar a família. O Theo é um garoto muito trabalhador, mas apos esse terrível acontecimento está com medo de sair, com crises de pânico, o que torna mais difícil se recolocar no mercado de trabalho. Estamos nos esforçando, mas não está fácil. Gostaria de ver meu filho mais feliz, com autoestima, alegria e outra visão de vida. É o que está faltando para ele mesmo”, afirma
Nós do NLUCON lamentamos muito o ocorrido e desejamos que Theo consiga superar as marcas do preconceito. E que consiga realizar o sonho da cirurgia.
Fonte: Nlucon