As notícias dão conta de cerca de 50 mortos entre os manifestantes contrários ao atual governo. Rapidamente, cumpre dar conta desse quadro, muito comum infelizmente nessa nossa América Latina.
Pedro Castillo, eleito presidente do Peru em 2021, sofreu um golpe no início de dezembro de 2022, depois de ter anunciado a dissolução do Parlamento e a convocação de novas eleições. No lugar dele, assumiu Dina Boluarte, vice de Castillo.
A presidenta Dina Boluarte dobrou a aposta em janeiro e ampliou o estado de emergência por 30 dias na capital Lima e nas regiões andina de Puno e Cusco. Curioso constatar: produziu-se um tremendo alarido com a pretensão de Castillo de dissolver o Parlamento e convocar novas eleições, e houve inclusive a prisão dele.
A nova presidenta decretou o estado de emergência, e as coisas parecem correr no melhor dos mundos para maior parte de nossa mídia. Em menos de 40 dias de mandato, nos protestos contra o golpe, haviam morrido 45 manifestantes, incluindo seis menores de 15 e 17 anos.
Na segunda-feira, 9 de janeiro, a repressão às manifestações deixou pelo menos doze novos mortos a tiros na região serrana de Puno, epicentro das maiores mobilizações.
Em dezembro, foram 28 mortes, 22 das quais vítimas baleadas pela polícia e pelo Exército. Todas as pessoas mortas são das regiões mais abandonadas do Peru. Como parte desse massacre há 485 feridos.
A Cruz Vermelha, a Anistia Internacional, os presidentes do México, Colômbia, Argentina, Cuba, Venezuela, Honduras e Bolívia uniram-se na condenação a esse banho de sangue e ao golpe Mas, a presidenta faz ouvidos de mercador, e a repressão prossegue.
O Estado de Emergência foi decretado por Boluarte em 14 de dezembro. Assim, restringiam-se os direitos constitucionais e permitia-se a intervenção da Polícia Nacional e das Forças Armadas.
Como há uma insatisfação profunda com a destituição de Castillo, houve e há manifestações por todo o País.
Organizações sociais denunciam tortura, presença de atiradores, uso de armas não autorizadas, uma acentuada violação dos direitos humanos.
As mobilizações exigem a renúncia de Boluarte, uma Assembleia Constituinte, o fechamento do Congresso atual, a libertação de Pedro Castillo, o retorno dele à presidência e a realização de eleições gerais imediatas.
O impressionante é assistir à continuidade das mobilizações populares, especialmente das populações indígenas, apesar da brutal repressão.
A classe dominante peruana não esperava essa irrupção, essa explosão de mobilizações populares diante do golpe contra Castillo.
Da prisão, o ex-presidente continua a dizer o óbvio: a prisão dele é ilegal e arbitrária. Não tem intenção de pedir asilo. Desde 2016, o país teve seis presidentes, nenhum dos quais tendo cumprido mandato completo.
A América Latina e suas veias abertas.
Houve gritaria quando Castillo quis dissolver o Parlamento e convocar novas eleições. Bastou ocorrer o golpe, e tudo mudou. Como tudo foi feito segundo as novas modalidades de golpes pelo Continente, então naturalizou-se a iniciativa.
Li vários textos no Brasil dizendo do absurdo da iniciativa de Castillo, e por mais ela tenha sido, admitamos, um equívoco, muito mais grave é o massacre em andamento agora, sobre o qual há silêncio ensurdecedor.
As vozes neoliberais aparecem em alguns momentos como defensoras da democracia, como se os golpes pudessem ser fiadores dos regimes democráticos, e tais vozes sabem da falsidade de tal argumento. Falaram nesse tom no caso do golpe peruano. E quando sobrevém o banho de sangue, silêncio.
As forças democráticas, progressistas e de esquerda devem acompanhar com atenção a evolução da crise peruana, sobretudo insistir no sentido de dar um basta ao banho de sangue conduzido pelas classes dominantes daquele país e encontrar caminhos democráticos para a solução dos problemas peruanos.
Referências
DOMINGUEZ, Francisco. O golpe no Peru. A Terra é redonda, 19/12/2022.
DOMINGUEZ, Juan Manuel. A direita dá um banho de sangue no Peru. Brasil 247, 11/1/2023
GOVERNO do Peru amplia estado de emergência em Lima e Cusco. Ópera Mundi, 15/1/2023.
INCÊNDIO atinge prédio no Peru em meio a protestos contra presidente. UOL, 19/01/2023.
*Emiliano José é jornalista e escritor, autor de Lamarca: O Capitão da Guerrilha com Oldack de Miranda, Carlos Marighella: O Inimigo Número Um da Ditadura Militar, Waldir Pires – Biografia (2 volumes), entre outros.
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