Há 100 anos, sindicato com raízes comunistas reunia 250 mil membros na África do Sul

Segundo o dossiê, “o STIC emergiu da fermentação geral negra, incluindo tumultos, greves e boicotes” / Foto: Wikicommons

Instituto Tricontinental de Pesquisa Social lança nesta terça-feira (3) o dossiê “Uma Breve História do Sindicato de Trabalhadores Industriais e Comerciais na África do Sul (1919-1931)”, que conta a trajetória pouco difundida de uma associação de raízes comunistas que reuniu milhares de trabalhadores sul-africanos há cerca de um século.

A história começa quando Clements Kadalie, primeiro líder sindical negro da África do Sul, conhece o socialista britânico Arthur Batty, na Cidade do Cabo. Depois do encontro, que ocorreu em 1918, os dois começaram a trabalhar juntos na tentativa de criar uma organização sindical que representasse os trabalhadores negros nas docas.

A ideia vingou já no ano seguinte. Em 17 de janeiro de 1919, com a adesão de 24 membros, foi criado o Sindicato dos Trabalhadores Industriais e Comerciais (STIC). Em dezembro daquele ano, o movimento político organizaria, em conjunto com os Trabalhadores Industriais da África, sua primeira greve.

Segundo o dossiê, “o STIC emergiu da fermentação geral negra – incluindo tumultos, greves, boicotes – que se desenvolveu na maioria das cidades e em muitas áreas rurais da África do Sul, após a Primeira Guerra Mundial”.

O sindicato fez sua primeira incursão para além das fronteiras da Cidade do Cabo em 1920, criando uma filial em Lüderitz, no sudoeste africano, hoje território da Namíbia.

Uma das bandeiras da organização sindical foi a da igualdade salarial entre homens e mulheres, um avanço extraordinário para a época. Segundo o estudo, a intenção era que todas as mulheres nas indústrias e no serviço doméstico fossem “protegidas pela organização, incentivando-as a se somarem em todos os setores do sindicato e a ajudá-las a obter um salário digno”.

O objetivo, no entanto, não foi alcançado como pretendido. “No auge de sua popularidade, as mulheres representavam cerca de 15% dos integrantes. Apesar disso, o STIC permitiu o surgimento de algumas poderosas líderes, e o compromisso declarado da organização com equidade de gênero nesse período é digno de nota”, aponta o dossiê.

Perseguição e disputas internas

Em 1920, ocorreu um dos momentos mais dramáticos do STIC. Após retornar de uma conferência em Porto Elizabeth, cidade portuária da parte oriental da província do Cabo, o líder Samuel Masabalala foi detido por forças de segurança que forjaram acusações contra o sindicalista. Uma multidão de 3 mil pessoas se reuniu para exigir sua libertação imediata. A manifestação, no entanto, foi fortemente reprimida, deixando 24 pessoas mortas e centenas de feridos.

Após o ocorrido, o grupo radicalizou sua atuação. De acordo com o estudo, “quando ficou claro que os sindicatos estavam se inspirando na Revolução Russa, houve um crescente pânico branco em relação ao ‘povo da bandeira vermelha’”.

Outros motins foram organizados. Um dos maiores ocorreu em abril de 1925, tornando-se um divisor de águas nas mobilizações populares sul-africanas: 23 mil residentes negros de Bloemfontein se revoltaram e destruíram postos policiais, lutando contra a discriminação racial. Cinco pessoas morreram na ocasião.

O STIC continuou crescendo e entre 1927 e 1928 já contava com cerca de 250 mil membros sindicalizados. Diante das greves organizadas pelos sindicatos, “fazendeiros brancos furiosos invocaram a intervenção estatal, alegando que aquilo não era sindicalismo, mas ‘agitação geral’”.

Além de toda a repressão, disputas internas entre as lideranças da organização acabaram minguando seu poder de mobilização. “Em 1931, o STIC era uma força desgastada na África do Sul, embora várias filiais perdurassem pelos próximos trinta anos”, finaliza o texto.

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