Guerra às drogas dos EUA, usada para deportar estrangeiros com condenações, muda vida de famílias de imigrantes

Por Anthony L. Fisher. Quando se trata de imigrantes documentados e política para as drogas, você é culpado até que prove sua inocência: conheça a história de Melida Castro, vítima da política antidrogas de Barack Obama.

Você veio legalmente para este país, quando moça. Passou três décadas trabalhando, pagando impostos, criando os filhos. Mas um pequeno arranhão na lei, 20 anos atrás, te colocou na dianteira da fila da deportação. Você será presa em sua casa e colocada na prisão, onde será considerada culpada até que prove sozinha a sua inocência. Se não puder arcar com o custo de um advogado, ninguém fará isso por você.

Isso é o que Melida Castro, natural da Guatemala e residente permanente nos Estados Unidos, aprendeu a duras penas quando autoridades imigratórias bateram à porta de sua casa, em Nova Jersey, com um mandado de prisão.

Eles a levaram sob custódia por suspeita de tráfico de drogas. A pequenina mãe de três crianças não parece se encaixar no perfil de peça central do narcotráfico. Mas numa noite fatídica, duas décadas atrás, Melida foi parada quando estava num carro com dois amigos. Sem que ela soubesse, eles estavam em posse de pequena quantidade de cocaína. Embora os dois tenham assumido a responsabilidade pelas drogas, todos no veículo foram presos.

Em razão da ameaça de deportação, um advogado aconselhou Melida a se declarar culpada de posse simples, um pequeno delito. Pagou uma multa, prestou serviço comunitário e se livrou da acusação. Nos 20 anos seguintes, ela obteve o green card (que atesta a legalidade da residência no país), passou no teste de cidadania e nunca teve nenhum outro problema com a lei.

Nada disso foi levado em conta. As autoridades estavam aqui para tirar a mãe de três crianças de sua casa e colocá-la em um dos mais draconianos e desumanos bolsões do sistema legal norte-americano, um centro de detenção a quase duas horas da residência dela, onde era proibida até mesmo de tocar nos filhos durante as visitas.

Melida se recorda de uma vez quando um guarda gritou com a filha dela, de 12 anos de idade, por tentar abraçá-la. Depois disso, Melida foi revistada nua e forçada a se agachar e tossir para provar que não havia recebido nada ilegal de alguém do lado de fora da prisão.

Como uma pessoa com uma pequena rusga em seu histórico, e que supostamente já tinha pago por isso, acaba sendo trancafiada sem nenhuma possibilidade de recurso legal?

Grace Meng, da Human Rights Watch, entidade que publicou um relatório detalhando dezenas de casos como esse, disse à Reason TV: “A administração Obama tem se concentrado em deportar qualquer um com uma condenação penal. Neste país, prisões por drogas são muito comuns. De 2007 a 2012, foram deportadas mais de 250.000 pessoas cuja condenação mais grave era um delito relacionado a drogas. Desse total, o tipo mais comum de conduta delituosa era a posse”.

Não há volta

Meng acrescenta que os juízes da Imigração não têm nenhum discernimento, “suas mãos estão atadas” quando se trata de adjudicar casos considerados “crimes agravados”. Os juízes têm de deportar essas pessoas sem lhes proporcionar uma audiência individual onde possam apresentar evidências em seu favor. Além disso, imigrantes pobres não têm direito a defensores públicos e essas deportações são irreversíveis. Não há volta.

O que pode ser feito para aliviar o sofrimento desnecessário quando a legislação se abate sobre residentes dos Estados Unidos cumpridores da lei, e que possam ou não ter cometido um crime?

Quando Melida foi detida, a mãe dela, sofrendo as sequelas do mal de Alzheimer em seu último estágio, foi deixada sem sua principal cuidadora. Melida também não pôde ajudar sua filha grávida, Mercedez, quando se aproximava o dia do parto.

Mercedez contou à Reason TV como ela e suas irmãs nascidas nos EUA avaliavam a mudança para a Guatemala (que ela descreve como um lugar bonito, mas assustador) para ficar com a mãe, no caso de ela ser deportada. No entanto, elas acabariam poupadas da decisão sobre deixar o país.

Após sete meses na prisão, e depois de Melida acumular enormes despesas legais, um juiz decidiu o óbvio: que nunca tinha sido uma traficante de drogas. Estava livre, mas por causa de uma lei bastante genérica e sua dura aplicação, ela perdeu o nascimento do neto e muitos dos últimos dias de sua mãe. Ao ouvi-la contar a história, ela perdeu muito mais do que isso.

“Senti falta de meus filhos”, diz Melida. “De abraçá-los e beijá-los. De me certificar de que estavam indo direito para a escola. Senti falta de minhas plantas, minha música, o cheiro da lavagem das roupas. Coisas em que você não pensa que vai sentir falta.”

Embora tenha sido injustamente detida por meses, Melida é uma das sortudas. Sob a atual política da administração Obama, na qual as deportações cresceram de modo dramático, as pessoas têm sido deportadas por crimes que haviam sido perdoados, arquivados ou, comprovadamente, nem tinham sido crimes.

Meng diz que o atual clima político é tão hostil aos imigrantes, mesmo os legais, que simplesmente não há nenhum interesse pela reforma dessas políticas, que estão sendo “aplicadas em seu grau máximo”

“Quando os americanos ouvem que imigrantes estão sendo deportados por delitos ligados às drogas, eles imaginam líderes de cartéis estrangeiros do narcotráfico”, explica Meng. “Não pensam em pessoas que cresceram aqui, portadoras do green card, que têm famílias. Podem ter cometido um erro, mas são forçadas a pagar um preço para sempre”.

Apesar de já ter sido aprovada uma vez, Melida terá de fazer um novo teste de cidadania, já agendado. Se tudo correr bem, no ano que vem poderá finalmente ser uma cidadã dos Estados Unidos.

(*) Publicado originalmente em Reason

Tradução: Maria Teresa de Souza

Foto: Reprodução/Opera Mundi

Fonte: Opera Mundi

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.