Isadora Stentzler, para Desacato. info.
Guaranis da aldeia Tekoha Yhovy, em Guaíra, no Paraná, foram alvos de disparos de arma de fogo na noite de quinta-feira, dia 28. Segundo o cacique da Aldeia, Ilson Soares, de 31 anos, os disparos ocorreram em três pontos da aldeia, que faz divisa com a avenida Martin Luther King, próximo à Vila Eletrosul. Foi a segunda vez em sete meses que a aldeia foi atacada. Ninguém ficou ferido.
De acordo com Soares, os ataques de quinta-feira aconteceram pouco depois das 22h, quando um veículo vermelho passou pela avenida. Os disparos foram efetuados no começo da aldeia, na porteira e no final da aldeia.
“Foi um ato de provocação. Porque não tem justificativa efetuar disparos de arma de fogo só na frente da aldeia (…) E foram vários disparos. No primeiro ponto foram cerca de cinco a sete tiros, na porteira da mesma forma e, no final, da mesma forma”, explicou o cacique.
O veículo, segundo Soares, seguia de Guaíra em direção a vila Eletrosul, pela avenida Martin Luther King. Após a primeira passada, e a efetuação dos disparos, o carro teria retornado e efetuado mais disparos nos mesmos pontos.
A Polícia Militar foi acionada e um Boletim de Ocorrências foi registrado na Delegacia Regional de Polícia de Guaíra. Na primeira vez, em 21 de outubro de 2019, o caso também foi denunciado às autoridades.
“E isso a gente entende como um ato de provocação”, desabafa o cacique sobre os atos contra à comunidade. “Porque não estamos mexendo com ninguém, não estamos provocando ninguém. Estamos na nossa aldeia, respeitando as normas da quarentena e, mesmo quando não estando em isolamento, não costumamos sair muito na rua, pra cidade. Até porque a gente já sabe como é a sociedade. A gente sabe que a sociedade vizinha é muito preconceituosa e a gente sofre alguns tipos de perseguições, algumas descriminações. Então a gente já vive assim, digamos, meio afastados da sociedade, apesar de a gente estar com a comunidade que faz divisa com a vila dos não indígenas.”
Demarcação
Na aldeia, de 40 hectares, vivem 64 famílias, cerca de 300 pessoas. Junto de outras 13 comunidades, todas com o primeiro nome de Tekoha, formam a Tekoha Guasu Guavirá. As terras estavam em processo de demarcação, mas, segundo o Conselho Indigenista Missionário do Sul (Cimi), o Relatório de Identificação e Delimitação foi anulado pelo presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), o delegado Marcelo Augusto Xavier da Silva.
A Portaria Nº. 418, de 17 de março de 2020, que também anulou o processo administrativo, foi publicada no dia 26 de março no Diário Oficial da União (DOU). A alegação, movida pela prefeitura de Guaíra, questionava a identificação da Terra Indígena, afirmando que o poder público municipal não participou do processo de identificação.
Para a comunidade, uma prova do descaso com os povos tradicionais. “Agora voltamos à estaca zero. Estamos sem estudo de demarcação em andamento, estamos sem processo nenhum de demarcação e sem pedido de demarcação”.
De acordo com o cacique, os ataques contra a comunidade tem aumentado ano após ano e se agravaram quando o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) assumiu o poder. Pelo menos desde o ano passado, foram registrados atropelamentos, uma morte de um indígena de Guaíra, a pedradas, e duas mortes de indígenas, com golpes de faca, em Santa Helena. “A gente percebe o quanto as coisas pioraram, o quanto as perseguições pioraram. E, de alguma maneira, eles têm inventado crimes para justificar seus atos e têm inventado que os indígenas têm cometido crimes ou tem feito alguma coisa para que eles fiquem revoltados.”
O que o cacique pede é que a Funai promova realmente o direito aos indígenas e que os direitos básicos da comunidade sejam respeitos. “Da mesma forma que respeitamos os dos não indígenas.”