Aparentemente alheio às questões e necessidade básicas da população brasileira, o governo de Michel Temer reduz em 10,3% os gastos com políticas de segurança pública. Um retrato preocupante do padrão de violência no país foi revelado por meio do 11º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Com base em indicadores de 2016, os dados mostram que 61.619 pessoas foram assassinadas de maneira violenta – o maior número já registrado pelo estudo em uma década. Os 61 mil assassinatos cometidos no Brasil equivalem ao total de vítimas da explosão da bomba atômica em Nagasaki, no Japão, em 1945.
Entre tantas informações apresentadas no Anuário, como roubo seguido de morte (2.703 pessoas morreram em latrocínios), letalidade das polícias (4.224 pessoas vítimas de intervenções policiais), desaparecidos (71.796 notificações de pessoas desaparecidas), estupros (49.497 ocorrências registradas), entre outras, há uma que passou quase despercebida: os gastos com políticas públicas de segurança. De acordo com o documento, União, estados e municípios gastaram, juntos, R$ 81 bilhões em 2016. Aparentemente elevada, a cifra representa, na prática, uma redução de 2,6% em relação ao ano de 2015. Quando analisado de modo separado dos entes federados em segurança pública, o dado indica que o governo federal, sob a presidência de Michel Temer, foi quem menos investiu – uma redução de 10,3%, a maior verificada desde que o Anuário começou a ser elaborado pelo Fórum Brasileiros de Segurança Pública.
“Não basta aumentar os gastos em segurança para se diminuir os crimes. Agora, é pouco provável que reduzindo os gastos o quadro vai mudar. O dado mais relevante não é a queda geral dos gastos em segurança, mas é a queda dos gastos do governo federal”, afirma Arthur Trindade, professor de sociologia da Universidade de Brasília (UnB) e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Ele explica que, no Brasil, os principais responsáveis pela aplicação de recursos em segurança pública são os estados, com cerca de 90% do total. Trata-se de dinheiro utilizado para pagamento de salários, previdência e custeio. No que se refere a investimentos, os repasses do governo federal são a principal fonte, por meio do Fundo Nacional de Segurança Pública – que no governo Temer teve uma redução de 30,8%. Conforme Arthur Trindade, esses recursos são prioritariamente destinados a aquisição de equipamentos de proteção, viaturas, armamentos, construção de novas instalações e implementação de projetos.
“Se a gente quer mudar o quadro e fazer diferente, os investimentos são fundamentais, como criar um programa novo ou capacitar os policiais em uma nova tecnologia. Caso contrário, vamos continuar sempre no ‘mais do mesmo’. Então, essa redução dos gastos federais significa redução em investimentos. E isso agrava ainda mais porque, além de reduzir os gastos em segurança pública, a União está direcionando os gastos para a Força Nacional”, avalia o professor.
Enquanto o ajuste fiscal do governo federal cortou recursos em praticamente todas as áreas, não faltou verba para a Força Nacional, cujo aumento, em 2016, foi de 73,6% em comparação com o ano anterior. “A Força Nacional é um grande band-aid. Ela é cara, os policiais são pagos com diárias, e ela é empregada nos estados para ações emergenciais, ficando algumas semanas e não incidindo na questão estrutural. Ajuda muito pouco. Com esse desenho orçamentário, a União está abrindo mão de um protagonismo para a indução de mudanças estruturais em segurança pública e está se contentando com ações imediatas e de resultados normalmente midiáticos e eleitorais”, afirma Arthur Trindade.
Para 2018, ele diz que os dados de homicídios computados até o mês de setembro de 2017 já superam os do ano passado em Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe, assim como o número de policiais mortos no Rio de Janeiro. “O prognóstico para o ano que vem é muito ruim. Vamos entrar em 2018 com aumento de homicídios, queda nos gastos e sem nenhuma política nacional para o tema, que é o que mais impressiona. Não temos nada”, lamenta.
Fonte: Fórum