Por Bruno Fonseca, em Agência Pública.
O Google foi o maior anunciante político nas redes do Facebook e Instagram no início do mês de maio no Brasil. Segundo a Agência Pública apurou, o Google gastou mais de R$ 470 mil em anúncios contra o PL 2630, o chamado PL das Fake News, no Facebook e Instagram entre 30 de abril e 6 de maio. Ao todo, desde abril, o Google pagou mais de R$ 670 mil em anúncios, todos eles de postagens contrárias ao PL.
As campanhas funcionam da seguinte forma: o Google paga para a Meta — a empresa que é dona das redes Facebook e Instagram — para que postagens sejam impulsionadas como propaganda e tenham maior alcance. Ou seja, esses conteúdos aparecem com maior frequência e chegam a mais pessoas que usam as redes sociais.
Para se ter uma ideia da dimensão dessa campanha, em apenas um anúncio entre os dias 1 e 3 de maio, o Google pagou de R$ 200 mil a R$ 250 mil — o PL das Fake News iria ser votado no dia 2 de maio. Com isso, um vídeo de 15 segundos que afirma que “o PL 2630 pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil” apareceu mais de 1 milhão de vezes para usuários do Facebook e Instagram no Brasil.
A peça de publicidade ainda afirma que “precisamos melhorar o texto deste projeto de lei” e convoca o usuário: “fale com seu representante nas redes sociais ainda hoje”. A postagem inclui um link do blog do Google no Brasil. Nele, um texto de Marcelo Lacerda, Diretor de Relações Governamentais e Políticas Públicas, diz que “o PL das Fake News pode aumentar a desinformação no Brasil” e que “o PL 2630 pode piorar a sua internet”.
Antes dessa ação contra o projeto de lei, a última campanha do Google registrada no Facebook e Instagram tinha sido em novembro de 2022, sobre o mês da consciência negra. Nela, o Google pagou menos de R$ 100. O anúncio atingiu cerca de 35 mil telas.
Google mirou campanha em empresários, marqueteiros, advogados e políticos
Donos de empresas, diretores, chefes de marketing, profissionais de relações públicas, advogados, defensores públicos, juízes, vereadores e servidores públicos foram alguns dos públicos para os quais o Google mirou a sua campanha contra o PL das Fake News.
Isso se chama direcionamento detalhado. Quem anuncia no Facebook pode escolher incluir ou excluir determinados públicos a serem atingidos pelas suas postagens.
Além disso, o Google segmentou a sua campanha para pessoas com os seguintes interesses: meios de comunicação, revistas, jornalismo de cidade, negócios e economia financeira.
O anúncio mais caro da campanha, ativo entre 28 de abril e 2 de maio, foi visto por mais mulheres que homens. São Paulo foi o estado onde o anúncio foi mais exibido.
Google fez campanha política sem rótulo
A campanha milionária do Google nas redes do Facebook inclui a veiculação de anúncios sem a devida identificação de conteúdo político, segundo dados da própria Biblioteca de Anúncios da Meta.
Explicando: no Brasil, quem deseja patrocinar campanhas no Facebook ou Instagram que tratem de assuntos sociais, eleições ou política precisa indicar que os anúncios falam disso. Esse rótulo aparece para a Meta e para os usuários das redes. Ao fim, todos esses dados vão para a Biblioteca de Anúncios da Meta, que está disponível para todas as pessoas.
Conforme a Pública apurou, metade dos anúncios do Google contra o PL 2630 nos últimos sete dias foram veiculados sem rótulo dizendo se tratar de uma campanha política.
Está nesse grupo dos “sem rótulo” o segundo anúncio mais caro feito pelo Google nos últimos dias: uma peça, exibida para mais de 1 milhão de telas e com o mesmo vídeo que diz que “o PL 2630 pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil” foi veiculada sem rótulo. O Google pagou de R$ 400 mil a R$ 450 mil apenas para impulsionar esse anúncio.
A Pública questionou a Meta se isso configura infração às regras da plataforma, que respondeu que não irá comentar sobre o assunto. Também perguntamos ao Google por que não informou que os anúncios tratavam de assuntos sobre questões sociais, eleições ou política.
Após a publicação da reportagem, o Google respondeu que não iria comentar “sobre os valores exibidos na ferramenta da Meta”. A empresa reconheceu que os anúncios haviam sido veiculados sem rótulo: “Por uma questão técnica, parte dos anúncios que rodamos nas plataformas da Meta estavam com a classificação incorreta. Assim que identificamos o problema, paramos a campanha e realizamos as correções necessárias”. A empresa ainda acrescentou que “a campanha está suspensa desde o dia 2 de maio, em cumprimento a uma ordem do Supremo Tribunal Federal”. A resposta completa está aqui.
Tramitação do PL está travada na Câmara dos Deputados
O PL 2.630, que ganhou o apelido de PL das Fake News, ainda precisa ser votado na Câmara dos Deputados. Na primeira semana de maio, a votação, que estava na pauta do dia, foi adiada. O texto inicial foi aprovado no Senado há três anos.
O principal ponto do projeto é obrigar as plataformas como Google e Meta a proativamente remover conteúdos que se enquadrem em situações como crimes contra o Estado Democrático de Direito, atos de terrorismo ou preparatórios, estímulo ao suicídio ou à automutilação e crimes contra crianças e adolescentes. O texto também regula transparência das plataformas, acesso a dados via API e a imunidade parlamentar. O projeto vale para plataformas com mais de 10 milhões de usuários no Brasil.
Além disso, o texto trazia mudanças sobre direitos autorais e remuneração de conteúdos jornalísticos compartilhados nas redes sociais. Segundo reportagens, o relator do projeto, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), deve retirar esses trechos do PL, para serem votados separadamente.
No dia 1º de maio, o Google exibiu em sua home um link contra o PL. Quem acessava a página — a home do Google é utilizada por 97% dos 160 milhões de brasileiros que usam a internet — via a afirmação de que “O PL das Fake News pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil”. O link direcionava para o mesmo texto do Google que foi veiculado nos anúncios no Facebook.