Por Gustavo Castañon.
Fonte: Viomundo.
Candidata Marina Silva, meu nome é Gustavo Castañon. Sou, entre outras coisas, filiado há mais de dez anos ao PSB, partido que hoje a senhora usa para se candidatar, professor na Universidade Federal de Juiz de Fora e um cristão convicto, como acredito que a Senhora também seja, do seu jeito.
Investida de seu eterno papel de vítima, sua campanha lançou um site na internet chamado“Marina de Verdade” (com V maiúsculo mesmo) para combater supostas “mentiras” espalhadas contra a senhora na internet. Vou aqui responder uma a uma as afirmações de seus marqueteiros no site citado, oferecendo os links de fontes das minhas afirmações.
1 – Não Marina, você não sofre preconceito por ser evangélica.
Você é que acredita que todos aqueles que não compartilham de suas crenças queimarão eternamente no fogo do inferno. É o que está claramente descrito no credo (credo 14) de sua agremiação religiosa. Que nome podemos dar a isso? Certamente é um nome mais assustador do que intolerância ou preconceito. Talvez essa seja a origem de seu maniqueísmo, já que separa o mundo entre os bons, que apoiarão seu possível governo, e os maus, que lhe fariam oposição, como eu. O seu problema não é ser protestante. É ser da Assembleia de Deus, associação pentecostal de vários ramos que interpreta literalmente o Antigo Testamento, e que tem entre seus pastores Marcos Feliciano, que vende curas a paraplégicos, e Silas Malafaia, este homem que hoje defende da “cura gay” à teologia da prosperidade e vende bênçãos de Deus. Eu me pergunto: o que alguém que faz parte de uma organização que faz comércio com a palavra de Cristo é capaz de fazer na vida política? Qual o nível de inteligência que pode possuir alguém que faz interpretações tão rasteiras do significado da Bíblia? Essas são perguntas legítimas que as pessoas se fazem, e não por preconceito, mas por conceito.
2 – Não Marina, o Estado Laico deve intervir nas práticas religiosas quando são fora da lei.
Se uma religião resolve reinstituir o sacrifício de virgens dos Astecas ou a amputação de clitóris comum em alguns países muçulmanos hoje, o estado tem que observar inerte essas práticas em nome da liberdade religiosa e do laicismo? Não, candidata. Nenhuma organização está acima da lei num Estado Laico.
3 – Não Marina, você não é moderna, você é uma fundamentalista mesmo.
O fundamentalismo religioso não é a negação do Estado Laico, essa é só uma espécie de fundamentalismo, o teocrático. O fundamentalismo se caracteriza pela crença de que algum texto ou preceito religioso seja infalível, e deva ser interpretado literalmente, tanto em suas afirmações históricas como comportamentais ou doutrinárias. E o ataque ao Estado Laico pode vir também pela incorporação de leis, que desrespeitem as minorias religiosas ou não religiosas, impondo um valor comportamental de determinada religião a todos os cidadãos. Isso faz da senhora uma fundamentalista (Assembleista) que compartilha das crenças de Feliciano e Malafaia, e uma adversária, se não do Estado Laico, do laicismo que deveria orientar todas as nossas leis, poisdefende plebiscitos sobre esses temas para impor a vontade das maiorias religiosas sobre as minorias em questões comportamentais.
4 – Não Marina, você é, sim, contra o casamento gay.
Você agora diz que está sofrendo ataques mentirosos na internet sobre o tema, mas sempre se colocou abertamente contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo, defendendo somente a união civil nesse caso. E não adianta simular que o que o movimento gay está reivindicando casamento religioso. O casamento é também uma instituição civil. Você só defende união de bens, sem todos os outros direitos que o casamento confere às pessoas. O vídeo acima e mais esse vídeo aqui provam esse fato de conhecimento público.
PS: Hoje, dia 29/08/2014, ao lançar seu programa de governo, a candidata mudou uma posição defendida por toda vida, faltando um mês para a eleição. Por que?
5 – Realmente Marina, você não é petista.
Você abandonou o partido que ajudou inestimavelmente a construir sua vida política, ao qual você deve todos os mandatos e o único cargo que ocupou até hoje, porque não tinha espaço para sua candidatura à presidência. Hoje, você busca se associar, sem qualquer pudor ou remorso, a inimigos ideológicos históricos do partido, repetindo as práticas que supostamente condena no PT e chama de “velha política”. Só que faz isso somente para chegar ao poder e construindo um projeto oposto àquilo a que defendeu toda a vida.
6 – Realmente Marina, você não é tucana. Mas sua equipe econômica é.
Sua equipe econômica conta com André Lara Resende e Eduardo Giannetti, ex-integrantes da equipe econômica do governo FHC, além de seu coordenador Walter Feldman, que fez toda sua história no PSDB. Suas propostas econômicas são as mesmas do PSDB. Agora, de fato, o que nem o PSDB jamais teve coragem de ter é uma banqueira como porta voz de sua política econômica… Você não quer alianças com governos atuais de nenhuma agremiação, como o de Alckmin, exatamente para manter sua imagem de anti-tudo-o-que-está-aí. Mas não se sente constrangida em ter o vice de Alckmin na coordenação financeira de sua campanha, nem de convidar o “bom” representante de sua “nova política” José Serra para seu governo…
7 – Não Marina. Você defendeu, sim, Marcos Feliciano.
Você afirmou que ele era perseguido na CDH não por causa de suas posições políticas, mas por ser evangélico. Disse que isso era insuflar o preconceito religioso. Não, candidata. Você está falando de seu companheiro de Assembleia de Deus, um homem processado por estelionato, que pede senha de cartão de crédito de seus fiéis, que defende que os gays são doentes e os descendentes de africanos amaldiçoados. Recentemente, esse homem que você afirma ser vítima do mesmo preconceito que você sofreria, afirmou à revista Veja: “Eu não disse que os africanos são todos amaldiçoados. Até porque o continente africano é grande demais. Não tem só negros. A África do Sul tem brancos”. Ao usar essa estratégia de defesa pra ele e para você, você reforça os preconceitos da sociedade e o comportamento de grande parte dos pentecostais de blindar qualquer satanás que clame “Senhor, Senhor” em suas Igrejas.
8 – Não Marina. Você não é só financiada por banqueiros. Eles coordenam seu programa!
Neca Setúbal, herdeira do Itaú, não é só sua doadora como pessoa física. Ela é a coordenadora de seu programa de governo e sua porta-voz, e já declarou que você se comprometeu a dar “independência” (do povo e do governo) ao Banco Central, que fixa os juros que remuneram os rendimentos dela. Da mesma forma, o banqueiro André Lara Resende, um dos responsáveis pelo confisco da poupança na era Collor e assessor especial de FHC, é o formulador de sua política econômica.
9 – Não Marina, você é desagregadora e vilipendia a classe política. Seu governo será o caos.
Você é divisionista e maniqueísta e implodiu meu partido em uma semana de candidatura. Vai deixar seus escombros para trás quando chegar ao poder, como sabemos e já anunciou, para delírio daqueles que criminalizam a política. Seu partido é nanico, e se não o criar com distribuição de cargos, continuará nanico. Com a oposição certa do PT, terá que governar com a mídia e os bancos, que cobrarão o apoio com juros. Precisará do PMDB, que você acusa de fisiologismo, e do PSDB e o DEM, que lhe exigirão não só cargos, empresas públicas e ministérios, mas também a volta das privatizações. A única base congressual que lhe será fiel é a bancada evangélica, que cobrará seu preço com sua pauta de controle dos costumes e seu fisiologismo extremo. Resultado, você vai entregar a alguém o trabalho sujo do fisiologismo ou mergulhará o país no caos.
10 – Não Marina, seu marido foi sim acusado de contrabando de madeira.
E não só isso, foi acusado pelo TCU de doação de madeira clandestina. A senhora usou sua força política de Ministra para impedir que o caso fosse investigado, como sempre fazem na “velha política”. Mais tarde o MP arquivou, como fazem com todas as denúncias contra membros da oposição. Mais uma vez, fato bem comum na “velha política”. Nada é investigado.
11 – Não Marina, Chico Mendes não era da elite. A elite é que o matou.
Em mais uma tergiversação semântica demagógica, num vilipêndio à memória de seu companheiro, a senhora tomou o termo “elite” pelo sentido de elite moral, para acusar de “divisionismo” os que lutam contra a elite econômica brasileira. Essa mesma elite que mantém o Brasil como um dos dez países mais desiguais do mundo e que hoje está acastelada no seu programa de governo e campanha. Seu discurso despolitizante busca mascarar a terrível e perversa divisão de classes no Brasil e é um insulto aos seus ex companheiros de luta. Seu uso demonstra bem à qual elite você serve hoje, e nós dois sabemos que não é à elite moral. A elite moral desse país está lutando contra a elite econômica para diminuir nossa terrível e cruel desigualdade social. E você, Marina, não é mais parte dela.