Por Arnaldo César.
Reportagem publicada no Blog BNC sobre a palestra de FHC nos EUA e a entrevista ao El País.
Em 16 de novembro de 2017, em palestra na Universidade Brown, nos EUA, e em entrevista ao jornal espanhol El País, FHC confessou medo de “Bolsonaro matá-lo”. Mais ainda: classificou-o como “a principal ameaça nas eleições do próximo ano”.
O medo de ser assassinado a mando de Bolsonaro está relacionado a um famoso almoço no Clube da Aeronáutica, no Rio, no dia 28 de dezembro de 1999. Tratava-se de um desagravo dos oficiais das três armas ao brigadeiro Walter Brauer, demitido dez dias antes por FHC do comando da FAB.
Um dos destaques acabou sendo o pronunciamento do atual presidenciável, Jair Bolsonaro, então deputado federal pelo PPB-RJ, quando anunciou que “se fosse comigo fuzilaria o presidente Fernando Henrique”.
O episódio consta de um dos volumes (1999-2000) dos “Diários da Presidência” escritos por FHC. Neles, revela suas anotações diárias durante seus oito anos na Presidência da República. No livro, à página 421, a ameaça de Bolsonaro foi taxada como “fanfarronice” e o parlamentar agressor classificado como “um obsessivo direitista inconsciente”.
Já em 2017, na entrevista ao El País, admitiu até que, no caso de vitória do capitão reformado do Exército em uma disputa pela Presidência da República, poderia deixar o país. Foi o que registrou o blog Brasil Norte Comunicações (BNC), em 17 de novembro de 2017, na reportagem FHC diz ter medo de ser morto a mando de Bolsonaro, caso seja eleito, ao expor a fala do ex-presidente:
“Um dos candidatos propôs me matar quando eu estava na Presidência. Na época, eu não prestei atenção. Mas hoje eu tenho medo, porque agora ele tem poder, ainda não, ele tem a possibilidade do poder.”
Dois meses antes desse desabafo, também em entrevista ao El País – FHC: “Autocrítica é a única maneira de o PSDB recuperar a confiança da sociedade” -, FHC havia feito outro alerta, sem cotar a ameaça que sofrera:
“Agora tem um fato novo que vai obrigar a uma mudança: o Bolsonaro. E diante do perigo Bolsonaro vai ser mais necessário que as pessoas pensem qual é a real diferença entre o que os partidos propõem para a sociedade“.
Talvez FHC se esqueça, mas as ameaças não se limitaram a 1999. Em 2005, ao participar do Programa do Jô Soares, Bolsonaro não só – as gargalhadas – reafirmou o que disseram em 1999, como justificou o motivo do fuzilamento ao ouvir Jô Soares classificar a proposta de “barbaridade”:
“Não foi barbaridade. Barbaridade, é privatizar por exemplo a Vale do Rio Doce, como ele fez. É privatizar as telecomunicações. É entregar as nossas reservas petrolíferas para o capital externo. Porque a hora que você conseguir a autossuficiência do petróleo aqui, essas empresas de fora vão continuar tirando petróleo, a sete dólares, e vendendo a 60. O lucro é deles” (ouça no vídeo abaixo).
Nas voltas que o mundo dá, em outubro de 2017, tanto Jair Bolsonaro como seu filho Eduardo, ambos deputados já pelo PSC, cometeram a “barbaridade” – na descrição do próprio capitão reformado – de aprovar o projeto de lei do Senado 4567/16 abrindo a exploração do pré-sal às empresas estrangeiras.
Nas mesmas voltas do mundo, dezoito anos após ser ameaçado e um ano depois de confessar seu medo e classificar o capitão reformado do Exército como “a principal ameaça nas eleições”, o ex-presidente vê-se obrigado a se manifestar se o apoia ou não para ocupar a cadeira que já foi sua.
Pendular como todo o tucano que se preza, na manhã de segunda-feira (dia 08/10), ao site “Catraca Livre”, FHC admitiu que, pela falta de opções, votaria em Fernando Haddad (PT-SP) nesse segundo turno das eleições.
Quase no mesmo momento em que o site o ouvia, o candidato tucano ao governo de São Paulo, João Dória, em entrevista coletiva anunciava a decisão de marchar ao lado de Bolsonaro (agora já no PSL-RJ) no segundo turno. Aproveitou também para espinafrar seus companheiros que insistiam em se manter “sobre a muralha da China” (leia-se o “murão dos tucanos”).
A prepotência de Dória não acabou por aí. Horas depois, soube-se que a seu pedido o diretório regional do PSDB havia expulso de suas hostes Alberto Goldman, tucano histórico, ex-vice-governador de São Paulo, em dobradinha com José Serra. Acusado de traição ao partido, Goldman foi defenestrado juntamente com 15 integrantes do PSDB.
Na terça-feira (9/10), porém, os tucanos de alta plumagem, ainda presididos pelo ex-governador paulista Geraldo Alckmin – para quem Doria já é classificado como traidor -, voltaram a subir no muro na hora de se posicionarem sobre o segundo turno da campanha presidencial. Anunciaram a neutralidade da sigla. Mas liberaram os diretórios estaduais e filiados para fazerem a escolha (negociação?) mais conveniente.
À tarde, diante de tantos vendavais dentro e fora do tucanato, FHC, pelo Twitter, veio a público dizer que não votará em ninguém que representa o “reacionarismo cultural” e a “corrupção sistêmica”. Com a ligeireza das hienas famintas, o ex-presidente recolheu-se ao muro ou “muralha da China”. De onde, é bem verdade, nunca queria ter saído. Parece ter esquecido tudo o que Bolsonaro já falou a seu respeito.
É correto raciocinar que o eleitorado brasileiro (com exceção dos evangélicos e dos petistas) não tem por hábito seguir as lideranças. Costumam votar no segundo turno como bem entendem. Só que a governabilidade dos próximos quatro anos para aqueles que sairão vencedores começa a ser negociada, agora, pelos caciques.
Dos 13 estados e do Distrito Federal, nos quais teremos segundo turno no próximo dia 28, o PSDB concorre em sete deles. Em pelo menos dois deles (Rondônia e Roraima), baterá chapa diretamente com o PSL, a agremiação que acoita o capitão neonazista.
No Rio Grande do Sul, o governador José Sartori, do MDB, concorre pela reeleição. Também foi rápido no gatilho. Na segunda-feira mesmo (08/10), declarou apoio a Bolsonaro. Ao seu oponente, o jovem Eduardo Leite (PSDB) restou apenas cair nos braços do PT ou se declarar neutro.
Em Minas Gerais, a situação é curiosíssima: O novato Romeu Zema (Novo) atropelou o pleito por fora. As urnas nem tinham sido fechadas e ele já piscava os olhos à candidatura da extrema direita. Seu adversário, o ex-governador e atual senador Antônio Anastasia (PSDB) ficou de calças curtas.
Estava doido para seguir ao lado do capitão. Sabe que não terá grandes chances junto aos petistas. Estes, embora, derrotados são uma força considerável no Estado. Anastasia é tido como “verdugo do impeachment” de Dilma Rousseff, pois foi o relator no Senado do pedido de afastamento da ex-presidente. Terá que dar muitas cambalhotas para juntar os votos necessários e vencer Romeu Zema. O empresário do Novo saiu do primeiro turno com 42,73% dos votos válidos. Anastasia obteve 29,06%.
Como se vê, o tabuleiro de xadrez para o segundo turno ficou muito embaçado para as bandas do PSDB. Por isso, a declaração dada por Fernando Henrique, na segunda-feira, em favor de Haddad, foi considerada precipitada no ninho dos tucanos de bico grande.
As hesitações podem estar relacionadas a um movimento subterrâneo que deverá abalar os alicerces do PSBD. Nos meios políticos já se comenta que ele e mais algumas figuras de proa – do porte de Tasso Jereissati, José Serra e Marconi Perillo – estariam pensando em pular fora do partido que ajudaram a criar, em 1988.
Assim, ficariam livres para montar uma nova legenda com um víeis mais liberal e com menos ranço do conservadorismo de direita.