Repetindo postura adotada ano passado, a nova e extremista diplomacia brasileira votou hoje, na 73ª Assembleia Mundial da Saúde, contra a Palestina neste órgão máximo da Organização Mundial da Saúde (OMS), um dos mais importantes organismos da ONU. A resolução buscada pela Comunidade Internacional visa garantir saúde aos palestinos que vivem sob a ilegal ocupação israelense, Jerusalém oriental incluída, bem como à população síria que vive situação idêntica nas ocupadas colinas do Golã.
A resolução voltou a ser aprovada, com 78 votos favoráveis. Apenas 14 países votaram contra, incluídos o regime ocupante de Israel e seu patrocinador nestes crimes, os EUA. E o Brasil, infelizmente, foi levado a novamente alinhar-se com os crimes de Israel contra o povo palestino.
Como brasileiros de origem palestina, rejeitamos, tal qual a maioria do povo brasileiro, esta guinada inédita de nossa política externa, alinhando-a à proteção dos crimes de Israel na Palestina e nos demais países seus vizinhos e nos afastando do Direito Internacional, especialmente o humanitário, das resoluções da ONU aplicáveis à Questão Palestina, das convenções e tratados internacionais de que o Brasil é signatário, assim como dos acordos mediados pela Comunidade Internacional e chancelados pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas.
De acordo com a OMS, mais de 5 milhões de palestinos vivem sob a ocupação israelense, dos quais 2,2 milhões são refugiados. Somente na Faixa de Gaza, 70% da população é refugiada, quase toda vivendo em campos de refugiados, sob condições insalubres de moradia, alimentação, saúde e segurança.
A exposição à violência decorrente da ocupação militar está entre as principais causas de morte e doenças mentais na Palestina, sendo que somente nos últimos dois anos, mais de 30.000 palestinos foram feridos no contexto da ocupação e do conflito, sendo 24% crianças. Dos mais de 300 mortos, 19% são crianças.
O grau de sofrimento imposto a essa população pelas condições da ocupação se reflete, por exemplo, nas taxas de suicídio entre adolescentes: perto de 20% dos jovens com idade média de 14,6 anos já planejaram ou tentaram o suicídio (Lancet, 2019). Metade das crianças apresenta Transtorno de Stress Pós-Traumático e 10% da população sofre de doenças mentais moderadas a graves, entre outros dados não menos alarmantes.
Tudo isso é efeito direto da ocupação da Palestina por Israel. A resolução que a diplomacia brasileira rejeitou pelo segundo ano consecutivo denuncia estes crimes.
Ainda segundo a OMS/ONU, a ocupação israelense prejudica a sustentabilidade do Sistema de Saúde Palestino, como demonstram os seguintes dados:
• A idade de um palestino deslocado pelo confisco de suas terras e tornado refugiado é 9 anos menor que a de um colono israelense assentado em território palestino ocupado;
• A cerca de 40% dos pacientes palestinos é negado atendimento em hospitais israelenses, buscado em virtude dos efeitos da ocupação na infraestrutura de saúde da Palestina;
• As ambulâncias palestinas são interrompidas nos postos de controle militar israelenses, obrigando os pacientes à troca de veículos;
• O programa de imunizações está ameaçado porque Israel impede a importação de vacinas pelos palestinos, lançando incerteza e preocupação diante da Covid-19;
• Ataques a profissionais de saúde, ambulâncias e instituições de saúde são frequentes por parte de Israel, inclusive no âmbito da pandemia do coronavírus;
• Não há instalações de radioterapia ou medicina nuclear nas áreas ocupadas do território palestino, salvo no leste de Jerusalém;
• Na Faixa de Gaza estão em falta perto de 50% dos itens da lista de medicamentos essenciais e quase 30% dos itens essenciais gerais;
• Quase 55% dos meninos palestinos e 47% das meninas palestinas com idades entre 6 e 12 anos têm suspeita de problemas emocionais e/ou transtornos mentais ocasionados pela ocupação israelense da Palestina.
Diante deste quadro, a Comunidade Internacional apresentou a resolução para:
• Prestar apoio aos serviços de saúde palestinos;
• Assegurar a aquisição sustentável de vacinas e medicamentos pré-qualificados da OMS e equipamento médico para o território palestino ocupado;
• Continuar fornecendo a assistência técnica necessária ao atendimento das necessidades de saúde do povo palestino, incluindo prisioneiros e detentos, bem como dos feridos e das pessoas com deficiência;
• Apoiar o desenvolvimento do sistema de saúde nos territórios ocupados da Palestina, incluindo Jerusalém Oriental; e
• Alocar recursos humanos e financeiros para alcançar estes objetivos.
Mesmo diante deste quadro catastrófico e claramente decorrente da ocupação israelense da Palestina, o extremismo que hoje comanda o Itamaraty impôs à diplomacia brasileira este voto vergonhoso.
Diante disso, as dezenas de milhares de brasileiros de origem palestina que ajudamos a construir a história desta nação, que aqui constituímos famílias, fomentamos a economia, enriquecemos a cultura de paz, de solidariedade e de justiça, dizemos que a nação brasileira não pode compactuar com o extermínio do povo palestino, que resiste heroicamente e que tem o direito à vida como todos nós.
Pedimos ao Governo do Brasil que reveja sua posição, retornando-a à anteriormente adotada, de respeito ao Direito Internacional, de prestígio à supremacia dos Direito Humanos e de obediência ao Artigo 4º da nossa Constituição Federal, que estabelece os princípios norteadores de nossas relações internacionais, e apelamos à sociedade brasileira que siga apoiando a Palestina em sua busca por paz e justiça, que leve ao seu Estado Soberano.
Palestina Livre a partir do Brasil, 12 de novembro de 2020.
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