A Federação dos Trabalhadores no Comércio no Estado de Santa Catarina – FECESC entrou com seis ações nas três varas da Justiça do Trabalho em Lages, pedindo liminar contra a Medida Provisória 873/2019 e solicitando que as empresas da região mantenham os descontos em folha de pagamentos das contribuições e mensalidades sindicais e parem de exigir a autorização individual dos trabalhadores para repasse das contribuições. As juízas Patrícia Pereira Sant’Anna e Karem Mirian Didoné, que respondem pelas três Varas Trabalhistas de Lages onde tramitaram as ações, concordaram, em suas sentenças, na flagrante inconstitucionalidade da MP e concederam todas as seis liminares.
A FECESC atua na região de Lages através de sua delegacia sindical e assim, tomou a frente e entrou com as ações judiciais. Para o presidente da FECESC Francisco Alano, o governo federal agiu ou maldosamente ou por ignorância, ao emitir Medida Provisória totalmente contrária à Carta Magna. “Foi uma medida editada de forma traiçoeira, durante o Carnaval, que não deixa dúvidas sobre seu objetivo: zerar o caixa dos sindicatos e federações, tirando assim suas condições de fazer a defesa dos trabalhadores, num momento em que a reforma da Previdência, absolutamente danosa ao povo brasileiro, é apresentada no Congresso”, afirmou Alano.
As sentenças
Em uma das sentenças, a juíza Patrícia Pereira Sant’Anna aponta que “… a Medida Provisória nº 873, publicada em 1º de março de 2019, em sua íntegra, é eivada de inconstitucionalidade, eis que inexistentes os requisitos de relevância e urgência autorizadores para a sua edição” (grifo nosso). No entendimento da magistrada, “As mudanças do sistema das contribuições e mensalidades pagas às entidades sindicais promovidas pela Medida Provisória nº 873 não têm relevância, nem urgência, na medida em que o País seguiria o seu caminho social, político, econômico e financeiro caso estas matérias fossem objeto de projeto de lei a ser apreciado pelo Parlamento, aguardando o seu regular trâmite, segundo o sistema legislativo estabelecido na Constituição da República Federativa do Brasil e no regime interno das Casas do Congresso Nacional.” E continua: “A inclusão de tais matérias (alteração da forma de recolhimento da contribuição sindical e restrição do alcance do conteúdo das normas coletivas no que se refere às contribuições sindicais) em Medida Provisória – que é emanada por um Poder da República (Executivo) e tem força de lei – sem que estejam configuradas a relevância e a urgência demonstra-se, de forma nítida, excesso de poder e manifesto abuso institucional, na medida em que o Poder Executivo investe-se “ilegitimamente, na mais relevante função institucional que pertence ao Congresso Nacional, vindo a converter-se, no âmbito da comunidade estatal, em instância hegemônica de poder, afetando, desse modo, com grave prejuízo para o regime das liberdades públicas e sérios reflexos sobre o sistema de checks and balances, a relação de equilíbrio que necessariamente deve existir entre os Poderes da República. Cabe ao Poder Judiciário, no desempenho das funções que lhe são inerentes, impedir que o exercício compulsivo da competência extraordinária de editar medida provisória culmine por introduzir, no processo institucional brasileiro, em matéria legislativa, verdadeiro cesarismo governamental, provocando, assim, graves distorções no modelo político e gerando sérias disfunções comprometedoras da integridade do princípio constitucional da separação de poderes.” [ADI 2.213 MC, rel. min. Celso de Mello, j. 4-4-2002, P, DJ de 23-4-2004.]”
Na mesma sentença, ainda, a juíza Patrícia Pereira de Sant’Anna acusa a interferência estatal no funcionamento das entidades sindicais: “Os dispositivos da Medida Provisória nº 873, publicada em 1º de março de 2019, que assim dispõem são inconstitucionais, na medida em que há interferência estatal no funcionamento da entidade sindical, na medida em que estabelece a maneira como serão cobradas as contribuições sindicais e as mensalidades. Nessa medida, está violada a liberdade de associação e o exercício pleno de seu direito. Também, pretende interferir das decisões das assembleias e dos instrumentos da entidade sindical, de modo a não os ter como prevalentes e reconhecidos, conforme exposto no item anterior.”
A decisão judicial cita os 3 artigos da Constituição que a MP infringe ao estabelecer a impossibilidade de descontos das contribuições sindicais e das mensalidades em folha de pagamento, com a obrigação de emissão de boleto bancário ou de equivalente eletrônico, quais sejam: os artigos art. 5º, incisos XVII e XVIII, art. 7º, caput e o inciso XXVI, e art. 8º, caput e incisos IV, V e VI, da Constituição da República Federativa do Brasil.
Desta forma, e de maneira semelhante nas outras cinco decisões, as juízas Patrícia Pereira Sant’Anna e Karem Mirian Didoné estabelecem que as empresas se abstenham de cumprir a MP 873/2019 e mantenham o pagamento das contribuições sindicais dos trabalhadores.
Derrotar a MP 873/2019
“Felizmente, ainda temos juízes e juízas que sabem interpretar a Constituição e têm a coragem de enfrentar esse governo que aí está, proferindo decisões fundamentais para os trabalhadores brasileiros”, afirmou o presidente da FECESC, lembrando que os julgamentos estão acontecendo por todo o país e reforçam, desta forma, o julgamento das ADINs que tiveram ingresso no Supremo Tribunal Federal. Alano acredita que estas decisões serão capazes de barrar este verdadeiro atentado do governo federal contra a organização dos trabalhadores: “Nós acreditamos que esta malfadada MP 873 possa ser derrubada antes mesmo de entrar em votação no Congresso, ainda na via judicial. Por isso aconselhamos a todos os sindicatos e federações, de todas as categorias, que ingressem com ações para reforçar a tese da inconstitucionalidade, tão cristalina no caso desta Medida Provisória”.